Ex-capital do Estado Islâmico tenta se recuperar das cicatrizes deixadas por bombardeios e terroristas
A família de Eissa Ali foi embora de Raqqa, que foi capital do território do Estado Islâmico por mais de três anos, depois que ele foi detido e espancado por jihadistas por jogar baralho.
Agora que as bombas pararam de cair e que o grupo militante conhecido como Estado Islâmico se foi, eles voltaram para a cidade, mas encontraram a casa onde viviam sem os dois andares de cima. A maior parte do bairro já não existe mais, apagada por bombardeios aéreos. Eles taparam os buracos nas paredes, removeram os escombros e se mudaram de volta para a casa.
A reportagem do "New York Times" foi a Raqqa para ver como as pessoas estão tentando retomar suas vidas. Elas continuam em choque, tentando compreender a destruição. Os moradores encontrados estavam felizes com a saída dos jihadistas. Mas não há dinheiro suficiente para a reconstrução. Eles questionavam se era necessário que uma coalizão liderada pelos Estados Unidos destruísse a cidade. E não estava claro o que seria necessário para se recuperar das cicatrizes deixadas pelo grupo terrorista.
Mais de 3.000 casas foram destruídas e centenas de civis foram mortos depois que a coalizão liderada pelos Estados Unidos jogou milhares de bombas sobre a cidade para expulsar o Estado Islâmico. É parte de uma guerra civil muito maior na Síria, que já dura mais de sete anos e matou milhares de pessoas.
A praça do Paraíso costumava ser um próspero centro comercial.
Ela ganhou fama em 2014 quando o Estado Islâmico anunciou seu califado e divulgou imagens de seus combatentes celebrando com uma parada militar no local. Ela costumava ficar lotada de lojas e cafés. O Estado Islâmico a usou para execuções. Prisioneiros foram decapitados nas ruas, com suas cabeças empaladas em uma cerca de metal e seus corpos jogados na calçada.
Yasser Hamadi tinha um indesejado camarote para a brutalidade a partir de sua lanchonete na praça. Agora sua loja foi reaberta, mas o movimento anda devagar. Aqueles que retornaram têm pouco dinheiro para gastar.
Mohammed Ali, que tem uma barbearia, foi pego fumando. Ficou detido por três dias e foi espancado. Ele fora proibido de aparar barbas ou de passar a máquina na lateral da cabeça das pessoas. Agora, os cortes mais populares para as crianças são os raspados à máquina nas laterais, com listras.
Muitas pessoas voltaram, preferindo suas casas danificadas aos campos de refugiados. Mas há pouca ajuda de fora para a reconstrução.
À medida que as pessoas vão remexendo nos escombros, elas encontram novos horrores. Abdul-Rahman Abdul-Kareem consegue sentir o fedor de um cadáver em algum lugar em meio aos escombros da casa de um vizinho. Ele não sabe de quem é o corpo e também não tem como retirá-lo de lá.
Um estádio de futebol destruído foi onde o Estado Islâmico fez seu ato de resistência final na cidade. O porão ainda tinha celas onde eram mantidos os prisioneiros. Agora é dominado por um silêncio sepulcral. Na parede de uma das celas havia 47 xis marcados, provavelmente feitos por alguém que contava seus dias na cadeia.
Na beira de uma estrada, foram vistos os corpos de cinco pessoas exumadas de uma vala comum. Foram mortos pelo Estado Islâmico? Por bombas americanas? Ninguém sabia.
O medo persiste. A cidade está sendo governada por um conselho local sob a proteção de forças lideradas pelos curdos, com o apoio dos Estados Unidos. Mas por quanto tempo? O governo sírio voltará ou os jihadistas?
As crianças não precisam mais das roupas conservadoras que precisavam usar durante o governo do Estado Islâmico. Mas Khilfa Shawa me disse que as guardou, em todo caso. Muitas crianças estão há muito tempo sem frequentar a escola.
Esses meninos ganharam armas de plástico de presente e imitavam o que viram os adultos fazendo. Um deles prometia libertar a vizinhança. Quando perguntei de quem ou para quem eles a estavam libertando, eles não souberam dizer.
“Somos gratos à coalizão por ter expulsado o Estado Islâmico para nós, mas por acaso o Estado Islâmico estava atrás de todas essas paredes?”, disse Abdul-Kareem. “Havia necessidade de toda essa destruição?”
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