'Recebi 30 denúncias': pastor é investigado por abusos sexuais em GO e PA
Maurício Businari
Colaboração para o UOL
24/05/2024 04h00
A Polícia Civil está investigando o pastor Dagmar José Pereira, da Igreja Assembleia do Reino de Deus, por supostos abusos sexuais cometidos contra mulheres da congregação. Os casos teriam acontecido nos estados de Goiás e Pará.
O que aconteceu
As acusações vieram à tona após a estudante Isabella Sâmara, 21, moradora de Goiânia, começar a divulgar os relatos das vítimas em suas redes sociais. Isabella, que cresceu frequentando a igreja e conhecia o pastor, como uma figura familiar, sentiu-se obrigada a agir após receber diversos relatos de abusos cometidos por ele.
"Eu comecei a falar sobre ele no Instagram por causa de uma situação que me deixou chateada e, logo após isso, as vítimas começaram a aparecer, compartilhando suas histórias de abuso", explica Isabella, que perdeu a conta de quantas denúncias recebeu por meio de vídeos e mensagens. "Acredito que recebi mais de 30 denúncias."
Em seu perfil no Instagram, Isabella reuniu muitos depoimentos de mulheres que dizem terem se calado durante anos após os abusos e que, influenciadas pela onda de denúncias exibidas por Isabella, ganharam coragem de contar as histórias delas também.
Eu sei quem ele é. Ele foi meu líder de jovens nessa época. Lembro que em um retiro durante um banho de rio, ele pegou na minha bunda bem forte e apertou. Lembro que fiquei tão assustada, que congelei. Fora os abraços mais estranhos e pegajosos. Que a justiça seja feita e ele pague, relata uma das mulheres, em uma mensagem' enviada a Isabella.
"Comigo ele fez o mesmo, dizia que se eu falasse nenhum jovem da igreja ia falar mais comigo, que se ele me excluísse, todos os jovens fariam o mesmo, e eu não ia participar mais de nada", afirma outra jovem. Segundo Isabella, entre as vítimas estão mulheres que, à época dos acontecimentos, ainda eram adolescentes.
Um desses depoimentos que mais me marcou foi o de uma mulher que contou a ele, em confissão, em segredo de sacerdócio, sobre um trauma anterior. Ela havia sido abusada. Ela disse a ele que não gostava que tocassem em seus seios devido ao trauma. Em vez de oferecer apoio, ele usou essa informação para abusar dela ainda mais. E pegou nos seios dela para 'fazer a comprovação' de que ela teria realmente aflição ao ser tocada.
Isabella Sâmara
Mensagens intimidadoras
A situação escalou rapidamente, com Isabella recebendo mensagens questionadoras, incluindo intimidações do filho do pastor. "Quando a polícia começou a receber as denúncias, o filho dele mandou mensagens intimidatórias para minha família," conta Isabella. Apesar do medo e das ameaças, ela continuou a usar suas redes sociais para dar voz às vítimas, recusando-se a ser silenciada.
Até o momento, segundo a Polícia Civil de Goiás, duas mulheres procuraram a Delegacia da Mulher para prestar depoimento. Já a Polícia Civil do Pará não informou o número de mulheres que se apresentaram à Deaca (Delegacia Especializada no Atendimento à Criança e ao Adolescente) de Parauapebas.
Isabella acredita que muitas das vítimas ainda têm medo de denunciar formalmente à polícia devido à manipulação e ao controle exercidos pelo pastor ao longo dos anos. "Ele manipulava as vítimas por anos antes de abusar delas," afirma Isabella. "As meninas estão com muito medo, pois ele criou um ambiente de intimidação e controle".
Advogados para a causa
O empresário Márcio Bieda Júnior, que também é pastor e dono de um escritório de advocacia, destacou três advogados (em Goiás e no Pará) para darem suporte jurídico a Isabella e às vítimas. Ele está ajudando a coordenar as denúncias. O flagrante, explica, seria quase impossível, pois os casos são antigos, ocorreram entre 10 e 15 anos atrás.
Uma das denunciantes era da família do pastor. Ele era da Assembleia de Deus de Anápolis (GO). Muitas mulheres reclamaram dele às lideranças na época, o que resultou em sua transferência para Parauapebas, onde ele continuou a agir. Vamos ajudar essas moças até o fim. Seremos a voz que elas não tiveram esses anos todos.
Márcio Bieda Júnior
Bruna Tomaz, uma das advogadas contratadas por Bieda Junior, disse não poder comentar muita coisa sobre o caso, pois as investigações correm em sigilo. "Chegou ao nosso conhecimento de que seriam 50 vítimas, porém, nem todas fizeram boletim de ocorrência. Em Goiás, só fizeram até agora, a princípio, dois boletins de ocorrência. Até porque tomou uma proporção tão grande que as vítimas estão com medo de fazer, realizar efetivamente a denúncia".
O UOL entrou em contato com a igreja Assembleia de Deus de Anápolis, mas não obteve resposta aos questionamentos. O espaço segue aberto.O pastor Dagmar Pereira também foi procurado, mas preferiu não se manifestar. Pereira apagou seus perfis nas redes sociais. Em nota, sua advogada, Gessyca Amorim, esclareceu que ele compareceu de livre e espontânea vontade à Delegacia de Atendimento à Mulher para obter informações sobre os crimes que lhe estão sendo imputados. "Foi constatado que apenas no dia 16, no final da tarde, foram registrados dois depoimentos", afirma.
A defesa aguarda ser chamada para o cliente ser ouvido e seja feita a devida apuração dos fatos, na DEAM de Senador Canedo. Inclusive, deixou seus dados lá para que pudessem chamá-lo. Quanto às denúncias veiculadas na mídia sobre o Estado do Pará, esclarecemos que não tivemos acesso a informações e não consta denúncias protocolizadas em nenhum dos estados sobre as alegações feitas contra o cliente. Estamos aguardando a Polícia Civil de ambos os estados para que o cliente seja ouvido. Enquanto isso, ele se mantém disponível para prestar qualquer esclarecimento necessário às autoridades.
Gessyca Amorim