Bolsonaro manda Jair Renan virar 'candidato mudo' em campanha em SC
Concorrendo a vereador em Balneário Camboriú (SC), Jair Renan Bolsonaro (PL) tem um grande trunfo para ser o candidato mais votado da cidade: o sobrenome.
O que aconteceu
Para não atrapalhar uma eleição dada como certa pelo partido, ele recebeu a ordem de ficar calado. Jair Renan é considerado pouco experiente e haveria possibilidade de cometer gafes, perdendo aliados e votos.
A determinação para não falar partiu do próprio Jair Bolsonaro. O ponto alto da viagem de campanha do ex-presidente a Balneário Camboriú na semana passada foi um comício na quinta à noite.
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Na hora em que o locutor pediu para Jair Renan "dar um alô", Bolsonaro reagiu imediatamente. Olhou na direção da organização e balançou o indicador em sinal negativo. O filho comentou algo em seu ouvido e vida que segue. Autoridades e eleitores tentaram disfarçar o climão agindo como se nada tivesse acontecido.
Desautorizado pelo pai na frente dos eleitores, Jair Renan permaneceu o comício todo calado. Acionou a versão papagaio de pirata na segunda fileira do palco, atrás de Bolsonaro e do governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL).
Conceder entrevistas também é desaconselhado para Jair Renan. Nada de novo. Quando nem era candidato e circulava pelo Congresso Nacional, sempre acompanhado do deputado Zé Trovão (PL-SC), Jair Renan já era arredio em conversar com a imprensa.
Por fim, Jair Renan também adotou o modo "mudo" no próprio Instagram. Ele aparece em clipes entregando santinhos, ao lado do irmão Eduardo Bolsonaro (PL-SP), mas em nenhum momento pede voto. Também não há nenhuma declaração sobre as ideias e bandeiras que defende.
A reportagem obteve um vídeo com um raro discurso do candidato. Tratava-se de um evento com a Guarda Municipal de Itajaí, cidade vizinha. Jair Renan começou com um palavrão: "Direitos humanos é o c*". O discurso durou 54 segundos e terminou com ele dizendo que bate continência para toda a tropa.
Os aliados dizem que falta experiência, mas adversários chamam de despreparo. Eles ressaltam que o rapaz chegou aos 26 anos sem ter cursado ensino superior e nunca se envolveu com política.
A orientação para não discursar é vista como atestado de incompetência pelos rivais. Em conversa com o UOL, um adversário foi irônico e venenoso. Disse: "Bolsonaro está certo em fazer ele ficar quieto. É melhor as pessoas acharem que você é idiota do que abrir a boca e confirmar essa impressão".
Mudo e favorito
Rivais consideram Jair Renan despreparado e uma potência de votos. Afirmam que o rapaz só precisa do sobrenome para virar o vereador mais votado da cidade.
Balneário Camboriú entregou 74,57% dos votos a Bolsonaro no segundo turno. Também foi escolhida para sediar o CPAC, evento da direita que trouxe Javier Milei, presidente argentino, ao Brasil.
O PL tem interesse em manter a imagem de Jair Renan intacta. Em seu discurso no comício de quinta passada, o próprio Bolsonaro declarou que o filho será um puxador de votos e levará mais conservadores para a Câmara de Vereadores.
Adversários enxergam o uso do filho do ex-presidente como arma na campanha a prefeito. Pesquisa do Instituto Mapa colocou o candidato do PL, Peeter Grando, em segundo lugar, com 25,2% das intenções de voto. A líder, Juliana Pavan (PSD), tem o dobro: 50,4%. A eleição tem apenas um turno em Balneário Camboriú.
Jair Renan seria uma ferramenta para tentar virar o jogo. O vínculo com o ex-presidente é estimulado pelo partido desde a pré-campanha com a escolha do nome de urna sendo "Jair Bolsonaro".
Campanha com a cara do pai
O título de Dubai brasileira que muitos atribuem a Balneário Camboriú é refutado pelo atual prefeito, Fabrício Oliveira (PL). Ele combate o apelido por saber que a cópia sempre valerá menos, porque carece de autenticidade.
Jair Renan faz o contrário e repete os elementos da campanha do pai. A camisa de futebol, no caso da seleção brasileira, é o uniforme de pedir votos. Exaltação da polícia e referências a Donald Trump também estão no seu repertório.
Os atos de campanha investem no verde e amarelo. Pessoas que conversaram com ele relataram ao UOL o uso de frases características de Jair Bolsonaro.
Marlene Ferraz, 61, ouviu da boca dele a expressão "Deus, pátria, família e liberdade" e se convenceu a entregar o voto. Ela se apresenta como conservadora convicta e conta que acampou por algumas semanas na frente do quartel-general do Exército, em Brasília, depois da eleição.
A aposentada não sabe mais nada do candidato, mas ser o filho de Bolsonaro basta. Para provar o alinhamento com o ex-presidente, Marlene revela que bandeira com a qual se envolve foi comprada no acampamento em frente ao Exército.
Uma mulher diz que digitará o número de Jair Renan porque ele esteve na igreja que frequenta. Ela trabalha na campanha de outro candidato a vereador pelo PL, por isso não diz o nome. Mas diz que acreditar em Deus e ser filho do ex-presidente é suficiente.
Nilson Bittencourt, 50, vota Jair Renan por causa da defesa da redução de impostos. Uma exceção, o advogado relata que falou com o candidato em um almoço. Ouviu que é preciso apoiar o empreendedorismo.
Espalhar o parentesco
Um integrante do PL contou ao UOL que Jair Renan não é reconhecido em restaurantes e lugares públicos de Balneário Camboriú. Ele relatou que as pessoas reagem como se uma identidade secreta fosse revelada quando ficam sabendo do parentesco. O objetivo da campanha é multiplicar essa reação para uma escala municipal.
Jair Renan também tem feito eventos em cidades vizinhas. A situação é vista por políticos de Balneário Camboriú e região como um sinal de "voos mais altos", com uma provável disputa por vaga de deputado federal em 2026.
Rivais ressaltam que um vereador não poderá ficar dois anos sem discursar. Eles apostam que Jair Renan vai produzir fatos contra si mesmo e morrerá pela boca.