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Choque, medo: 20% dos voluntários do RS podem desenvolver transtorno mental

Voluntários participaram do resgate do cavalo Caramelo em Canoas (RS) Imagem: Arquivo pessoal

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Balneário Camboriú (SC)

23/05/2024 04h00

Há mais de duas semanas, voluntários e resgatistas trabalham sem parar por conta das enchentes no Rio Grande do Sul. Porém, uma parcela de 20% dessas pessoas poderá desenvolver algum tipo de transtorno mental, explica Christian Kristensen, coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trauma e Estresse da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).

O que aconteceu

Entre 10% a 20% das pessoas que atuaram em resgates poderão desenvolver transtorno de estresse pós-traumático. "Para se ter uma ideia (o índice) é mais alto do que a gente esperaria encontrar na população geral, que é algo em torno de 6%", explica o professor.

Estimativa é baseada em pesquisas dos últimos 40 anos sobre desastres. Entre esses estudos está o acompanhamento de atingidos pelo furacão Katrina, nos Estados Unidos, no qual 1392 pessoas morreram. "Um estudo mostrou que uma a cada 6 pessoas apresentou algum transtorno mental grave após 12 anos de ocorrência do evento, das pessoas que foram diretamente expostas pelo Katrina", observa Kristensen.

Inicialmente vão aparecer reações. Normalmente, os primeiros sinais aparecem depois de uma semana do desastre. Segundo o professor da PUC-RS, elas são chamadas de "reações agudas de estresse" São elas: choque, medo, sensação de impotência, dificuldade para tomar decisões, ter memórias indesejáveis e pesadelos. Também podem surgir reações físicas, como tensão muscular, cansaço, fadiga, exaustão, insônia e diminuição do apetite. E ainda há reações que podem interferir no relacionamento interpessoal.

A pessoa (pode querer) ficar muito isolada, pode se sentir distanciada dos outros, ou ter um senso de desconfiança aumentado, necessidade de controle exagerado em relação ao ambiente, explica Kristensen.

Maior parte das pessoas não vai desenvolver transtornos mentais. "Cerca de 80 a 90% não vão desenvolver transtorno mental. São reações esperadas para esse momento agudo, mas elas passam". Porém, a preocupação é com aqueles nos quais essas reações vão perdurar por mais tempo. "Tem pessoas que estavam atuando no resgate, atuando nos abrigos, e essas pessoas têm um risco aumentado para entrar em sofrimento psicológico."

Estimativa varia conforme a pessoa. "Tem gente que foi lá e salvou um cachorro. Mas tem gente que foi lá resgatar e se deparou com corpos dentro de água. Ou teve gente que ficou 4 noites sem dormir. É algo extremo do ponto de vista de saúde mental, além do risco de hipotermia, entre outras coisas."

Do ponto de vista de saúde mental, isso coloca as pessoas em risco aumentado para apresentar problemas, como estresse pós-traumático, depressão, transtornos de ansiedade, entre outras coisas. (...) A gente sabe que as pessoas mais afetadas são aquelas expostas diretamente: quanto maior o grau de exposição, maior é o sofrimento psicológico.

Universidade disponibiliza curso para psicólogos. O Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trauma e Estresse ofereceu um curso rápido, de cerca de duas videoaulas, para os psicólogos que estão fazendo atendimento aos resgatados e desabrigados. Os participantes têm acesso aos "principais elementos técnicos", segundo Kristensen.

É uma intervenção de baixa complexidade, basicamente propõe a fazer escuta empática, de forma não invasiva. (Ao chegar ao local), o profissional se apresenta e se coloca à disposição da pessoa que pode ou não querer receber ajuda. O profissional observa e auxilia para resolver necessidades básicas, práticas, mais emergenciais e também preocupações psicológicas - ele auxilia a organizar prioridades e, se necessário, oferece uma regulação emocional. Se a pessoa está muito agitada, dá para aplicar alguma técnica de relaxamento. Christian Kristensen, coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trauma e Estresse da PUC-RS

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