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Jovem diz que foi agredido em Santos (SP) para "parar de ser veado"

Lucas Acacio de Souza, 23, postou nas redes sociais que foi agredido na orla de Santos (SP) por seis homens por ser gay - Reprodução/Facebook
Lucas Acacio de Souza, 23, postou nas redes sociais que foi agredido na orla de Santos (SP) por seis homens por ser gay Imagem: Reprodução/Facebook

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

13/07/2018 04h00Atualizada em 13/07/2018 16h51

Era o último mergulho antes de procurar o bar mais próximo para ver a seleção brasileira jogar nas quartas de final da Copa do Mundo. O estudante de publicidade Lucas Acacio de Souza, 23, saiu do mar na praia no bairro José Menino, em Santos (litoral paulista), pegou um cigarro e foi pedir um isqueiro a uns rapazes que estavam na orla.

Lucas é gay e conta que depois de pedir o isqueiro foi agredido por pelo menos seis homens porque eles não gostaram da forma como ele falava e gesticulava. O jovem, que é do interior de São Paulo e mora na capital paulista, publicou um desabafo nas redes sociais com uma foto de como o seu rosto ficou após a agressão.

À reportagem do UOL, disse que dois homens foram hostis quando ele se aproximou pedindo o isqueiro emprestado e que zombaram da maneira que ele se expressava. “Eu falei para a minha amiga o que tinha acontecido, ela não gostou e foi reclamar com eles. Eles chegaram a bater nela e eu fui defendê-la. Disseram para ela ‘seu namoradinho vai apanhar para parar de ser veado’ e começaram a me bater”, diz. Ele conta que outros quatro homens se juntaram aos dois para agredi-lo.

Lucas contou ainda que ele e amiga, que mora com ele em São Paulo, chegaram a Santos na noite anterior para celebrar o encerramento do semestre na PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), onde ambos estudam. “Estávamos na praia, nadando, brincando. A gente estava feliz e eles se incomodaram com o meu jeito. Tudo isso aconteceu minutos antes do jogo do Brasil, enquanto todo mundo olhava para a televisão, eu estava apanhando”, diz.

Na postagem, ele diz ter recebido chutes no estômago e na cabeça, socos na cara e “muita crueldade e covardia” e que chegou a ficar inconsciente por causa dos golpes que recebeu. “Lembro de levantar do chão, pegar minhas coisas e gritar para minha amiga correr dali senão eu iria morrer”, desabafou.

Segundo ele, a única pessoa que o auxiliou foi um morador de rua que presenciou toda a ação. “A única pessoa que se propôs a nos ajudar foi um morador de rua, que chorando, pediu para entrarmos em qualquer ônibus ali na orla em Santos e descer em qualquer lugar bem lá na frente”, conta.

Lucas diz que, após descer do ônibus, ele e a amiga foram para o hotel onde estavam hospedados e que prestou queixa sobre o fato na terça-feira (10), primeiro dia útil após o feriado. Ele diz ter prestado queixa na Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância) e que fez exame de corpo de delito ontem no IML (Instituto Médico Legal).

Em nota, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) afirmou que "o caso foi registrado na Decradi onde a vítima e testemunha foram ouvidas. Foi solicitado exame de corpo de delito e tanto os depoimentos como os laudos serão encaminhados para Santos, que prosseguirá com as investigações".

A reitoria da universidade onde Lucas estuda, a PUC-SP, cobrou das autoridades, por meio de nota, que tomem providências sobre a agressão. No texto, a instituição informa que "lamenta profundamente o episódio de violência sofrido pelo estudante", repudia toda e qualquer forma de discriminação e se solidariza com o membro da comunidade universitária. 

Lucas disse que pretendia não postar sobre o que aconteceu, mas que o fez para dar visibilidade ao problema. “Não foi a primeira agressão que sofri esse ano, que dirá na vida. Mas até quando? Até quando vão nos matar por sermos do jeito que somos? Até quando vão ignorar o problema?”, questiona.

O estudante disse que está com medo de sair à noite porque os seus agressores ainda não foram identificados. "Eu não tenho medo de continuar me expressando do jeito que sou, mas tenho medo de sair à noite. Um rapaz trombou em mim ontem e eu já fiquei ansioso, porque não lembro o rosto de quem me agrediu", contou. 

Em 2017, a ONG Grupo Gay da Bahia identificou que 445 assassinatos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais foram motivados por homofobia, ou seja, uma morte a cada 19 horas. O número foi o maior já registrado pela entidade baiana desde que ela passou a fazer o monitoramento, há 38 anos. Em 2016, haviam sido registradas 343 casos.

Dados obtidos com exclusividade pelo UOL em maio mostraram um crescimento de 127% entre 2016 e 2017 das denúncias sobre homicídios praticados contra essa parcela da população feitas ao Disque 100, administrado pelo MDH (Ministério dos Direitos Humanos).