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Curitiba: após confronto com PMs, servidores ocupam Câmara e votação de pacote é suspensa

Rafael Moro Martins e Vinicius Boreki

Colaboração para o UOL, em Curitiba

20/06/2017 11h52Atualizada em 20/06/2017 18h06

O presidente da Câmara Municipal de Curitiba, Sergio Balaguer (PSDB), mais conhecido como Serginho do Posto, disse que irá avaliar com seus pares se o pacote de ajuste fiscal proposto pelo prefeito Rafael Greca (PMN) será votado ainda nesta terça-feira (20). A sessão, por ora, está suspensa.

Servidores municipais que protestavam em frente à Câmara entraram em confronto com PMs que cercavam a Casa, durante a votação dos quatro projetos do pacote de Greca. Por volta das 10h30, servidores e integrantes de sindicatos que defendem a categoria invadiram e ocupam o plenário da Câmara. Ao menos quatro manifestantes sofreram ferimentos leves e um guarda municipal à paisana foi detido, mas na sequência liberado, segundo informou o Sismuc (Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba). Até as 14h40, a Polícia Militar não havia se manifestado.

Eles tentam impedir a votação do pacote, que, entre outras medidas, pretende incorporar R$ 600 milhões de um fundo de previdência do funcionalismo ao caixa do município, adiar o reajuste salarial da categoria de março para outubro e criar uma lei de responsabilidade fiscal curitibana.

Após o protesto, a prefeitura informou que não irá se posicionar sobre a suspensão da votação. Segundo a assessoria de imprensa, não há como modificar o pacote enviado à Câmara, uma vez que a administração municipal se encontra "no limite dos gastos".

O presidente da Câmara, Serginho do Posto, aguarda o Ministério Público para negociar com os servidores. Segundo relatos, um PM chegou a levantar o cassetete contra um manifestante no plenário, ocupado por cerca de 30 pessoas, mas não houve agressão. Alguns deles urinaram na parte da frente da Mesa Diretora (os manifestantes usaram uma bandeira para se cobrir).
 
"Faremos várias reuniões para dar um posicionamento mais concreto. Não posso responder [sobre um possível adiamento da votação, como querem os servidores]", falou, em entrevista à imprensa. O UOL apurou, porém, que se cogita transferir a sessão a um auditório num anexo da Câmara, uma vez que o plenário está ocupado.
 
"Existe uma decisão da Justiça para que Câmara tivesse funcionamento pleno, o que não ocorreu pela terceira vez seguida", lamentou Balaguer, com a voz embargada --que ele atribuiu a um resfriado.
 
O líder de Greca na Câmara, Pier Petruziello (PTB), chamou a ocupação de "ato desproporcional". "Invadiram a Câmara. Temos o direito de votar."
 
O vereador Professor Euler (PSD), que integra o grupo de vereadores contrários ao pacote, sugere que a sessão seja cancelada. "Até pelos confrontos que ocorreram, os servidores não estão dispostos a negociar. A solução imediata seria o cancelamento da sessão para amenizar a situação e pensar em outras alternativas", diz. 
 
Os servidores que estão dentro do plenário afirmam que só abrem negociação se houver o cancelamento da sessão. "Como está suspensa, pode voltar a qualquer momento. Com o cancelamento, há negociação, ainda que nossa expectativa seja que os vereadores retrocedam", opina a coordenadora do Departamento Jurídico do Sismuc (Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba), Adriana Claudia Kalckmann.
 
De alguma forma, o cenário lembra o de 29 de abril de 2015, quando a PM avançou contra servidores estaduais que protestavam contra um pacote similar proposto pelo governador Beto Richa (PSDB), aliado político de Greca.
 

Cassetetes e spray de pimenta

O clima na Câmara Municipal de Curitiba é bastante tenso. No começo da tarde de hoje, a escadaria que dá acesso ao plenário estava fechada por policiais militares e os servidores se mantinham postados de costas para os PMs. Em determinados momentos, os PMs atiravam spray de pimenta nos manifestantes e os atacavam com cassetetes --eles respondiam com flores e gritos de "sem violência", "resistência" e "covardes".
 
