Água até o pescoço e caixa na cabeça: o desespero para salvar pets no RS
Moradores de Porto Alegre e região metropolitana relatam medo e dificuldade para salvar cachorros e gatos de áreas afetadas pelas enchentes que atingem o Rio Grande do Sul.
'Cena de guerra'
A tradutora Júlia Corrêa Mitidieri, de 28 anos, saiu do apartamento em que mora na divisa dos bairros Cidade Baixa e Menino Deus, na capital, na última segunda-feira (6). Segundo ela, o cenário era "de guerra".
O edifício já estava sem energia elétrica. Na rua, a água batia na altura do peito.
Os bombeiros pediram para a gente sair, mas eu não ia embora sem meus gatos.
Julia Corrêa
Júlia tem seis gatos e, no início da semana, abrigava um casal de amigos com mais dois —entre os pets, alguns são idosos e outro é cego. "Eram oito e não tínhamos caixa de transporte para todos. A orientação era enrolá-los em toalhas, mas não queria fazer isso porque uma amiga perdeu uma gata assim. Ela estava enrolada na toalha e pulou na água."
Com muita dificuldade, Júlia e os amigos conseguiram as caixas de transporte e iniciaram o salvamento na noite de segunda. Sete conseguiram ser resgatados ainda naquele dia e saíram do apartamento com ela. A Medusa, de 6 anos, ficou.
Ela se assustou e se escondeu, fiquei uma hora procurando e não achei. Deixei água e comida, e fui embora. Voltei no dia seguinte com medo de o apartamento ter sido saqueado e ela ter fugido.
Júlia Mitidieri
Ontem, quando Júlia voltou para resgatar Medusa, a água já batia no seu pescoço. "Tinha de deixar a cabeça virada para cima, se não meu queixo molhava", lembra ela.
A gatinha foi retirada do apartamento dentro da caixa, que precisou ser levada acima da cabeça. Ela, os amigos e os oito animais estão em segurança na cidade litorânea de Imbé (RS).
Cheguei a pensar que ia perdê-los, principalmente a que deixei no apartamento. É muito triste colocá-los nessa situação, mas eu não tive escolha. Estou aliviada, mas estou com medo porque não sei quando vou voltar para casa.
Júlia Mitidieri
Cachorros também foram resgatados
Em Campo Bom, na região metropolitana, a costureira Nathalia Laiz Vargas, de 32 anos, achou que perderia suas duas cachorras, Luna e Feinha. Uma delas chegou a ir para um lar temporário, mas já foi resgatada pela família.
A casa ficou parcialmente submersa. "Perdi bastante coisa", conta ela, que mora no bairro Vila Rica. Nathalia, o marido e as três filhas estão na casa de parentes. As cachorras, na casa da cunhada dela, estão longe do perigo. "Achei que tinha perdido, foi muito bom vê-las de novo."
'Quando voltei para pegar animais, a água estava muito alta'
O mesmo aconteceu na casa da garçonete Andriele de Souza Mendonça, de 24 anos, moradora da mesma cidade. "A água chegou praticamente no teto, perdi todos os móveis. Só consegui pegar minhas roupas e as dos meus filhos."
Tenho três cachorros e dois gatos, todos foram resgatados. Um dos maiores momentos de desespero foi tirar meus filhos e, quando voltei para pegar [os animais], a água estava muito alta. Fiquei com medo de eles morrerem afogados.
Andriele de Souza Mendonça
Os cinco bichos foram salvos por uma ONG e estão em um lar temporário até a situação do município melhorar e Andriele voltar para casa —agora, ela está na residência de parentes.