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Acusado de racismo na FGV muda versão na Justiça e passa a negar o crime

Fachada do prédio da Fundação Getúlio Vargas  - Cecilia Acioli - 14.abr.2012/Folhapress
Fachada do prédio da Fundação Getúlio Vargas Imagem: Cecilia Acioli - 14.abr.2012/Folhapress

Marcelo Oliveira

Do UOL, em São Paulo

02/03/2021 22h11Atualizada em 03/03/2021 11h50

Três anos após o crime de racismo de que foi acusado, o estudante de economia Gustavo Metropolo, 23, foi interrogado hoje (2) no processo que responde na Justiça de São Paulo e negou que tenha sido o autor da foto e da mensagem de whatsapp, num grupo de alunos da FGV (Fundação Getúlio Vargas), na qual o aluno de administração pública João Gilberto Lima, 28, é chamado de escravo.

Segundo apurado pela FGV, Metropolo, então aluno da fundação, mandou uma mensagem sob uma foto de João Gilberto no fumódromo da universidade conversando com duas amigas, na qual estava escrito: "Achei esse escravo aqui no fumódromo! Quem for o dono avisa!". A versão é a mesma apurada pela Polícia Civil em inquérito criminal.

Em 2018, segundo a FGV, Metropolo admitiu ser o autor da mensagem à Comissão de Conduta da instituição, que determinou a suspensão do então aluno por três meses.

"Dias após o fato, a comissão mostrou a ele a postagem, caracterizando o João Gilberto como escravo e Gustavo começou a chorar e confessou. Ele disse que foi um ato monstruoso e pediu desculpas à Comissão de Conduta", disse ao UOL o advogado de João Gilberto, Daniel Bento Teixeira, diretor do Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), que dá apoio à vítima por meio de um grupo de litigância estratégica em casos de racismo.

Acusado foi alvo de protesto

Após a suspensão, Metropolo conseguiu uma ordem judicial para voltar à FGV, mas foi recebido com um protesto de alunos da universidade com cartazes contra sua presença na faculdade. Posteriormente, ele trancou sua matrícula e depois se desligou da instituição e hoje estuda em outra universidade.

"Gustavo admitiu a autoria, mas, depois de consultar os advogados, que são os pais dele, ele passou a negar durante o inquérito policial. Ele passou a dizer que teve o celular roubado, mas o roubo foi após a postagem e ele agora diz apenas que não foi ele, apesar de ter admitido lá atrás e as testemunhas todas confirmam", afirmou Teixeira, que atua no caso com a advogada Ana Carolina Moura.

As testemunhas são professores que participaram do processo interno da Comissão de Conduta da FGV. João Gilberto é bolsista da FGV e hoje está no último semestre do curso. Ele teve que fazer tratamento psicológico após o episódio racista. Em 2018, logo após os fatos, ele disse à Folha de S.Paulo que ao entrar na universidade havia "três ou quatro" negros, mas que, até então, ele nunca havia sentido "um clima hostil".

O UOL procurou a advogada Ana Paula Rodrigues Metropolo, que representa o filho, no número de telefone constante de seu cadastro na OAB, mas não conseguiu localizá-la. Assim que ela se manifestar, sua declaração será acrescentada à reportagem.

Racismo e injúria racial

Metropolo foi acusado pelo Ministério Público do crime de racismo divulgado por meio de comunicação (pena de 2 a 5 anos de prisão) e de injúria racial (pena de 1 a 3 anos de detenção), a Justiça abriu processo contra ele, que é réu por ambas as acusações.

O MP denunciou Metropolo pelo concurso formal dos dois crimes. Neste caso, se for condenado pelos dois crimes, o crime de racismo poderá ter a pena aumentada de um sexto até a metade.

Processo entra na penúltima etapa

O interrogatório do réu é a penúltima etapa do processo antes da sentença. A próxima fase é das alegações finais. Agora, o Ministério Público e os assistentes de acusação (os advogados de João Gilberto) terão prazo para apresentar memoriais sobre o caso e deverão pedir a condenação de Metropolo. Em seguida, a defesa do réu apresentará memoriais. O caso, então, será julgado pela 14ª Vara Criminal de São Paulo.

Metropolo foi acusado não apenas por injúria racial, pois ao chamar João Gilberto de escravo, ele ofendeu de forma ampla toda a raça negra. Por isso, além da injúria, que é uma ofensa à pessoa, ele foi acusado também de racismo.

Devido ao fato de Metropolo ser primário e ter bons antecedentes, dificilmente ele será condenado a uma pena de prisão. A pena deverá ser estabelecida abaixo dos 4 anos e substituída por restrições de direitos.

Estudante poderá cumprir pena em instituição de combate ao racismo

Segundo Teixeira, o estudante de economia poderá ser condenado, por exemplo, a prestar serviços à comunidade, trabalhando em uma instituição que combate o racismo. "Seria um aprendizado para uma pessoa que tinha sido condenada por discriminação e injúria racial", afirmou.

Além da pena de prisão ou de restrição de direitos, caso condenado Metropolo pode ser obrigado também a indenizar João Gilberto pela injúria. O cálculo do valor dependerá de vários fatores, como, por exemplo, os gastos que a vítima teve com tratamento psicológico e o dano imaterial à sua honra, que será avaliado pela Justiça ao estabelecer a sentença, em caso de condenação.

Segundo seus advogados, João Gilberto atualmente cursa o último semestre de administração pública na FGV. Ele não quis se manifestar.