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Com cartéis e máfias, Equador vira 'corredor' de drogas para EUA e Europa

Soldados patrulham centro histórico de Quito em meio a onda de violência no Equador Imagem: 9.jan.2024-Karen Toro/Reuters

Do UOL, em São Paulo

12/01/2024 04h00Atualizada em 12/01/2024 12h28

O Equador se tornou um país estratégico para o escoamento de drogas para os Estados Unidos e a Europa. Facções locais se aliaram a cartéis mexicanos e máfias do leste europeu para expandir os negócios.

O que aconteceu

O Equador se transformou em um território chave para o tráfico internacional de drogas — mesmo sem produzir as substâncias. O país está localizado entre os maiores produtores de cocaína do mundo, a Colômbia e o Peru.

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O país possui ao menos três grandes rotas para escoamento de cocaína, segundo Nashira Chávez, consultora em temas relacionados a crime organizado e segurança pública e professora da Universidade Ecotec no Equador. A droga passa por cidades costeiras, pelo porto de Guayaquil e pela região serrana.

"A principal rota de saída da cocaína é pela costa equatoriana e o maior volume vem da Colômbia", diz Nashira. As cidades localizadas na região de serra ao norte do país, como Carchi, Azuay e Riobamba, constituem uma segunda rota usada pelo tráfico. Pela fronteira sul, entra no país um grande volume de armas.

O porto de Guayaquil é o principal ponto de escoamento de drogas. De acordo com Nashira, a região dos Guayas — onde fica o porto — está sob domínio da facção criminosa Los Choneros, grupo liderado por José Adolfo Macías Villamar, conhecido como Fito, cuja fuga é apontada como um dos fatores que motivaram a atual crise de segurança. O porto está localizado a cerca de 70 km da Penitenciária Regional de Guayaquil, onde ele cumpria pena.

Grandes facções equatorianas se aliam a cartéis mexicanos e máfias do leste europeu para exportar entorpecentes. "A droga que sai do Equador com destino aos EUA passa pelo México e por países da América Central. Eles fazem alianças com esses grupos para enviar a cocaína aos EUA", afirma Nashira.

Arte / UOL Imagem: Arte / UOL

Crime, porto e poder

A população equatoriana está assustada com a escalada da violência dos últimos dias. "Os conflitos sempre estiveram presentes no Equador, mas esse nível de violência não tem precedentes, está disseminada em vários setores da sociedade e em todo o território", afirma Olaya Hanashiro, cientista política que atuou como coordenadora de Relações Internacionais na Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais do Equador).

Há conexões entre membros de organizações criminosas com pessoas de diferentes esferas do poder, segundo a cientista política. "Existem denúncias em relação a políticos do Executivo e do Legislativo, de juízes, mas, principalmente, políticos locais", diz Olaya, "Há uma permeabilidade em diversas instâncias de poder, uma vez que os espaços políticos foram enfraquecidos."

Falta investimento nas polícias. Para Olaya, a ausência de fiscalização nos portos da costa equatoriana é outro gargalo que possibilita o uso estratégico do país por parte do crime organizado. "O porto de Guayaquil não tem equipamentos adequados para fiscalizar o fluxo do transporte de drogas. Há pouco investimento em radares e aeronaves de vigilância nessas áreas."

A natureza do crime organizado no país tem a ver com um sistema estatal fragilizado e vulnerável à corrupção.
Olaya Hanashiro, cientista política e consultora na área de violência e direitos humanos

Drogas, encarceramento e fronteiras

A guerra contra as drogas é um dos fatores estruturais da crise de segurança vivida pelo Equador. Como no Brasil, a política de recrudescimento contra as drogas ocasionou o encarceramento em massa. "Houve investimento na construção de presídios e megapresídios, que levou à superlotação e ao descontrole nas prisões, passando por instalações inadequadas e desrespeito aos direitos humanos."

A política de encarceramento favoreceu a criação de facções criminosas. Além disso, permitiu a aproximação com presos estrangeiros envolvidos no narcotráfico. "Isso possibilitou conexões com cartéis mexicanos, como o Cartel de Sinaloa, e a máfia do leste europeu, principalmente, a albanesa", diz ela, que também integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O acordo de paz entre o governo colombiano e as Farcs em 2016 mudou as dinâmicas criminais dos países vizinhos. "Paramilitares e dissidentes da guerrilha passaram a atuar no crime organizado fora da Colômbia", afirma Olaya.

A fratura dos grupos de narcotráfico internacional, como no caso da Colômbia, dá espaço para outras organizações criminosas emergirem. O Equador não supera a Colômbia, mas exerce uma nova função com o suporte ao transporte das drogas.
Nashira Chávez, consultora e professora no Equador

Choneros, lobos, choneros 'killers' e tiguerones

O grupo criminoso Los Choneros é considerado o principal do país, com cerca de 12 mil membros. Em todo o território equatoriano atuam cerca de 20 facções. "Existem as mais conhecidas que estão mais organizadas, mas há também uma multiplicação de pequenas gangues", afirma Olaya. Esses pequenos grupos disputam territórios de forma violenta e se aliam com organizações maiores.

Los Lobos, Los Choneros 'killers'e Los Tiguerones são grupos rivais formados por dissidentes do grupo mais antigo. "Essas três facções surgem e passam a disputar territórios com os Choneros", diz Nashira.

Semelhança com ataques de maio de 2006 em São Paulo. A invasão de uma universidade e uma emissora de TV em Guayaquil por homens armados com revólveres e bombas lembram os episódios protagonizados pelo PCC (Primeiro Comando da Capital).

Na época, presídios de São Paulo começaram a registrar rebeliões após a Secretaria de Administração Penitenciária transferir centenas de presos para uma unidade de segurança máxima do estado. Entre eles Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, apontado como principal líder da facção. Em represália, o PCC articulou rebeliões e ataques que aterrorizaram a população.

É uma reação em todo o país para assustar a população e exigir que a polícia recue, em uma lógica de terror e uma demonstração de força e poder. A população está fechada em suas casas.
Olaya Hanashiro, cientista política e consultora na área de violência e direitos humanos

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