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Biomédica indiciada por morte de paciente 'só visava o lucro', diz delegado

A biomédica Lorena Marcondes foi indiciada pela morte da paciente Íris Doroteia Martins Imagem: Reprodução

Colaboração para o UOL, em São Paulo

25/10/2023 16h41

A biomédica Lorena Marcondes, indiciada pela morte de Iris Doroteia Martins após um procedimento de lipoaspiração, não priorizava o bem-estar dos pacientes e "visava apenas o lucro", segundo o delegado Marcelo Nunes, da Polícia Civil de Minas Gerais.

O que aconteceu:

Lorena Marcondes foi indiciada nesta terça-feira (24) por homicídio doloso qualificado pelo motivo torpe e pela traição com dolo eventual pela morte de Iris, que foi submetida a uma lipoaspiração realizada em 8 de maio de 2023 pela biomédica.

Conforme Marcelo Nunes, as tipificações se aplicam porque a biomédica não mantinha um ambiente de trabalho seguro para os pacientes. "Sequer um aparelho de pressão tinha no local para você ver o absurdo a que os pacientes estavam submetidos. Motivo torpe, pois ela somente visava lucro. Outra qualificadora, chamada traição, porque ela enganava os pacientes que depositavam confiança nela. Ela falava que não era um procedimento cirúrgico e estava realizando cirurgias de alto porte ali", declarou em entrevista à TV Integração, afiliada da Globo em Minas Gerais.

Segundo a investigação, a biomédica realizava procedimentos cirúrgicos de grande porte, que devem ser feitos apenas por médicos e que, além da ausência dos aparelhos necessários para monitorar os pacientes, ela também fazia uso de medicamentos usados em cirurgias, como lidocaína e outros anestésicos, a exemplo de PMMA diluído em soro, uma "substância que é proibida e que é altamente regulada".

[A biomédica] injetou quantidade absurda de anestésico que levou a intoxicação da paciente, agiu como se fosse anestesista. Fez incisões profundas que causaram gravíssima hemorragia. Não é qualquer médico que faz esse tipo de procedimento. Tamanha foi a agressão que ela sofreu que veio a óbito. — Marcelo Nunes, delegado da PCMG

Ocultação de provas. Ainda segundo o delegado, Lorena e outros funcionários da clínica tentaram ocultar provas ao alterar a cena do crime. Para Nunes, imagens que mostram os funcionários "deixando o local com sacos pretos para serem escondidos e de veículos entrando no estacionamento para recolher estes materiais, não restam dúvidas do crime".

Além de Lorena Marcondes, a auxiliar da biomédica vai responder por homicídio simples. Outros funcionários da clínica vão responder por fraude processual.

Em nota, o advogado de biomédica, Tiago Lenoir, disse ter ficado "surpreso" com o indiciamento por dolo eventual. Ainda, afirmou que a clínica funcionava dentro da legalidade com "todos os alvarás de fiscalização em dia e que Lorena pode praticar determinados procedimentos" em decorrência de sua formação. Veja a íntegra no final da matéria.

Relembre o caso

Iris Doroteia Martins morreu aos 46 anos após passar por um procedimento de lipoescultura em 8 de maio em uma clínica particular de Minas Gerais.

Foram encontradas 10 perfurações no abdômen e duas nos glúteos da vítima e "sinais de importante hemorragia" que, segundo o chefe do IML, o médico-legista Lucas Amaral, podem ter ligação com a causa da morte. Segundo ele, nenhum órgão foi perfurado.

Durante a realização da lipoaspiração, a vítima teria sofrido uma parada cardiorrespiratória e foi socorrida em estado grave até uma unidade de saúde, mas não resistiu, conforme informou a polícia.

Segundo a polícia, o estabelecimento tinha autorização para funcionar apenas como clínica de estética, sem alvará ou estrutura física adequada para atendimento emergencial na realização de cirurgias.

Veja a íntegra da defesa

Recebi com uma certa surpresa esse indiciamento da Polícia Civil por dolo eventual, por homicídio doloso, e com certo absurdo, com todo respeito ao delegado de polícia, ao ele dizer que houve qualificadoras dessa ação praticada pela Lorena. Primeiro que, durante a coletiva de imprensa, eles cercearam aos jornalistas algumas informações que são muito importantes para a elucidação deste caso, que obviamente a defesa vai explorar ao longo do processo.

Em momento algum, eles reforçaram que a clínica da Lorena é uma clínica legal, que tinha todos os alvarás de fiscalização em dia e que a Lorena é uma biomédica e, como biomédica, ela pode praticar determinados procedimentos. O primeiro deles é a utilização de um líquido, chamado líquido Klein, que é utilizado para anestesiar um volume maior de uma região do corpo. Ele é composto por um soro, bicarbonato e lidocaína. Esse líquido é usado por todos os profissionais da estética, sobretudo pelos biomédicos. O médico cirurgião, àquele que faz a lipoaspiração, ele faz uma anestesia, que é local ou geral, que é completamente diferente desse liquido Klein. O simples fato da vítima ter 12 pertuitos, que são pequenas inserções na região subcutânea, demonstra que não houve lipoaspiração.

Uma lipoaspiração é um procedimento muito complexo, o qual o médico faz quatro furos enormes e utiliza cânulas enormes e uma máquina enorme para fazer a aspiração dessa gordura. E nenhum profissional da Polícia Civil que deu a entrevista coletiva hoje, seja o legista, a perita ou delegado, informa se foram encontradas na clínica da Lorena essas cânulas enormes de lipoaspiração. Eles cercearam para a população e para os jornalistas a diferença de um lipolaser para uma lipoaspiração.
A lipoaspiração requer uma anestesia complexa, uma equipe médica complexa e um local complexo para fazer isso. No caso da biomedicina, eles podem sim utilizar o laser para fazer o procedimento estético. E aí tem sim que fazer esses pequenos pertuitos, que a Lorena já tinha realizado em diversas pessoas, para passar um fio de laser para fazer esse procedimento, que é autorizado pela biomedicina, que é utilizado nesses pertuitos subcutâneos. A própria perita contou que encontrou cânulas de 15 a 10 centímetros, justamente cânulas pequenas, para fazer essas pequenas incisões. Ou seja, não encontraram nenhuma máquina de lipoaspiração.
E outra, como que uma pessoa que supostamente assume o risco de matar, presta os primeiros socorros para a vitima e fica lá até o final, inclusive ela foi presa em suposto flagrante delito. Logo que a vítima passou mal, a Lorena acionou uma equipe médica, que chegou com menos de dois minutos e começou a fazer as massagens cardíacas. A própria clínica da Lorena que fez o contato com o Samu para chegar e fazer todos os procedimentos. E obviamente a paciente teria várias hemorragias internas, pois ela foi massageada por mais de uma hora, seja pelo Samu ou pelos médicos que chegaram antes na clínica. (...) E, curiosamente, o prédio onde fica a clínica da Lorena, que inclusive o Ministério Público está estabelecido lá, não comporta uma maca de Samu. Qualquer pessoa que for no prédio, verá que o elevador é muito estreito, pequeno e não comporta uma marca do Samu. Porém, a paciente saiu viva da clínica da Lorena e foi falecer mais de 10 horas depois no hospital.

Então, o que eu percebo da Polícia Civil é que eles encontram um suspeito e vão atrás de um culpado, sem analisar os diversos ângulos que devem ser analisados com toda seriedade para a busca da verdade. Isso, obviamente, a defesa vai explorar no âmbito judicial, caso o Ministério Público denuncie a Lorena pelo que a Polícia Civil está demonstrando.

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