Topo

Rocinha completa 8 dias sem água durante pandemia: 'Nem para descarga'

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

23/07/2020 17h49

Moradores da Rocinha enfrentam falta de água há ao menos oito dias em regiões da comunidade da zona sul do Rio em meio à pandemia do coronavírus. O problema, que afeta sobretudo a parte baixa da favela, atinge mais de 4.000 famílias, segundo a Associação de Moradores da Rocinha.

"A Cedae [Companhia Estadual de Águas e Esgotos] já mandou carros-pipas para a favela, mas eles são insuficientes. A verdade é que eles não fazem manutenção para a Rocinha. Agora mais do que nunca não podemos ficar sem água. Água é sobrevivência. Dessa maneira, deixaremos a covid vencer. As pessoas não conseguem nem lavar as mãos", relata Wallace Pereira, presidente da associação de moradores.

23.jul.2020 - Moradores da Rocinha protestam após mais de uma semana sem água - Reprodução/Associação de Moradores da Rocinha - Reprodução/Associação de Moradores da Rocinha
23.jul.2020 - Moradores da Rocinha protestam após mais de uma semana sem água
Imagem: Reprodução/Associação de Moradores da Rocinha

Fernanda Clemente, 47, conta que está à procura de doação de galões de água para a família, que mora na região conhecida como Largo dos Boiadeiros. Ela vive com dois filhos adolescentes, o marido e a mãe dela na Rocinha há 20 anos.

Não temos água para beber, cozinhar, tomar banho, lavar a louça. Não temos água nem para dar descargas. Como deixam isso acontecer nessa época do ano?

Fernanda Clemente, moradora da Rocinha

Fernando Emiro da Silva, coordenador da Garagem das Letras, espaço cultural na comunidade, lembra que o problema de abastecimento na Rocinha é crônico.

Dizer que falta água na Rocinha é redundante. O incomum é ter água frequentemente. Normalmente, a Rocinha fica três, quatro dias sem água. Em outro [dia], entra água e fica mais três dias sem. Por isso, as casas têm caixas d'água para que as famílias consigam guardar, reter água. O normal aqui é desumano, mas com a pandemia cria-se um foco, fica pior

Fernando Emiro da Silva, morador da Rocinha

Moradores fizeram ontem e hoje protestos na autoestrada Lagoa Barra, que corta o bairro de São Conrado, onde fica a comunidade.

Em maio, o UOL em parceria com o Data_Labe publicou reportagem que mostra que a falta de água potável é um problema crônico nas comunidades do Rio —sem acesso, populações vulneráveis ficam ainda mais expostas ao coronavírus. Para conseguir água potável, moradores relataram que usam até mesmo carvão para fervê-la na churrasqueira diante da escalada do preço do botijão de gás.

De acordo com o painel Rio Covid-19, da Prefeitura do Rio, a comunidade registrou até o momento, 47 óbitos em decorrência de coronavírus e 272 casos confirmados.

O que diz a Cedae

De acordo com a Associação de Moradores da Rocinha, a Cedae está com técnicos no local e as ruas foram esburacadas na tentativa de localizar o problema.

Procurada, a Cedae informou que um vazamento estaria reduzindo o abastecimento da região e que as construções sobre as redes da empresa aumentam o grau de complexidade do trabalho no local.

"A companhia vem atuando ininterruptamente na região desde a última sexta-feira (17) a fim de identificar vazamento encoberto que estaria reduzindo o abastecimento (...) Técnicos permanecem atuando para localizar o vazamento e concluir o reparo. Vale informar que a Cedae está disponibilizando o fornecimento de água por meio de carro-pipa e realizando manobras operacionais para reforçar o abastecimento", informou a companhia através de nota.