Incursões de Sean Penn pela escrita combinam ativismo com jornalismo
Na noite de sábado (9), enquanto as pessoas tomavam conhecimento da entrevista de Sean Penn com o barão da droga mexicano Joaquín Guzmán Loera, conhecido como “El Chapo”, na revista “Rolling Stone”, o próprio Penn estava em Beverly Hills, na companhia de outras celebridades, como Leonardo DiCaprio, Justin Bieber e Patricia Arquette.
Penn, de 55 anos, vencedor do Oscar de ator e de diretor, estava participando de uma festa beneficente para a organização humanitária fundada por ele que está ajudando o Haiti a se recuperar de seu devastador terremoto de 2010.
As muitas contradições percebidas em um momento como este são emblemáticas da carreira de Penn, de muitos anos e diferentes camadas, na qual ele se tornou famoso tanto por seus papéis em filmes, como “Os últimos passos de um homem” e “Sobre meninos e lobos”, como por seu ativismo franco, que em várias ocasiões levou-o ao jornalismo, com resultados controversos.
Enquanto Penn ajudou a levantar dinheiro para combater crises internacionais, ele também teve acesso e escreveu sobre algumas figuras odiadas, como Guzmán, que foi recapturado no México na sexta-feira (8) depois de duas fugas da prisão, e Hugo Chávez, o ex-presidente da Venezuela que morreu em 2013.
Por suas aventuras jornalísticas, algumas meio obtusas e outras camufladas de sátira, Penn enfrentou muitas críticas.
Em declarações ao programa “This Week”, da norte-americana ABC, no domingo (10), o senador Marco Rubio, republicano da Flórida, disse que se os atores norte-americanos, como Penn, quiserem “bajular um criminoso e traficante de drogas em suas entrevistas, eles têm esse direito constitucional”. Mas Rubio acrescentou: “Eu acho grotesco”.
Os leitores não foram muito mais gentis. Horas, se não minutos depois da publicação do artigo da “Rolling Stone”, Penn começou a ser difamado por seu estilo de prosa autoindulgente e sua atitude desajeitadamente amigável a Guzmán, um criminoso procurado.
“Este homem simples”, Penn observa, “que vem de um lugar simples, rodeado pelo simples afeto de seus filhos ao pai, e dele pelos filhos, inicialmente não me parece o tão falado lobo mau”.
Além de um aparte sobre seu medo de que seus órgãos genitais possam ser cortados e sua descrição de flatulência na frente de Guzmán, Penn pergunta no artigo da “Rolling Stone”: “Nós, o público norte-americano, não somos cúmplices naquilo que demonizamos?”. Ele chega a sugerir que, como consumidores, somos cúmplices em cada assassinato, e em cada incidência de corrupção “que vem como resultado de nosso apetite insaciável por drogas ilícitas”.
Depois de beber tequila com Guzmán e tecer comparações com o filme de Brian De Palma “Scarface”, Penn pergunta ao seu anfitrião como “o atual pandemônio do Oriente Médio” e suas “economias frenéticas de opiáceos” estão afetando o seu comércio de drogas.
Penn é filho de Leo Penn, um ator de Hollywood que foi inscrito na lista negra da era McCarthy por se recusar a citar nomes para o Comitê de Atividades Não Patrióticas da Câmara.
Sean Penn ganhou destaque na década de 1980, como um bad boy temperamental, chamando a atenção por filmes, como “Picardias Estudantis” (fazendo o papel do surfista adorável Jeff Spicoli) e “A traição do falcão” (como um traficante de drogas que é atraído pela KGB). Ele teve um casamento tumultuado com a cantora Madonna, que terminou em divórcio, e teve uma curta sentença de prisão quando socou um figurante em um set de filmagem.
Nos anos seguintes, enquanto aumentavam os elogios por seu trabalho como ator, Penn tornou-se mais consciente e ativo socialmente. Ele foi um feroz detrator do presidente George W. Bush, financiando a publicação de cartas abertas no “The Washington Post” e “The New York Times” criticando a ação militar no Iraque. No “The San Francisco Chronicle”, Penn fez relatos de suas viagens ao Iraque após a invasão norte-americana e ao Irã na época dos preparativos para as eleições presidenciais de 2005.
No entanto, seus esforços sinceros foram ridicularizados em comédias, como “Team America: World Police”, em que um fantoche de Penn se gaba de ter recentemente viajado para o Iraque, que ele descreve como “um lugar feliz --eles têm prados floridos e arco-íris nos céus e rios de chocolate onde as crianças dançam e riem e brincam com sorrisos de jujuba”.
Em 2008, ele escreveu longamente para os jornais “The Nation” e “The Huffington Post” sobre suas visitas ao presidente Raúl Castro, de Cuba, e Hugo Chávez, da Venezuela. Os resultados, não muito diferentes do artigo de Penn na “Rolling Stone” sobre Guzmán, foram uma mistura de diário de viagem prolixo com momentos de indiferença e comédia não intencional.
Penn conta que Castro tem “humor” em sua voz, “que lembra uma vida de tolerância afetuosa ao olhar atento seu irmão mais velho”.
Ele escreve que o líder cubano, que na época tinha mais de 70 anos, andava “com a agilidade de um jovem” e teria dito: “Soube que você faz filmes longos. Talvez você também faça um longo jornalismo”.
Em um comentário sarcástico ao “The New Yorker”, publicado em 2008, após as entrevistas de Penn com Castro e Chávez, George Packer escreveu que suas excursões na área da não ficção revelavam “uma espécie de desprezo ao jornalismo, algo bastante difícil de realizar bem”.
Packer escreveu: “Não há nenhum outro ator atualmente que habite seus papéis tão completamente quanto Penn, e espero vê-lo um dia interpretando um correspondente estrangeiro. Ele é um ator tão talentoso que estou absolutamente seguro de que vai fazer um trabalho mais convincente na tela do que em seus esforços jornalísticos reais”.
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