"Passa-se o ponto": crise no Rio chega a famoso "inferninho" de Copacabana
O número 185 da avenida Princesa Isabel, um dos acessos a Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, pode deixar de ser o endereço de um dos "inferninhos" cariocas mais famosos. Ao lado do letreiro em neon verde da boate La Cicciolina foi colocada na última quinta-feira (10) uma faixa de "passo o ponto", termo cada vez mais visto em estabelecimentos do Estado do Rio, afundado em grave crise econômica.
Inaugurada em 1986, a boate, ao lado de outras casas, fez da área que abrange a Princesa Isabel, o início da avenida Atlântica e as ruas Ministro Viveiros de Castro e Prado Júnior "o quadrilátero do sexo" em Copacabana. Antes da abertura da casa noturna, o lugar abrigava um restaurante desde os anos 50.
Com capacidade para 200 pessoas, a La Cicciolina ganhou fama por shows de strip-tease e eróticos. No clube noturno, também circulam prostitutas que fazem dali seu local habitué em segurança --na casa não há exploração sexual das meninas, prática que configuraria crime.
Não é de hoje que a boate amarga o impacto das mudanças no mercado de entretenimento adulto, com a migração da pornografia para a internet e suas milhares de ferramentas. Somado a isso, a conjuntura dos últimos anos foi debilitando cada vez mais a situação financeira da casa.
Mas, é a atual crise econômica que afeta o país e afundou o Rio no caos o motivo determinante que levou os três sócios da boate a decidirem passar o ponto.
“Estamos com o aluguel em atraso uns três meses. Estamos passando o ponto porque não tem como esperar a situação melhorar”, desabafou José Pereira da Silva, de 83 anos, um dos sócios da casa, que paga aluguel de R$ 10 mil mensais no espaço de 200 m² que abriga a boate.
Silva conta que a La Cicciolina começou a sentir a diminuição da clientela entre 2005 e 2006. Mas, nos últimos dois anos, a situação piorou muito, segundo ele.
“A clientela sumiu e os custos aumentaram. As meninas também sumiram, está quase sem frequência. Mantemos dois funcionários, tivemos que demitir quatro garçons”, relatou à reportagem do UOL.
Atualmente, a casa noturna perdeu os shows de strip-tease, suspensos há seis meses em razão da falta de movimento, e funciona apenas como um bar de segunda a sábado, tocado pelos dois funcionários citados por Silva.
O ponto está sendo negociado por R$ 200 mil. "Neste valor de R$ 200 mil, estamos praticamente dando a boate. Só de estoque e instalações tem muito mais do que isso. A loja é alugada e o valor do aluguel tem que ser negociado com o proprietário", disse Silva. O sócio relata que vem recebendo muitos telefonemas de interessados.
Sócios em depressão
Agostinho Machado Júnior, filho de um dos sócios, ratifica o que Silva diz. Ele, que trabalha na boate à noite, lamenta a situação e cita os atrasos de pagamento dos servidores como uma das causas da queda do movimento. Júnior relata ainda que outra boate, vizinha à Cicciolina, também está sendo afetada pela crise.
“Nas épocas boas lotava, ficava com umas 300 pessoas. Hoje está quase vazio. Só vem gringo, mas não é suficiente. Com funcionários públicos, aposentados, todo mundo sem receber, ninguém aparece”, disse Júnior no último sábado (13) a noite.
À época que foi aberta a La Cicciolina --o nome surgiu nos anos 1980 em homenagem à famosa atriz pornô húngaro-italiana--, os sócios se decidiram pelo ramo por considerá-lo promissor.
“Decidimos por esse tipo de casa porque na época era um bom negócio. Bons eram os tempos antigos, quando a noite existia, se trabalhava bastante”, lamentou-se Silva, que é contador e admite que não bate ponto no próprio negócio.
“Quase nunca vou, não gosto da noite. Tenho um escritório de contabilidade e cuido dessa parte”, diz.
Os shows, que fizeram da casa uma referência nesse tipo de diversão, já deixaram de acontecer com frequência, segundo Silva. No último sábado (12), quando a reportagem esteve no lugar, a entrada custava R$ 50.
Segundo o sócio, a decisão de passar o ponto foi difícil para os proprietários. “Todos nós estamos em depressão por causa disso. É uma situação jamais esperada. Espero que, passando o ponto, alguém tenha interesse em manter o lugar”, declara Silva.
Se quem alugar o ponto decidir por outro tipo de negócio, as garotas de programa que frequentam a casa sentirão os reflexos.
“A crise afeta principalmente as meninas que ficam na rua. Eu dirijo duas horas e meia para vir até aqui, o que acha?”, disse, de maneira evasiva uma garota de programa ao ser questionada se o fechamento da casa a afetaria.
“Todos estão sentindo a crise sim, atingiu todo mundo”, declarou outra profissional em um bar da Prado Júnior, sem querer se aprofundar em uma entrevista.
*Colaborou Giovani Lettiere
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