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'Sociedade só sabe pedir prisão', diz presidente do TJ-SP

"Sociedade quer penas mais graves", diz o presidente do TJ-SP, José Renato Nalini - Junior Lago/UOL
'Sociedade quer penas mais graves', diz o presidente do TJ-SP, José Renato Nalini Imagem: Junior Lago/UOL

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

02/12/2015 06h00

Responsável pelo Poder Judiciário do Estado com a maior população carcerária do Brasil em números absolutos - cerca de 220 mil pessoas, segundo o Ministério da Justiça -, o presidente do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), José Renato Nalini, considera que existe uma ânsia da sociedade pelo encarceramento. Ele defende a aplicação de penas alternativas, como a prestação de serviços comunitários e o pagamento de multas. 

No fim de outubro, em sua página no Facebook, ele criticou o uso da prisão como “única resposta a quem delinquiu”. “Será que a inteligência brasileira não descobriu ainda que a prisão é um mal?”, questionou na publicação. Para o magistrado, mesmo no meio judiciário o debate sobre outras punições a criminosos é atípico, já que "a sociedade quer pena de morte, redução da maioridade penal, penas mais graves". 

Nalini lembra que a redução de encarceramento reduz o gasto com recursos públicos. "Se isso vier em uma fase que nós precisamos de recursos para coisas muito substanciais do que presídios, do que Fundação Casa, que custa R$ 10 mil por menor internado, não é bom também?", disse. Abaixo, os principais trechos da entrevista do presidente do TJ-SP, que deixa o cargo ao fim deste ano e terá seu substituto escolhido em eleição nesta quarta-feira (2). 

UOL - A prisão não pode ser a única resposta. Quais outras respostas podemos ter para quem comete crimes?
José Roberto Nalini - Nós precisamos verificar qual é a estrutura do crime. Um pichador: você não acha que seria muito mais conveniente que fosse condenado a limpar a pichação que ele fez? Alguém que destrói uma mata, não seria muito mais razoável que ele fosse condenado a fazer a restauração de uma área? Aquele que gosta muito de dinheiro e pratica um crime financeiro. Qual é o órgão mais sensível, não é o patrimônio dele? O que adianta você deixar preso um período? O dinheiro tem condição de contratar os melhores talentos (para sua defesa judicial), ele imediatamente é solto e o dinheiro ficou disponível, ficou para ele, para a família dele. Acho que nós temos inúmeras fórmulas de penas alternativas à prisão.

O senhor considera que exista um modelo ideal, um modelo que troque a pena de prisão por um outro tipo de punição? 
Não é fácil, porque nossa resposta tem sido essa: encarcerar. E nós estamos recuperando? A sociedade só sabe pedir prisão. Prisão, prisão, prisão. Nós temos mais segurança porque estamos prendendo mais?

A sociedade só sabe pedir prisão. Prisão, prisão, prisão. Nós temos mais segurança porque estamos prendendo mais?
José Renato Nalini, presidente do TJ-SP

Mas então, para o senhor, essa dificuldade de mudança de modelo…
É uma questão cultural. A formação jurídica reflete a concepção que a sociedade tem do que deva ser um sistema penal. Que sistema penal é sistema prisional. Qual é a pena? Prisão.

O senhor defende outros tipos de punição por achar que uma pessoa não deve ser privada de liberdade sem necessidade ou só pelo fato disso ser um custo a menos para o Estado?
Não, o custo é uma questão acessória, é um subproduto que não é de se desconsiderar numa fase de tamanha recessão, mas não é o principal. O principal é tutelar adequadamente a liberdade, por isso que nós ousamos fazer a audiência de custódia. Você deixar presas quase 40% de pessoas que não precisariam ficar na prisão, você está alimentando ressentimento, criando revolta, vingança, você está fornecendo mão de obra gratuita para as facções criminosas, que oferecem muito mais do que nós para eles.

Em uma pesquisa recente, metade dos entrevistados concorda com a afirmação de que bandido bom é bandido morto.
Uma postura egoística. Você quer ficar livre do problema. Eu sei que essa é a tendência geral. Ela só muda quando esse bandido é o meu filho, é o meu sobrinho, é o meu genro, é o filho do meu amigo... Aí sim, começa a haver uma mudança de critério.