Barreira de poder e intolerância: são 6 regiões separadas por muro no mundo
Muros e barreiras físicas, em construção ou que já foram erguidas, separam países em diferentes pontos do mundo: América do Norte, Europa, África e Ásia. E essas divisões não são à toa: elas demonstram a existência de conflitos e de relações de poder entre os Estados.
Cinco dessas barreiras marcam a separação entre países: República Dominicana e Haiti, EUA e México, Grécia e Turquia, Marrocos e Espanha, Coreia do Norte e Coreia do Sul. Outra divide Israel do território da Cisjordânia, no centro do conflito com os palestinos.
A coordenadora e professora do curso de Relações Internacionais da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), Ana Regina Falkembach Simão, afirma que muros desse tipo geralmente revelam a fragilidade de um dos países e a força do outro.
"A construção desses muros é um reflexo de uma relação de poder, em que pese os motivos que justificam a criação serem diferentes e variados, mas a relação de poder fica muito clara", disse ela ao UOL.
Na avaliação dela, essas barreiras mostram que, se por um lado, o mundo globalizado aboliu fronteiras comerciais e de informação, por outro, não conseguiu acabar com as relações de domínio.
"(A globalização) não deixou mais frágeis as relações de poder", complementa.
Saiba quais são as principais questões envolvidas na construção de cada uma das cercas levantadas em fronteiras.
República Dominicana e Haiti
Uma barreira desse tipo está em construção desde fevereiro deste ano e deve cobrir parte da fronteira entre a República Dominicana e o Haiti, na América Central.
O presidente da República Dominicana, Luis Abinader, esteve na cerimônia de início das obras. Já o governo haitiano não participou da solenidade e não comentou sobre a construção.
O Haiti tem um governo interino desde que o presidente Jovenel Moise foi assassinado, em julho de 2021. Por causa da crise econômica, além de conflitos políticos e desastres naturais, é comum a população haitiana buscar oportunidades no país vizinho.
A Pesquisa Nacional de Imigrantes na República Dominicana apontou que, em 2017, havia meio milhão de haitianos no país. Hoje, cinco anos depois, essa população pode ser 25% maior, segundo especialistas.
Entre a República Dominicana e o Haiti, as diferenças sociais se destacam. Enquanto 60% da população do Haiti vive na pobreza, 24% da dominicana está em condição semelhante, de acordo com dados do Banco Mundial e do governo dominicano.
"A República Dominicana não é um país que vive as fragilidades do Haiti. A República Dominicana é um país que tem estabilidade política e social e é um destino de turismo, diferente do vizinho Haiti", diz a professora.
México e EUA
Na década de 1990, o governo norte-americano iniciou a construção de barreiras na fronteira com o México. Entre elas, estão a cerca metálica encontrada em áreas nos estados do Arizona, Texas, Novo México e Califórnia. No entanto, ainda há localidades sem cercas.
Para tentar impedir a imigração ilegal, a administração do ex-presidente Donald Trump gastou US$ 15 bilhões (R$ 77,2 bilhões) para erguer barreiras ao longo de 727 km da fronteira. Já o governo do atual presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou que cancelou os projetos para a construção do muro.
A barreira mais alta da fronteira, levantada durante o governo Trump, tem nove metros de altura. À época, ele chegou a dizer que a cerca seria "praticamente intransponível".
Apesar disso, muitos imigrantes tentam cruzar a barreira. Embora alguns consigam, um número significativo fica ferido na tentativa.
Um estudo liderado por Amy Liepert, da Universidade da Califórnia em San Diego, registrou 375 feridos e 16 mortes com quedas da cerca, entre 2019 e 2021.
Simão chama a atenção para o fato de que as relações diplomáticas e comerciais entre os EUA e o México não impediram a construção dessas barreiras.
Para a professora, esse tipo de construção simboliza a violência e o poder na relação entre os países.
"Esses muros são uma clara relação de poder e, se tem justificativa de conter violência, entrada de refugiados, enfim, isso não acontece. A violência continua. O problema que o muro diz que vai atacar não consegue e pior, muitas vezes, é o símbolo de onde a violência ocorre", considera.
Grécia e Turquia
Outro muro construído com a justificativa de conter a imigração ilegal está na fronteira entre a Grécia e a Turquia.
A divisão de 40 km de extensão foi instalada pela Grécia por conta do aumento de imigrantes vindos do Afeganistão. A construção foi concluída em 2021.
Na época, o ministro da proteção ao cidadão da Grécia, Michalis Chrisochoidis, disse que o país não poderia "esperar, passivamente, pelo possível impacto". "Nossas fronteiras permanecerão invioláveis", declarou.
Por causa da ascensão do Talebã ao poder no Afeganistão, parte da população tentou sair do país. Entre os que chegaram à Grécia, muitos foram para o norte da Europa, mas cerca de 60 mil continuaram no país.
Marrocos e Espanha
As barreiras entre Marrocos e Espanha ficam nas cidades de Melilla e Ceuta, que fazem parte do território espanhol, embora estejam localizadas no continente africano.
As cercas começaram a ser levantadas nas duas cidades nos anos 1990. No entanto, o fluxo de pessoas continuava entre os dois países. Com a entrada da Espanha na União Europeia, as barreiras de Melilla e Ceuta foram reforçadas, com o intuito de conter a imigração ilegal.
De acordo com a professora, assim como ocorre com outros países, a exemplo de EUA e México, o Marrocos e a Espanha também têm relações diplomáticas. No entanto, os muros são construídos em uma demonstração de força de um dos países.
"São países que diplomaticamente têm relações, mas acontecem os muros. Em que pesem as boas relações diplomáticas, os muros existem justamente para marcar uma relação unilateral", analisa.
Israel e região da Cisjordânia
O muro entre Israel e Cisjordânia se diferencia dos demais porque não existe formalmente um Estado palestino.
A construção da barreira em torno do território começou em 2002, e a passagem entre as duas regiões é feita atualmente por meio de controles militares.
Para Simão, essa barreira representa conflitos do século 20 que não foram resolvidos até hoje. "Todos esses muros são carregados de conflito e, obviamente, demarcam uma separação, se não um esgotamento de negociações, um interesse de não mudar o status quo", avalia.
O muro também revela a fragilidade de um Estado não reconhecido, que é o caso da Palestina, e o poder do Estado israelense.
"(O muro) tem um capital político e econômico gigante. Há um peso muito grande nessa relação, porque quando se vai ao período anterior ao muro, as culturas conviviam com uma tolerância bem marcada", explica Simão.
Coreia do Norte e Coreia do Sul
Já as barreiras entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul remontam ao período da Guerra Fria, quando várias partes do mundo foram divididas entre os EUA e a União Soviética. A divisão da Coreia pelas duas potências foi feita em 1948 e, assim, surgiram duas nações.
Em 1950, teve início a guerra entre as Coreias. Após o cessar-fogo, em 1953, foi estabelecida a Zona Desmilitarizada da Coreia, por onde militares das duas nações podem transitar.
O muro construído em 1977 entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte separa dois regimes distintos. "É um muro marcado fundamentalmente por questões ideológicas entre dois Estados e duas concepções políticas", define a professora.
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