República Islâmica está morta na cabeça dos iranianos, diz cineasta Makhmalbaf
Quando a onda de protestos revolucionários começou a derrubar ditaduras do Oriente Médio e África, acreditava-se que o Irã poderia ser um dos regimes afetados. Em alguns meses, caíram as ditaduras da Tunísia, Egito, Líbia e outras ainda estão ameaçadas. O regime dos aitolás, no entanto, parece sobreviver sem maiores danos. Apenas parece. Segundo o cineasta iraniano Mohsen Makhmalbaf, a República Islâmica está morta na cabeça das pessoas.
O diretor participou da Sabatina Folha-UOL, realizada na última sexta-feira (4) durante a projeção de “Green Days”, documentário dirigido por sua filha Hana Makhmalbaf e que lembra a onda de protestos que se seguiu às eleições presidenciais iranianas de 2009.
“A cultura [no Irã] está mudando. E primeiro é preciso transformar a cultura para depois mudar a política”, disse. “O sistema tem que mudar, mas tem que mudar primeiro na cabeça das pessoas”, acrescentou o diretor, autor de "Salve o Cinema" e "A Caminho de Kandahar".
Para exemplificar o descompasso entre o regime totalitário e a mentalidade da sociedade iraniana, Makhmalbaf propôs um exercício à plateia. “A Revolução Islâmica separou homens de mulheres. Nos ônibus há uma barra que separa os lugares para homens e para mulheres. Façam o teste: as mulheres sentem no lado esquerdo da plateia e os homens no lado direito. Se fosse no Irã, as mulheres que permanecessem no lado direito seriam presas; quem ficou no meio provavelmente seria espancado pela polícia.”
A declaração de Makhmalbaf parece ir ao encontro das imagens captadas por sua filha em 2009. Em uma determinada cena de “Green Days”, um grupo de simpatizantes do candidato presidencial reformista Mir Hossein Mousavi grita que “nosso voto é a nossa cultura”. O filme capta o desejo de mudança de eleitores iranianos e a sensação de insatisfação em relação ao governo de Ahmadinejad. Eram sinais de que os iranianos haviam mudado, mas que o regime político não acompanhou.
Na época, logo após a declaração da vitória de Ahmadinejad, o Irã viveu dias de protestos que foram reprimidos com violência e ainda hoje se fazem sentir no país. Segundo Makhmalbaf, Ahmadinejad tem buscado ganhar “vida própria” e se afastar do regime dos aiatolás para assumir mais o poder. Enquanto isso, os aiatolás buscam uma forma para se evitar uma nova onda de protestos como os de 2009. “O líder supremo [aiatolá Khamenei] deseja extinguir as eleições presidenciais e pensa em ter um regime parlamentar que ele possa controlar”, disse.
Visto hoje, a onda de protestos após a suspeita reeleição de Mahmoud Ahmadinejad em 2009 mostra que a atual Primavera Árabe teve um embrião persa.
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