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Brasil deve denúncia do Esquadrão da Morte a dom Paulo, afirma Helio Bicudo

Dom Paulo deu apoio a perseguidos políticos e denunciou crimes da ditadura - Folhapress
Dom Paulo deu apoio a perseguidos políticos e denunciou crimes da ditadura Imagem: Folhapress

Wellington Ramalhoso

Do UOL, em São Paulo

14/12/2016 16h18


Nascido na década de 1920 como dom Paulo Evaristo Arns, morto nesta quarta-feira (14), o jurista Helio Bicudo só veio a conhecer o cardeal nos anos 1970, durante a ditadura, quando atuava como procurador de Justiça em São Paulo e tentava denunciar o Esquadrão da Morte, grupo de extermínio formado por policiais. “Eu não tinha apoio nenhum [na investigação]. Aí ele me mandou um cartão e se colocou à disposição para ajudar”, conta o jurista.

O Esquadrão tinha entre seus integrantes o delegado Sergio Paranhos Fleury, um dos mais famosos torturadores da ditadura. Bicudo acabou coletando material suficiente para publicar um livro sobre a atuação criminosa do grupo. Em uma época de repressão e censura, o assunto era pouco conhecido.

“Eu não conhecia uma editora para publicar o livro. Então, me aconselhei com dom Paulo, e ele recomendou algumas editoras. Fui a elas e só recebi respostas negativas. Diziam que eram empresas comerciais e não poderiam mexer com esse assunto. Depois de fazer esse périplo, voltei ao cardeal, e ele me disse: vamos publicar pela Comissão Justiça e Paz.”

A comissão fora criada em 1972 pelo próprio arcebispo na Arquidiocese de São Paulo. O livro “Meu depoimento sobre o Esquadrão da Morte”, de autoria de Bicudo, foi publicado em 1975 pela comissão. “Foi pelas mãos de dom Paulo que o livro foi lançado. Devo isso a ele. E a sociedade brasileira deve isso e muito mais”, relembra.

Helio Bicudo - Karime Xavier/Folhapress - Karime Xavier/Folhapress
Helio Bicudo tornou-se amigo de dom Paulo e lamentou a morte do arcebispo emérito
Imagem: Karime Xavier/Folhapress

“Dom Paulo foi um marco importante na atividade da igreja, em São Paulo e no Brasil. Foi um ponto importante de reação à ditadura militar. Ele não teve medo nenhum de enfrentar os generais. Para fazer o que ele fez no tempo da ditadura precisava ser uma pessoa de muita coragem, além de ter um pensamento moral e ético”, prossegue Bicudo.

Quando o cardeal decidiu criar o Centro Santo Dias de Defesa dos Direitos Humanos, designou o jurista como presidente. Santo Dias foi um operário morto em 1979, durante a ditadura, em São Paulo. “Dom Paulo não tinha medo, visitava presos políticos e enfrentava a ditadura com serenidade. Ele foi uma peça importante para a ruptura do sistema ditatorial”, diz Bicudo, ex-integrante do PT e um dos responsáveis pela autoria do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Dom Paulo morreu hoje, na capital paulista, aos 95 anos.