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Como Beethoven ficou surdo: exame revela que vinho ruim pode ser o segredo

Ludwig van Beethoven Imagem: Reprodução

Do UOL, em São Paulo

17/05/2024 04h00

Um estudo publicado na revista científica Clinical Chemistry apontou que os hábitos alimentares de Ludwig van Beethoven podem ter causado diversos problemas de saúde, incluindo a surdez do compositor.

Cabelo revelou intoxicação por chumbo

O estudo analisou mechas de cabelo de Beethoven. Os pesquisadores do Ira F. Brilliant Center for Beethoven Studies da San Jose State University, na Califórnia, procuraram mechas em leilões e museus. Eles conseguiram cinco tufos de cabelo, que uma análise de DNA confirmou como sendo vindos da cabeça do compositor.

Cabelo estava com um alta concentração de chumbo. Segundo o estudo, foram encontrados entre 258 e 380 microgramas da substância a cada grama de cabelo analisada, sendo que o máximo esperado era de 4 microgramas.

Esses níveis de chumbo são comumente associados a doenças gastrointestinais e renais e à diminuição da audição, mas não são considerados altos o suficiente para serem a única causa de morte, diz o estudo.

A deficiência auditiva se manifestou cedo no músico. À época da sua morte, sons agudos, como os da flauta, estavam há muito tempo fora do alcance da sua audição. "A isso juntaram-se tinnitus [zumbido] e recrutamento auditivo. Ou seja: apesar da surdez, sons altos lhe causavam sensação dolorosa", relata a musicóloga Beate Angelika Kraus, do Beethoven Archiv.

Também foram encontrados arsênico e mercúrio no cabelo. O estudo fala em "níveis aumentados" de ambas as substâncias, que foram identificadas com um total aproximadamente 13 e 4 vezes maior, respectivamente, em comparação com os intervalos de referência.

Vinho barato pode ter ocasionado a intoxicação

Segundo o estudo, os hábitos de consumo de Beethoven podem ser a origem da intoxicação. De acordo com os autores, as "fontes primárias sugeridas de exposição ao chumbo incluem vinho destilado, fatores dietéticos e tratamentos médicos".

Beethoven era conhecido por gostar da bebida — às vezes tomando uma garrafa por dia —, e bebia vinho destilado. A prática de adicionar chumbo aos vinhos remonta ao Império Romano e possivelmente até o Antigo Egito. A adição do metal pesado supostamente adoçava a bebida e ajudava a preservá-la. Era comum também a presença de chumbo no vidro, o que deixava os copos com uma aparência mais "cristalina".

Você pode ver nos registros que vários de seus médicos o alertaram para reduzir o consumo de vinho, conta o coautor do estudo, Nader Rifai, da Harvard Medical School, em entrevista ao jornal britânico The Times.

Além do vinho, a alimentação pode ter contribuído. O "fator dietético" citado foi o peixe de água doce que Beethoven consumia. "Ele era conhecido por comer muito peixe, e o Danúbio na época estava fortemente poluído com toda a indústria", disse Rifai.

Quais são os riscos da contaminação por chumbo?

Quando assimilado pelo organismo, o chumbo pode afetar a produção da hemoglobina, causar distúrbios renais e neurológicos. Devido a sua característica de bioacumulação, ele não é eliminado pelo organismo — por isso, a partir de certos teores contamina o cérebro, o sistema nervoso, a medula óssea e os rins.

É um agente teratogênico, ou seja, pode provocar mutações genéticas. As crianças são muito mais vulneráveis aos efeitos, podendo sofrer, mesmo em pequena exposição, deficiência intelectual e distúrbios psicológicos.

O tratamento do envenenamento por chumbo geralmente é longo e difícil. O processo começa com o afastamento do paciente de todas as fontes possíveis de contaminação, seguido da administração de quimioterapia específica sob intensa supervisão médica.

Estudo coincidiu com bicentenário da 9ª sinfonia

O lançamento do estudo ocorreu em 6 de maio de 2024, mesmo dia em que a 9ª sinfonia de Beethoven completou 200 anos. Em 1824, o compositor apresentou a obra pela primeira vez no Teatro de Kärntnertor, em Viena.

Beethoven compôs e apresentou a sinfonia apesar de sua surdez. No fim da apresentação da "Nona", Beethoven foi ovacionado pelo público, mas não percebeu, por conta da deficiência auditiva. O compositor só recebeu os aplausos após um músico sinalizar a reação da plateia.

"É bem possível que ele ainda conseguisse escutar as frequências graves, como dos tímpanos e contrabaixos", explicou Beate Kraus. O longo aplauso do público, porém, foi para o músico um emocionante espetáculo silencioso.

"Este homem criou algumas das músicas mais belas que a humanidade foi capaz de produzir", disse Rifai. "Foi incrivelmente trágico que ele não conseguiu ouvir a música majestosa que criou", lamenta.

* Com informações de reportagens publicadas em 16/10/2007 e 06/05/2024.

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