Pode anal? O que pensam evangélicos e católicos sobre tabus sexuais

Sexo costuma ser um assunto difícil dentro das igrejas católicas e evangélicas. Devido a interpretações bíblicas e doutrinas estabelecidas ao longo dos séculos pelas igrejas e suas lideranças, ainda há muitos tabus sobre o tema. Em muitas instituições, evita-se até mesmo falar sobre o assunto, que tem a aparência de algo proibido de ser discutido.

Entendendo os tabus

Sexo antes do casamento

A maioria das denominações cristãs ensinam que o sexo deve ser reservado para o casamento e que o praticar antes disso é considerado pecaminoso. Essa doutrina é fortemente cobrada de jovens que estão namorando ou na fase do noivado.

Inclusive, em 2011, surgiu a famosa campanha "Eu Escolhi Esperar". Segundo o site do projeto, ele tem o objetivo de atuar na "preservação sexual e integridade emocional". A campanha, que é interdenominacional, conta com a participação de católicos e evangélicos e, desde sua fundação, já realizou seminários em todos os estados brasileiros e também no exterior, em países como Colômbia, Argentina, Paraguai, EUA, Inglaterra, França e Haiti.

Francisco Neto, pastor da Igreja Vineyard Mesa, no Rio de Janeiro, afirma que a prática é realmente considerada um pecado para os evangélicos. "Eu gosto de pensar que o ato conjugal que sela uma união é o próprio sexo", diz.

"Contra os princípios cristãos". O padre Luiz Sleutjes, doutor em Teologia Moral e professor no curso de teologia da PUC-Campinas, explica que na perspectiva católica "a sexualidade é entendida a partir de uma compreensão integral do ser humano e não apenas na genitalidade" e concorda com o pastor quando o assunto é sexo antes do casamento. Para ele, prática "irá contra os princípios cristãos".

Pornografia

O consumo de material pornográfico também é frequentemente considerado contrário aos princípios cristãos. Para o padre Luiz, "a pornografia é vista como uma distorção da sexualidade humana e uma violação da dignidade das pessoas envolvidas".

O pastor Francisco argumenta que o conteúdo é "uma das diversas formas de objetificar e tornar o sexo algo para além da identidade, do afeto e da intimidade".

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Sexo fora do propósito procriativo

Alguns ensinamentos cristãos enfatizam que o sexo deve ser realizado apenas com o propósito de procriação, embora essa visão não seja universal entre religiosos. Na opinião do pastor Francisco, dentro do casamento a prática sexual pode ser apreciada "sem moderação", ou seja, não deve estar apenas condicionada ao desejo de ter filhos.

Para os católicos, o assunto é tratado de maneira diferente. "Qualquer ato sexual que seja deliberadamente separado do propósito procriativo, como o uso de contraceptivos artificiais abortivos, é considerado contrário aos ensinamentos da Igreja Católica", afirmou o doutor em teologia moral.

Masturbação

Muitas denominações ensinam que o ato é contrário aos princípios cristãos, porque pode ser visto como uma forma de luxúria. O padre Luiz explica que a palavra masturbação tem origem no latim e significa "manchar a si mesmo". Para o sacerdote católico, "trata-se de uma expressão egoísta e individualista da sexualidade".

Já o pastor Francisco tem uma opinião diferente. Para ele, a prática é permitida, desde que seja dentro da relação matrimonial, especialmente "quando existe alguma restrição na penetração".

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Sexo no período menstrual

Francisco afirma que a restrição bíblica quanto a essa prática estava ligada a "um viés de saúde pública da época, unido à figura inferiorizada da mulher pela sociedade". Contudo, para o pastor, não há pecado nesse tipo de relação, já que o impeditivo fazia sentido no contexto daquela época e não mais agora. Por outro lado, o padre Luiz conta que a Igreja Católica não tem uma posição específica sobre isso.

Sexo oral

Luiz afirma que a Igreja Católica não tem uma definição estabelecida sobre a prática. Para o pastor evangélico, também não há nenhuma restrição bíblica. Pelo contrário, segundo ele: "em Cânticos dos Cânticos 2.3, podemos ver a esposa declarando que estava sobre a sombra da árvore com a fruta de seu amado em sua boca e isso lhe era prazeroso".

Francisco compreende que "a performance sexual diversificada está associada ao prazer na rotina sexual de um casal que se propõe a passar toda a vida juntos".

Sexo anal

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Na opinião do pastor, esse é provavelmente o ponto de maior tensão entre os cristãos. Francisco explica que há pastores que usam o texto de Romanos 1.26 para argumentar que tal prática é uma perversão da forma natural do sexo. "Eu não tenho essa percepção, para mim o texto está mais relacionado a outras questões, como a sexo ritualístico, por exemplo".

Assim como na prática do sexo durante o período menstrual e do sexo oral, a Igreja Católica, de acordo com o padre, não tem posição definida sobre o assunto. "No entanto, destaca-se que se deve respeitar a integridade física e psicológica das pessoas envolvidas".

O que a psicologia tem a dizer sobre isso?

Jaroslava Varella Valentova, doutora em antropologia e psicologia, e professora do Instituto de Psicologia da USP, explica que a sexualidade está ligada à saúde e bem-estar das pessoas. "O desejo e comportamento sexual não é só uma questão universal dos humanos, mas também de outras espécies que se reproduzem sexualmente", diz.

A doutora comenta que, apesar da função do sexo do ponto de vista evolutivo ser a reprodução, é importante entendermos que "uma grande parte do comportamento sexual não leva a reprodução". Por isso, a especialista reforça que a prática do sexo também tem outras funções, incluindo aspectos sociais.

Sobre os tabus a respeito do assunto, muitos deles por questões religiosas, Jaroslava expõe a necessidade de não tentar impor uma receita única para todas as pessoas, respeitando a individualidade.

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Por exemplo, assistir pornografia pode ser recomendada para mulheres ou homens com baixo desejo sexual para melhorar a vida sexual do casal. Por outro lado, outra pessoa pode sofrer vício de pornografia, o que atrapalha a sua vida sexual. Jaroslava Varella Valentova, doutora em antropologia e psicologia, e professora do Instituto de Psicologia da USP

A doutora esclarece que, na visão da psicologia sexual, tanto a pornografia como a masturbação não são negativas em si, mas cada paciente deve ser avaliado de acordo com a sua realidade. Sobre os outros tipos de práticas sexuais, a doutora acredita que uma restrição muito rígida devido à religião pode desencadear em transtornos de ansiedade. Em sua visão, o que deve prevalecer é a decisão consensual das pessoas envolvidas.

Em suma, enquanto as proibições sexuais nas igrejas cristãs podem ter fundamentos teológicos, ecológicos, ou até na saúde pública do passado, é crucial reconhecer seu impacto potencial na saúde mental e emocional das pessoas. Promover uma abordagem mais compassiva, aberta e inclusiva em relação à sexualidade pode ajudar a mitigar esses efeitos negativos e promover uma compreensão mais saudável e holística da sexualidade humana.

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