O professor Gilmar Picussa, 50, relata que recebeu spray de pimenta no rosto enquanto conversava com policiais para ingressar na Câmara. "Fomos barrados pela PM e eu pedi para entrar. Havia alguns PMs e servidores mais exaltados, e eu estava tentando contemporizar, mas boa parte dos homens estavam sendo educados, até que dois PMs saíram da linha de trás e me atacaram com o spray", relata. Isso, segundo Picussa, foi o estopim da confusão que aconteceu por volta das 10h30.
 
Apesar da confusão, os manifestantes afirmam que não esperam nada menos do que a retirada de votação do pacote. "Já tínhamos a expectativa de que haveria esse cerco policial, mas, sem a retirada do pacote, o serviço público não volta a funcionar", diz o inspetor Boris Hauer, 33.

O pacote

Chamado pela prefeitura de pacote de recuperação, os 12 projetos de lei foram apresentados pelo Executivo à Câmara em 28 de março. O Executivo alega risco de insolvência --hoje, a prefeitura diz ter dívida de R$ 1,2 bilhão com fornecedores e déficit orçamentário na casa dos R$ 2,2 bilhões (diferença entre receitas e gastos)-- e necessidade de equalização da previdência municipal.
 
Entre 2012 e 2016, segundo a Prefeitura de Curitiba, as receitas cresceram 28%, enquanto as despesas com pessoal subiram 70% e, com isso, os investimentos caíram 52%. Por isso, a administração propõe a adoção de uma lei de responsabilidade municipal para estabelecer um teto de gastos. A prefeitura explica que se trata de um reforço na gestão fiscal, para que eventual aumento de gastos esteja atrelado a uma alta da receita corrente líquida.
 
A administração municipal afirma que a incorporação dos R$ 600 milhões de um fundo do IPMC (Instituto de Previdência do Município de Curitiba) seria uma devolução de contribuições patronais feitas para servidores inativos ao longo dos últimos cinco anos. A prefeitura diz que esse pagamento foi irregular, citando lei municipal de 2006 que exclui a obrigatoriedade de contribuição patronal para inativos. Já o Sismuc afirma que o projeto é inconstitucional. 
 
O pacote ainda prevê aumento progressivo da contribuição previdenciária por parte de servidores e do município, de 2018 a 2023 --0,5% ao ano. Em 2023, a contribuição que hoje é de 11% para o servidor e de 22% para o município chegaria a 14% e 28%, respectivamente. O pacote ainda propõe a criação de um fundo de previdência complementar para futuros servidores.
 
Outra medida proposta é a mudança da data base dos servidores, que seria em março, para outubro deste ano. A prefeitura alega que no terceiro mês deste ano não conseguiria honrar o reajuste e o adiamento para outubro garantiria fôlego financeiro à administração de Greca. Em outubro, o reajuste seria aplicado retroativamente. Para o sindicato de servidores, a mudança da data base também é inconstitucional.
 
Ao todo, cerca de 32 mil servidores ativos e 13,4 mil aposentados foram afetados pela mudança de data do reajuste dos servidores de março para novembro. Essa medida, segundo a prefeitura, vai gerar economia de R$ 100 milhões ao caixa, que gasta em torno de R$ 305 milhões/mês com a folha salarial.
 
Enquanto a prefeitura ressalta a importância da aprovação do pacote para bancar as despesas com a sua operação (salários, fornecedores, entre outros), os servidores seguem em direção contrária, sugerindo a cobrança de dívidas e mecanismos para melhorar a arrecadação.
 
O sindicato dos servidores diz que não houve diálogo. "Politicamente, houve falta de diálogo. Além disso, os dados apresentados estavam incorretos e há dois projetos inconstitucionais. Fomos recebidos mais de 20 vezes, mas nenhuma das nossas propostas foram aceitas", diz Adriana, do Sismuc.