'Queria atirar no rosto': ela matou assassino de sua filha no tribunal

Há mais de 40 anos, o caso de uma mãe que vingou a morte da filha em um tribunal na Alemanha se tornou mundialmente conhecido e dividiu a opinião pública na época.

Em 6 de março de 1981, a alemã Marianne Bachmeier, então com 30 anos, acompanhava o terceiro dia de julgamento do assassino confesso de sua filha de 7 anos, Anna.

De dentro do tribunal, na cidade de Lübeck, ela disparou oito tiros de arma de fogo contra o criminoso, Klaus Grabowski.

"Eu queria atirar no rosto dele. Infelizmente, eu o acertei nas costas. Espero que esteja morto", disse Marianne após os disparos, segundo apurado pela Deutsche Welle. Na ocasião, Grabowski morreu na sala do tribunal e Marianne foi presa sem resistência.

Dois anos depois, em 2 de março de 1983, Marianne foi condenada a seis anos de prisão por porte ilegal de arma e homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Com o veredito, o tribunal seguiu o argumento da defesa de que o crime não havia sido planejado.

Não se pode tratar homicídio culposo e doloso da mesma maneira, pois isso faria de todo soldado um assassino. Para mim o 'como' é muito importante. Eu tive que ouvir quando o assassino de minha filha descreveu a forma como ele a matou. Apertou o pano ao redor do seu pescoço cada vez mais forte. Aí eu atirei. Marianne Bachmeier, em entrevista divulgada pela Deutsche Welle

"Eu não queria ir ao julgamento. Eu teria de depor sobre o caráter de minha filha. Fui ameaçada até de aplicação de medidas disciplinares no caso de ausência, o que era uma provocação. Ninguém deveria se surpreender com o que aconteceu", justificou a mãe a um apresentador de uma rádio europeia depois de sair da prisão, conforme divulgou a DW.

O assassinato da criança

Em 5 de maio de 1980, Anna Bachmeier, de 7 anos, faltou à escola após uma discussão que teve com a mãe, com quem vivia na cidade alemã de Lübeck.

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Desamparada, Anna foi encontrada por Grabowski e levada até o seu apartamento. O alemão de 35 anos tinha antecedentes criminais por abuso sexual de crianças, passou por tratamento psiquiátrico e havia se submetido voluntariamente a uma castração. Mas, tempos depois, iniciou um tratamento com hormônios —com autorização judicial — para restaurar seu desejo sexual, de acordo com a DW.

Após uma denúncia feita à polícia pela namorada de Grabowski, ele confessou que havia mantido Anna presa por horas e estrangulado-a com uma meia-calça. Em seguida, teria enterrado o corpo da vítima em uma caixa de papelão na margem de um canal de Lübeck.

Nunca foi esclarecido se a criança também havia sido abusada sexualmente na noite do crime. O assassino negou o abuso e afirmou que Anna teria tentado chantageá-lo na ocasião.

Segundo Grabowski, a menina ameaçou contar à mãe dela que ele a havia violentado sexualmente caso ele não lhe desse dinheiro. Por temer voltar para a prisão, ele acabou estrangulando-a, ainda de acordo com a apuração da DW.

Depois de ter alvejado Grabowski no tribunal, a mãe de Anna justificou que sua ação havia sido um impulso para evitar que o assassino manchasse a reputação de sua filha: "Ouvi dizer que ele queria dar um depoimento, e pensei: 'agora vem a próxima mentira sobre essa vítima, que era minha filha'".

Caso sem precedentes

O assassinato de Grabowski pela mãe de Anna ganhou grande repercussão na imprensa europeia como um caso de "justiça com as próprias mãos" que jamais havia sido visto no país.

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Jornais, revistas e diversas emissoras cobriram o caso à exaustão, a exemplo da revista Stern, que publicou uma biografia de Marianne em 13 capítulos. Também foram planejados dois filmes sobre "a história da mãe que vingou a morte da filha", segundo a DW.

Na biografia publicada, constam detalhes da infância e juventude de Marianne em um lar rigidamente religioso com um pai autoritário. A obra mostra ainda que ela engravidou pela primeira vez aos 16 anos e estava esperando uma segunda criança aos 18. Ambas foram dadas à adoção após o nascimento.

Pouco antes do nascimento de sua segunda filha, Marianne foi estuprada. Quando sua terceira filha, Anna, nasceu em 1973, a jovem de 23 anos manteve consigo a criança.

Após a publicação da obra, a mãe de Anna afirmou à imprensa: "Só recebi cartas de apoio, regularmente chegava correspondência de fãs. As pessoas tiveram muita compreensão comigo".

Veredito e repercussão

O julgamento de Marianne começou em 2 de novembro de 1982. O tribunal precisava decidir se a mãe de Anna seria condenada por homicídio culposo ou doloso, ou seja, se ela tinha atirado com intenção criminosa ou por impulso emocional.

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Marianne testemunhou no tribunal que não tinha a intenção de matar e que atirou sem pensar, no calor do momento, sem jamais ter treinado tiro, conforme apurou a DW.

O caso atraiu imensa atenção do público. Muitos culparam o sistema judiciário alemão pelo crime, por ter permitido que um homem que já havia abusado de duas meninas restaurasse seu desejo sexual com hormônios.

Alguns acusaram Marianne de negligenciar Anna e duvidavam que ela estivesse realmente de luto. Outros ainda expressaram abertamente sua simpatia pelo ato de vingança.

Em meio a um debate público acalorado, no dia 2 de março de 1983, os juízes de Lübeck decidiram que Marianne seria condenada a seis anos de prisão por homicídio culposo, além de posse ilegal de arma de fogo. Com o veredito, o tribunal seguiu amplamente o argumento da defesa de que o crime não havia sido planejado.

Desfecho

Em junho de 1985, Marianne foi libertada antes de cumprir toda a pena. Ela jamais lamentou seu ato, casou-se e deixou a Alemanha. Viveu com seu marido na Nigéria até 1990 e, depois de se divorciar, mudou-se para a Sicília, na Itália, onde trabalhou com enfermeira de doentes terminais e escreveu um livro sobre sua vida.

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Em 1996, Marianne, em estado terminal com câncer no pâncreas, retornou à Alemanha. Ela morreu em 17 de setembro de 1996, aos 46 anos, e foi enterrada ao lado da filha Anna, em Lübeck.

De acordo com a DW, anos após o crime, há muitos sinais de que Marianne teria planejado sua vingança contra o assassino da filha, ao contrário do que ela alegou em seu julgamento.

Em 1995, ela mesma explicou durante uma entrevista para a emissora alemã ARD que havia atirado no suposto assassino de sua filha após muito tempo de consideração. Seu objetivo era que ele pagasse pelo crime e parasse de espalhar mentiras sobre Anna.

Em um documentário lançado em 2006, uma antiga amiga de Marianne disse que ela havia treinado tiro no porão de um bar em Lübeck, após o assassinato de Anna.

*Com informações da Deutsche Welle

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