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Única maneira de calar Marielle era matando, diz irmã da vereadora em ato na Câmara

A irmã e a companheira da vereadora participaram de sessão solene na Câmara - André Dusek/Estadão Conteúdo
A irmã e a companheira da vereadora participaram de sessão solene na Câmara Imagem: André Dusek/Estadão Conteúdo

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

22/03/2018 12h16Atualizada em 24/03/2018 13h22

A irmã da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), Anielle Silva, afirmou nesta quinta-feira (22) que o único modo que as pessoas contrárias à vereadora tinham de calá-la era a matando. Marielle foi assassinada junto ao motorista Anderson Gomes no último dia 14, no Rio.

“A única maneira que eles tinham de calar minha irmã era matando. Um crime covarde, um crime muito bem feito, mas a gente espera e urge por justiça. Eu acredito que ninguém esperava essa repercussão toda. Nem quem fez esperava”, declarou.

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Anielle e a companheira de Marielle, Monica Benício, participaram de sessão solene na Câmara dos Deputados, em Brasília, em comemoração ao Dia Internacional do Direito à Verdade – em 24 de março, próximo sábado –, que relembra violações aos direitos humanos e pede a apuração de crimes não esclarecidos.

A data foi instituída pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 2010, mas é comemorada pela primeira vez no Brasil após a sanção em janeiro deste ano da lei que inclui a homenagem no calendário oficial. Em 24 de março de 1980, o bispo salvadorenho Dom Oscar Romero foi morto enquanto celebrava uma missa por se opor ao governo da época.

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Fotografias de pessoas mortas em crimes políticos, como na ditadura militar, foram colocadas nas poltronas do plenário da Câmara, em Brasília, onde se sentam os parlamentares. Entre elas estavam a de Vladimir Herzog, Rubens Paiva, Honestino Guimarães, Iara Iavelberg, Zuzu Angel, Ana Rosa Kucinski, Dorothy Stang, Carlos Lamarca e Chico Mendes. Uma faixa com o escrito “Quem matou Marielle e Anderson?” foi estendida.

Benício começou a fala no plenário manifestando respeito às vítimas de crimes políticos nos cartazes espalhados pelas cadeiras dos deputados e disse que eles morreram em busca de “um mundo ideal, sonho” que tanto Marielle quanto ela própria acreditam ser possível.

“A voz dela não pode ser calada com a morte do corpo dela. Esse foi o ferimento máximo que foi causado a mim e aos familiares dela, como a mãe, irmã, filha, pai, e ainda assim seguiremos na luta dela juntos [...] [Marielle] Se transformou numa coisa muito maior, se transformou em um símbolo de esperança”, declarou.

Monica também cobrou a resolução da investigação sobre o assassinato e falou que as autoridades não devem somente explicações a ela, “porque isso não vai trazê-la de volta, mas devem ao mundo o respeito e a satisfação do que aconteceu nesse crime bárbaro”.

Cartaz em homenagem a Marielle Franco é exibido na Câmara dos Deputados - Luciana Amaral/UOL - Luciana Amaral/UOL
Foto em homenagem a Marielle Franco é exibida na Câmara dos Deputados
Imagem: Luciana Amaral/UOL

“Estar aqui falando é por ela, é uma prova de amor. E, com toda a certeza, é ela que está me sustentando e me dando força para estar aqui na frente de vocês fazendo isso. Marielle e Anderson vivem”, finalizou.

Anielle e Monica entraram no plenário por meio de uma porta lateral e receberam abraços de políticos e dos demais presentes no local. Após a execução do Hino Nacional na abertura da sessão, diversas pessoas gritaram “Marielle, presente” e “Fora, Temer”. Em seguida, ambas sentaram à mesa da Presidência no plenário, de onde acompanharam o ato.

Segundo Anielle, ela e a irmã conversaram muito no domingo anterior ao crime – na quarta (14) – sobre expectativas, a Monica e os pais delas. Na terça (13), Marielle enviou a Anielle uma mensagem de força com a foto da igreja de São Jorge, em que iam todo ano, contou.

“Minha irmã é resistência, minha irmã é luta e a gente vai até o final. A gente clama por Justiça e, enquanto eu tiver forças para levar o trabalho dela, levar todo o legado que ela está deixando, eu vou continuar”, disse.

Após a sessão solene, Anielle questionou “quantos mais precisarão morrer para que essa guerra toda acabe” e ressaltou que os criminosos acordarão um “gigante”.

“Acordou um gigante que talvez pudesse estar adormecido, mas que a gente vai seguir na luta. [...] Independentemente de posição política ou não, ninguém merece morrer como ela morreu. Ninguém. E que isso seja respeitada, que a família seja respeitada. Há muita coisa sendo dita que não é verdade”, falou, acrescentando querer entender o porquê da morte da irmã. “O Brasil precisa e necessita que esse crime seja esclarecido. Não pode ficar impune.”

22.mar.2018 - Câmara recebe faixa de protesto pela morte da vereadora Marielle Franco na cerimônia do Dia Internacional do Direito à Verdade - Luciana Amaral/UOL - Luciana Amaral/UOL
Câmara recebe faixa de protesto pela morte da vereadora Marielle Franco
Imagem: Luciana Amaral/UOL
A agenda oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) indicava que ele estaria presente ao ato, mas Maia não compareceu ao plenário da Casa.

O projeto de lei que instituiu a data foi apresentado pela deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP). Ela afirmou que a sessão já estava programada antes do assassinato de Marielle e Anderson, mas pediu que o ato fosse estendido a eles.

“A sessão é realizada exatamente para denunciar a violação dos direitos humanos, exigir a verdade sobre esses crimes de leso à humanidade, para que se faça justiça e não se deixe impunes esses crimes”, disse a deputada.

Segundo ela, a situação não melhorou desde a ditadura militar. Pelo contrário, afirmou acreditar que as violações se deem sistematicamente no sistema prisional, na periferia de centros urbanos contra a juventude negra, na violência contra mulheres, indígenas e trabalhadores rurais.

O secretário-geral da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil), dom Leonardo Steiner, esteve presente ao ato e falou sobre a importância de se preservar a memória das vítimas de crimes políticos e não esclarecidos.

“A morte de Marielle é apenas a continuação de uma história que se instalou. [...] Foram homens e mulheres que desapareceram pela força, violência e até hoje temos rastros de intolerância por causa de raça, religião, sexualidade. Temos uma intolerância crescente no Brasil”, declarou.

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Pistas sobre o assassinato

O Disque Denúncia informa que já recebeu 40 denúncias sobre o caso e encaminhou tudo para a polícia. O anonimato é garantido. Quem tiver qualquer informação a respeito da identificação e localização dos assassinos pode usar os seguintes canais para denunciar:

Whatsapp ou Telegram: (21) 98849-6099

Central de Atendimento do Disque Denúncia: (21) 2253-1177