Principal ponto de apoio, igreja em Petrópolis acolhe 240 desalojados
Do alto do Morro da Oficina é possível ver a Igreja de Santo Antônio. No bairro do Alto da Serra, área mais atingida pelos deslizamentos da terça-feira (15), o local se tornou o principal ponto para desalojados na cidade.
As 240 pessoas que dormem nos salões da igreja — a diocese não divulga os dados por idade — têm acompanhamento psicológico e médico. Voluntários também orientam sobre o aluguel social, enquanto freiras se encarregam de, além de outras funções, entreter as crianças.
Os desalojados se sentem acolhidos enquanto vivem a incerteza do próximo local onde poderão reconstruir a própria vida.
Para ajudar nos trabalhos, a bióloga Tayana Louzada, 31, chegou na manhã de hoje ao local. Criada aos pés do Morro da Oficina, ela se desesperou ao saber que a casa em que seus pais moram esteve em risco. Depois do susto, ela decidiu se voluntariar para qualquer função, desde que consiga ajudar pessoas. Ela se emociona ao lembrar o deslizamento.
"É muito injusto, é muito injusto ver gente cheia de dinheiro sem fazer nada, não ajudar em nada", fala com os olhos marejados.
Pouco antes de falar à reportagem, ela olhava fixamente para o morro. Segundo ela, passava um filme em sua cabeça.
"Eu estava me lembrando de quem eu sempre vi passar na minha rua. Eu fico imaginando como está lá, o pessoal cavando", lamenta.
"Não teria para onde ir", diz vítima
Jessica Silva, 24, é mãe de uma menina de dois anos e de um menino de oito anos, e está no abrigo junto com o marido e a irmã.
Ela conta que a barreira caiu em frente à sua casa, no bairro Lopes Trovão, por isso teme voltar ao local.
"Vamos ficar aqui até ter uma solução para a gente. Se eu não estivesse aqui, não teria para onde ir", diz.
Jessica conta que sua filha mais nova está assustada e diz que não quer voltar: "ela fala que o morro é igual papel". Já o menino viu o exato momento da queda da barreira. Para evitar novos traumas nas crianças, a mãe pretende se mudar para a cidade do Rio de Janeiro.
"Não tem como eu voltar para lá [a casa], principalmente por causa dos meus filhos", afirma a jovem.
Ela elogia o alojamento da igreja, e principalmente o tratamento aos filhos. A reportagem flagrou o momento em que uma freira cantava músicas infantis em uma sala para entreter crianças. No pátio ao lado, uma mulher recebia atendimento médico durante uma crise convulsiva. Ao perceber a movimentação, a freira intensificou a brincadeira, o que aproximou as crianças do microfone e as afastou da cena do atendimento médico.
"É uma questão de alma", diz costureira
A costureira Geralda Silva, 61, também está no local depois que a Defesa Civil condenou sua casa, na rua Chile, no Alto da Serra. Ela lamenta que o passar dos dias tem tirado seu sono e sido marcados por muito choro.
Eu sinto uma fraqueza que não sei explicar, mas o padre explica que é uma questão da alma.
Geralda Silva, que teve sua casa afetada pelas chuvas
Ela elogia a organização e não cogita voltar para casa sem a segurança necessária.
"É muita disciplina aqui, não tem bagunça. Graças a Deus não me aconteceu nada, mas não me sinto segura em voltar até a Defesa Civil falar", diz.
Como funciona o ponto de apoio
Já às 8h de domingo, o movimento na igreja era grande. Na entrada, dezenas de carros carregando donativos. No pátio principal, milhares de garrafas de água. E em todo o espaço, centenas de profissionais e voluntários dividem entre si as funções para manter o pleno funcionamento do local.
Por ser o ponto de apoio mais próximo ao Morro da Oficina, muitos doadores levam mantimentos à igreja, enquanto outros pontos sofrem com uma ou outra falta de produtos.
Para evitar desperdício, a igreja mantém comunicação com outros pontos de apoio para receber o que precisa e entregar o que sobra. Na manhã de hoje, chegaram alguns colchões e saíram 35 cestas básicas.
As salas são organizadas por "temas". Há aquelas que ficam os itens de higiene, outra com alimentos perecíveis e mais uma com materiais como colchão e roupa de cama. A água que chega é tanta que fica no pátio.
Logo à frente das salas há voluntários sentados em cadeiras com imensas listas. Eles controlam a quantidade do que sai, e para quem. Para pessoa física eles anotam os dados básicos — houve dias em que uma só pessoa queria pegar um número irreal de cestas para uso próprio.
Mototaxistas distribuem doações a partir da igreja
Quando os materiais são entregues a motociclistas, os voluntários anotam a placa e a localidade para onde o material está indo.
Com o trânsito travado na cidade e alguns moradores com dificuldade de deslocamento, motociclistas se voluntariam para transportar rapidamente cesta básica, comida e até alimentos.
Roniel Ramos Nunes, de 36 anos, trabalha como leiturista na companhia de energia elétrica na cidade, mas desde ontem, tem usado a sua moto — que é seu meio de trabalho — para ajudar vizinhos.
O que der para levar a gente leva. Ontem desceu uma mãe com três crianças para fazer cadastro [no aluguel social], eu subi com a cesta. Agora estou levando a cesta para uma senhora no alto do morro.
Roniel Ramos Nunes, motociclista ajuda na entrega de doações
De acordo com ele, muita gente teme sair de casa e o trabalho dos motociclistas também alcança essas pessoas.
Além da igreja, há outros 11 pontos de apoio na cidade. De acordo com a prefeitura da cidade serrana, há 856 pessoas desalojadas nesses locais.
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