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'Construções comprometidas': voltar para casas alagadas no RS é seguro?

Depois de dias alagada, paredes da casa de Milena ficaram destruídas Imagem: Acervo pessoal

do UOL, em São Paulo

22/05/2024 04h00

Em meio a uma enchente que já dura mais de 15 dias, o Rio Grande do Sul enfrenta o maior desastre natural do estado - o que acarreta também um grande dano material. Mesmo nos locais onde a água já baixou, pode não ser seguro retornar para as casas.

"Muita coisa será perdida", diz o arquiteto Denis Ferri, diretor do Instituto de Arquitetos do Brasil, na sucursal de São Paulo. Segundo ele, a reconstrução da cidade precisará prever a crise climática como um dos fatores das novas construções.

Tempo embaixo d'água

Para o especialista, é difícil precisar quanto tempo as casas aguentam a força das águas e das inundações antes de começarem a apresentar avarias. Essa resposta depende de vários fatores, como o tipo de fundação e os materiais utilizados nas construções.

"Se o prédio ou casa é feita de concreto, por exemplo, algo que é comum do século 20, ela será mais resistente à água, dado que temos infraestruturas subaquáticas que fazem uso desse material. O problema pode estar no sistema estrutural. O fluxo da água movimenta o solo e impacta a estrutura", diz Ferri.

Se o solo se moveu e tirou a estrutura do seu local original, a construção, mesmo que o concreto tenha resistido, pode estar comprometida.

Fabio Prado, professor de engenharia civil do Instituto Mauá de Tecnologia, diz que a força das águas pode fazer com que a fundação de algumas casas "queiram flutuar".

Isso pode mudar o comportamento da fundação e dependendo da quantidade de água a casa pode flutuar um pouco. Mas só é possível dizer se há realmente problemas com uma inspeção.

O professor destaca que, como a água está dentro e fora das casas, o empuxo, nome da força que a água faz em objetos submersos, está equilibrado. O que pode ser uma boa notícia.

"A enchente não está gerando um esforço novo nas paredes. O problema seria se a água estivesse só de um dos lados, como aconteceu com os diques de contenção", explica.

Em casas de alvenaria tradicionais, feitas com tijolo e cimento, além da fundação, há também que se prestar atenção em pilares e colunas.

"Algumas casas são do que chamamos de alvenaria estrutural, onde as próprias paredes sustentam telhados e pisos superiores", explica Ferri. A força da água pode desestabilizar o local, tornando-o perigoso.

Se as paredes apresentarem rachaduras ou inclinações, é perigoso. Mas só quem pode dizer isso com certeza é um perito, que pode ser tanto um arquiteto quanto um engenheiro, e funcionários da Defesa Civil.
Denis Ferri

Parede de madeira

Casas de madeira enfrentam ainda mais problemas - e poucas chances de salvamento. "Esse material é muito comum no uso construtivo do sul do Brasil. E quando a madeira entra em contato com a água, ela inicia um processo de decomposição natural", diz Ferri.

O especialista explica que a água faz com que as fibras da madeira se desagregam, cursando uma decomposição natural dos seus agentes biológicos, o que leva a sua destruição. Nem mesmo produtos para impermeabilização conseguem prevenir esse problema quando as construções ficaram embaixo d'água.

Já para Prado, não podemos ser tão generalistas em relação às madeiras. "Depende do tipo usado na construção, se tem projeto ou não, como ela foi tratada? Tudo isso implica na resistência que ela terá à água", diz.

Problema vai além da estrutura

Segundo o arquiteto, tanto as instalações elétricas quanto as hidráulicas também podem ser danificadas por conta das enchentes. "Existem componentes metálicos, como disjuntores que oxidam em contato com a água. É muito importante tomar cuidado com o retorno da energia e ter certeza que todo o sistema está seco para evitar risco de choques", diz.

Prado concorda. "Pode ter acúmulo de água nos conduítes, que são os tubos que levam os cabos de energia para dentro das residências. O que pode gerar um curto-circuito e causar incêndios. É preciso cuidado e testes com especialistas antes", diz.

Ferri também explica que o sistema de água fria, esgoto e captação da água da chuva está cheio de lama. Por isso, será importante um serviço de desentupimento.

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