Previu morte aos 15: a história de Silvia, santinha popular de Santa Maria

Um túmulo em um cemitério de Santa Maria (RS) chama a atenção pelas placas de agradecimento. É um dos mais visitados e não pertence a um político e nem a uma celebridade: quem está sepultada ali é Silvia Regina Leal, que morreu aos 15 anos, no réveillon de 1984.

Nascida em Santa Maria em 1968, Silvia era católica e muito ativa na Igreja de São José. Pouco antes de partir, previu a própria morte, segundo conta a família —e deixou um registro misterioso em um diário. Hoje, é considerada uma "santinha popular" da cidade.

A minha vida, ou parte dela, será encerrada aqui neste singelo caderno.
Silvia, no diário, em julho de 1983

"Ela não se sentia confortável com isso [prever a morte], não era uma coisa perfeitamente aceitável, segundo o que a mãe fala. Ela apenas sabia", afirma a fotógrafa Ligia Leal, de 46 anos, uma das irmãs mais novas de Silvia. Na época dos fatos, Ligia tinha quase seis anos.

Foto do diário de Silvia
Foto do diário de Silvia Imagem: Arquivo pessoal

Depois da catequese, que fez entre os 10 e 11 anos, o lado religioso de Silvia aflorou: queria ser freira e seguir a vocação católica. Não havia nenhum padre na família, mas ela sempre falava da igreja com muita propriedade. Era devota de Nossa Senhora, que teria feito a revelação de sua morte em sonho.

Silvia liderava projetos de caridade, arrecadava alimento para quem precisava, promovia terços, segundo a irmã. E movimentou a cidade para que a Igreja de São José tivesse um salão paroquial —cenário de seu velório pouco tempo depois.

Essa construção foi muito breve, porque em uns quatro anos ela faleceu. Mas, neste período curto de vida, ela marcou muitas pessoas do nosso bairro.
Ligia Leal

Morte de Silvia

Silvia morreu na madrugada do dia 1º de janeiro de 1984, aos 15 anos, em um acidente de carro. Os quatro ocupantes da caminhonete, que capotou, estavam reunidos para passar a virada do ano juntos e no momento do acidente retornavam para a casa.

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"Não foi um acidente brutal, eles não bateram. A caminhonete capotou em uma grande valeta que estava em construção. A Silvia caiu do banco, a porta se abriu e fechou na parte frontal da cabeça dela. O óbito foi instantâneo", diz Ligia. O motorista do carro também morreu.

Silvia e a irmã Ligia
Silvia e a irmã Ligia Imagem: Arquivo pessoal

Horas antes do acidente, Silvia foi ao cemitério com uma amiga. Segundo a família, nesta visita, ela apontou para um túmulo e disse que ficaria ali. "Só que nós não tínhamos jazigo, nada. Esse túmulo era da avó da amiga dela", explica Ligia.

No dia seguinte, quando morreu, foi enterrada naquele lugar —oferecido pela família da amiga. Posteriormente, com o seguro da caminhonete do acidente, a família Leal adquiriu um túmulo próprio e transferiu Silvia definitivamente para lá.

Ela tinha receio de dar trabalho, dar gastos. E parece que tudo aconteceu de uma forma que esse medo dela não se concretizasse. Ela não deixou despesa nenhuma. Não gastamos nada, nem com o velório.
Lígia Leal

"O salão paroquial da igreja, que ela incentivou a construção, foi o local do velório. Era muita gente."

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Túmulo de Silvia e algumas das plaquinhas dele
Túmulo de Silvia e algumas das plaquinhas dele Imagem: Reprodução/@tumultulos

Devoção

De acordo com Ligia, a manifestação popular de devoção a Silvia foi calma e começou aos poucos. Logo após a morte, as visitas da família ao túmulo eram frequentes. E, com o tempo, eles notaram que surgiam plaquinhas de agradecimento à jovem, muitas de autoria desconhecida. "Foi muito silencioso", diz Ligia.

Há cerca de 20 anos, a história de Silvia começou a se espalhar pela cidade. Primeiro, por meio do jornal local, que dedicou uma matéria de capa aos santos populares da cidade. Depois, chegaram a entrevistar a mãe e alguns vizinhos.

Ela está sempre aparecendo de uma forma estranha [por sinais]. Quando vemos, tem alguma coisa boa acontecendo em volta dela, por mais que tenham se passado 40 anos.
Ligia Leal

Algumas pessoas deixam agradecimentos no túmulo de Silvia por graças alcançadas. "A gente não sabe quais são essas graças que foram alcançadas, porque não conhecemos quem fez as homenagens", pondera Ligia. "Mas essas manifestações vêm desde o primeiro túmulo, aquele que era emprestado. Era escrito no cimento mesmo, sem plaquinha."

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Hoje, o túmulo de Silvia tem, pelo menos, oito placas de agradecimento. E, segundo registros de jornais locais, o espaço onde ela está sepultada é um dos mais visitados do cemitério São José.

Recortes de jornais que citam o túmulo de Silvia
Recortes de jornais que citam o túmulo de Silvia Imagem: Reprodução/@tumultulos

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