Fogão de bolso, micro-ondas caseiro: as criações surreais deste pedreiro
Abinoan Santiago
Colaboração para o UOL
04/11/2023 04h00
Com uma ideia na cabeça e utilizando itens que qualquer um pode ter na cozinha de casa, o pedreiro Cláudio Freitas, de 46 anos, tem chamado atenção na internet com invenções que até a Nasa duvidaria. Geladeira frost free caseira — que também é o ar-condicionado da casa —, fogão de bolso com latinhas, micro-ondas solar e máquina de fazer churros com cano PVC são alguns dos improvisos. Tudo surgiu da necessidade.
Morador de São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo, Cláudio vive atualmente de bicos de serviços de construção civil e de eletricidade. Foram a experiência como pedreiro e as dificuldades ao longo da vida que Cláudio diz ter aprendido de maneira autodidata a criar as gambiarras.
"As ideias surgem da necessidade. Na da geladeira, por exemplo, eu não tinha condições de comprar ar condicionado. As demais adaptações também. Uma com frost free é muito cara. É tudo muito simples, mas funciona de verdade", conta Cláudio sobre a invenção que virou o xodó da casa.
O pedreiro compartilha as invenções no Favela na Cozinha, perfil que está no Instagram, TikTok, Kwai, YouTube e Facebook, desde o início de 2022.
"Eu estava vendo um programa de culinária e brinquei com um amigo dizendo que eu faria muito melhor e mais rápido. Era um omelete. Fiz a edição como se estivesse no Masterchef. Postei nas redes sociais e bombou".
O vídeo bateu 500 mil visualizações logo no primeiro dia. A partir daí, o Favela na Cozinha não parou mais. Quando colocou em cena a geladeira, à época, coberta por marcas de uso, o perfil decolou. E as ideias não pararam de surgir.
"Quando eu percebi, pensei 'espera aí, um milhão de visualizações?' Então, comecei a postar mais, tendo o feedback, a partir das recomendações e várias adaptações", afirma Cláudio, que pondera se inspirar em outras invenções para além daquelas que costuma criar por conta própria.
As gambiarras do Favela na Cozinha
Geladeira da Nasa
A invenção de maior sucesso é a "geladeira da Nasa". De quase inutilizável, o eletrodoméstico ganhou adaptações que só seriam possíveis de ver em geladeiras novas e caras. Ela tem compartimento externo para bebidas, dispensador de gelo e ainda serve como ar-condicionado para a casa.
Em um vídeo, Cláudio explica que tudo é realizado com materiais de baixo custo: canos, tubulações de plástico, garrafão de água, garrafas pets e torneiras adaptadas à porta. Tudo isso sem qualquer problema de vedação ou de refrigeração.
"Ela é funcional mesmo. Mas eu não aconselho ninguém a fazer porque se der problema, a geladeira é minha", alerta.
Pistola Top Zika
Outro experimento que caiu nas graças dos seus seguidores foi a transformação de uma pistola de aplicação de silicone para fazer comidas.
"Eu peguei uma aplicadora de silicone, um cano de PVC e fiz uns bicos. Agora, dá pra fazer churros, churrasco de carne moída e rosquinhas. Tudo isso sem precisar colocar a mão na massa".
Fogão de bolso
Seu o seu gás de cozinha acabar ou se desejar esquentar a comida em algum lugar a esmo, o fogão de bolso é uma opção. Com o uso de pincel, latinhas de bebidas, algodão e álcool, Cláudio mostrou nas redes sociais ser possível cozinhar feijão no improviso.
"Esse vídeo estourou e bateu 3 milhões de visualizações (somando as redes sociais). Ele é feito com latinhas de refrigerante. Funcionou legal. Trabalhando na obra, a gente usava latinha de sardinha para esquentar a marmita. Comecei a adaptar com latinha de refrigerante para deixar apenas no meu bolso. Eu lembrei disso e coloquei no canal", relata.
Micro-ondas solar
Outra engenhoca da cozinha adaptada por Cláudio foi o micro-ondas caseiro. Com caixa de papelão, vidro, isopor e papel alumínio, o almoço pode ficar quentinho. Isso sem uso de qualquer elemento químico, inflamável ou fóssil. O problema, contudo, está na dependência do sol.
"Ele é solar, na verdade. Vi em um canal, adaptei e realmente funcionou. A comida que esquentei ali realmente ficou quente, tanto que até mostrei o vídeo embaçando com a temperatura dos raios solares", garante.
Copo térmico
Com apenas duas latinhas, um pincel e gesso, um copo térmico foi criado por Cláudio, saindo bem mais barato do que aqueles que viraram modinha para manter a cerveja gelada.
O segredo para manter a temperatura da bebida, segundo Cláudio, está no gesso. "Ele é um material frio, o produto fica gelado até melhor que no copo Stanley original. Esse experimento fez um sucesso imenso e muita gente não sabia que dava para fazer isso".
Sorvete de cabeça de galinha e cerveja caseira
Além das gambiarras, Cláudio divide as publicações com dotes culinários curiosos com receitas próprias. É o caso do sorvete de cabeça de galinha, que repercutiu entre seus seguidores.
No vídeo, Cláudio mostra que o preparo do sorvete foi como qualquer outro até ter colocado cabeça de galinha triturada na panela para fazer o sabor peculiar. Ele garante que provou e ficou bom.
"O sorvete de galinha eu fiz de verdade, mas foi mais uma brincadeira. Eu mesmo comi, mas não gosto de ensinar a fazer", acentua.
Outra receita que bombou foi a cerveja caseira e a maria louca — cachaça comum nas prisões. A fermentação e extração das bebidas aconteceram de maneira improvisada, muito longe dos aparatos usados pelos mestres cervejeiros ou cachaçarias.
"As cervejas eu aprendi na internet, mas adaptei ao que eu tinha. Sobre as bebidas, eu também já fiz a maria louca, que é muito conhecida na prisão e que foi me repassada por amigos. Não é aconselhável a pessoa fazer porque o teor de álcool é elevado".
'Já pensei em parar'
Cláudio conta que, apesar do relativo sucesso, tenta lidar com haters. Em um caso recente, precisou excluir de uma das plataformas um vídeo de uma mini churrasqueira após usuários o classificarem como perigoso, o que consequentemente, segundo ele, tem afetado o engajamento e a monetização.
"Pensei em parar, mas o apoio de quem gosta dos vídeos me fez continuar. O plano agora é seguir e tentar viver da monetização. A intenção é crescer. Mas um grupo de pessoas os veem como perigosos, o que fez a pouca monetização cair drasticamente", lamenta Cláudio, que precisa dividir o tempo entre os vídeos e os bicos.
"Até comecei a ganhar certa grana nas redes sociais, mas isso no começo. Agora não está bom assim. Parte da minha renda vem das redes sociais, mas preciso fazer alguns bicos", completa.