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Após gafe de Mujica, imprensa argentina lembra outros atritos com o Uruguai

A presidente argentina, Cristina Kirchner, e seu marido Néstor Kirchner, morto em 2010, chamados de "velha" e "caolho" pelo presidente uruguaio, José Mujica - Jorge Saenz/Associated Press
A presidente argentina, Cristina Kirchner, e seu marido Néstor Kirchner, morto em 2010, chamados de "velha" e "caolho" pelo presidente uruguaio, José Mujica Imagem: Jorge Saenz/Associated Press

Maria Martha Bruno

Do UOL, em Buenos Aires

05/04/2013 18h51

Um dia após as polêmicas declarações do presidente do Uruguai, José Mujica, que chamou Néstor Kirchner de “caolho” e a viúva e atual presidente da Argentina, Cristina Kirchner, de “velha” e “teimosa”, a imprensa argentina relembrou declarações polêmicas do governo vizinho.

Embora possam ser divididas entre governistas e oposicionistas, as principais vozes dos meios de comunicação mais importantes do país adotaram praticamente o mesmo tom.  Para alguns analistas, as declarações de “Pepe”, como é conhecido o presidente uruguaio, apenas explicitam uma relação já deteriorada entre ambos os países.

Segundo o editor de política do jornal de oposição La Nación, Martín Dinatale, a relação entre os dois governos “há muito tempo está sob um clima de tensão, submetida a curtos-circuitos frequentes”.

O jornal também divulgou supostos bastidores do mal-estar diplomático. O embaixador do Uruguai, Guillermo Pomi, teria se articulado às pressas para amenizar a situação com o governo argentino, entrando em contato com altos funcionários da Casa Rosada, como o ministro de Planejamento, Julio De Vido, e o chanceler Héctor Timerman.

“Pomi levou a todos explicações pouco convincentes e disse que as palavras de Mujica não eram oficiais”, diz o jornal. O chanceler Timerman, então, entregou ao embaixador uma carta na qual manifestava o desconforto argentino com as declarações. Ainda segundo o La Nación, outros dois importantes funcionários da Casa Rosada afirmaram que “será difícil voltar atrás neste tropeço diplomático".

O veículo também recuperou comentários antigos do mandatário uruguaio contra os Kirchner. Em 2009, Mujica disse que “infelizmente a Argentina era um país determinante” para o Uruguai e que por isso era necessário ter uma política de “luvas brancas” com os vizinhos.

O também oposicionista Clarín foi outro jornal que resgatou declarações polêmicas de Mujica, publicadas em 2009 no livro “Pepe Colóquios”: “A Argentina é um país que se despedaça para todos os lados. Isso é resultado do que o governo e o campo fizeram. O governo é burro, o campo é burro, todos são burros”.

Edgardo Alfano, analista do canal Todo Notícias, do grupo Clarín, disse que, embora tenham sido desrespeitosos os termos de Mujica, ele se referia mais às políticas do governo argentino que prejudicam o Uruguai --como as restrições às importações e ao dólar--, que dificultam as viagens de argentinos ao país vizinho.

Já a Rádio Mitre, que também faz parte do grupo Clarín, ouviu pela manhã o ex-presidente uruguaio Julio María Sanguinetti (1986-1990 e 1995-2000), que disse que Mujica “deveria pedir desculpas” para “fechar este episódio penoso”. “A questão é encerrar esta história o quanto antes, antes que continue repercutindo, o que não vai ser bom para ninguém”, afirmou.

O jornal governista Página 12 disse que os poucos segundos de vazamento do microfone de Mujica tiveram “efeito letal”. Já o principal programa da Rádio Continental, conduzido pelo articulista Victor Hugo Morales, que também apoia Cristina, ouviu membros da oposição uruguaia que disseram que as declarações do presidente aumentam os problemas que o país já tem, sobretudo nas negociações comerciais com a Argentina.

O canal de notícias C5N, também governista, lembrou que não é a primeira vez que ocorre um episódio do gênero entre ambos os governos. Em 2002, o ex-presidente uruguaio Jorge Battle afirmou que “os argentinos são um bando de ladrões, do primeiro ao último”. Na ocasião, o país atravessava uma grande crise econômica que havia levado o ex-governante Fernando De La Rúa a renunciar. Battle concedia uma entrevista na TV e pensava que o programa já havia terminado. Ao contrário de Mujica, no dia seguinte ele pediu desculpas ao então presidente argentino, Eduardo Duhalde.