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Mesmo com aumento de público, museus continuam fora das prioridades do Estado

Teixeira Coelho

Especial para o UOL

17/03/2014 06h00

Em política cultural, a primeira questão é: como poderia ser?  É essa a pergunta básica das ciências, as exatas e as ditas humanas, entre as quais está a política cultural.

E quando se busca a resposta, a referência, se houver alguma, tem de ser a que estiver lá na frente, não a mediana, nem a pior. Digamos, a França. Em 2011, ainda crise na Europa, o Estado francês investiu 13,4 bilhões de euros em cultura, que apresentou um valor agregado (espécie de PIB na área, tudo somado) de 57,8 bilhões de euros, equivalentes a 3,2% do valor agregado geral da economia francesa. Veja bem: 3,2% é o mesmo índice da produção agrícola da França.

Com a cotação do euro em R$ 3,28, o valor investido pelo Estado francês é de R$ 43,9 bilhões. Dados de 2012 indicam que o orçamento do MinC para 2013 foi previsto em  R$ 2,9 bilhões. O próprio MinC indicava que faria a gestão de uns R$ 5 bi, se incluídos os R$ 2 bi previstos para a Lei Rouanet. Digamos que nada do orçamento do MinC foi contingenciado (não gasto, por ordem do Executivo).

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Museus não participam da 'marca Brasil', que continua a ser samba, futebol e cerveja

Digamos que os R$ 2 bi da Rouanet foram de fato aprovados, conseguidos e investidos. Mas, se os dados estiverem corretos e tudo tiver sido executado, o Estado brasileiro terá colocado na cultura uns R$ 5 bi; o francês investiu cerca de oito vezes mais que isso.

Alguém dirá que não se pode comparar a França com o Brasil. Mas o quadro do PIB dos países diz que o do Brasil, na 7ª posição mundial, é maior que o da França. É apenas pouco superior (menos de US$ 100 bi) mas é superior. A participação do setor agrícola no PIB do Brasil é de 4,53% (fora o agronegócio). Se o Brasil tivesse a mesma atitude da França em relação à cultura, estaria investindo pelo menos esses R$ 44,7 bi por ano.

A participação da cultura no PIB do Brasil costuma ser superestimada, chega-se a falar em 6%. Especialistas neutros apontam para uma fatia de 3% do PIB para a cultura nos países desenvolvidos. É mais prudente. Mesmo que no Brasil a cultura tenha só 3% do PIB, é provável que ela esteja, aqui, apenas pouco mais de um ponto abaixo da agricultura.

É muito respeitável, considerando que o Brasil é um país agrícola. O investimento do Estado em cultura no Brasil poderia estar ao redor daqueles R$ 44,7 bi por ano. Mesmo acrescentando-se eventuais gastos em cultura de outros ministérios, das cidades e dos Estados, não se chega perto dos números franceses (também lá seria preciso acrescentar outros 7,6 bi de euros gastos pelas coletividades territoriais). E, no entanto, o Brasil tem um PIB maior que o da França.

Com esse dinheiro, a França apoia seus museus em pelo menos 50% de seus orçamentos. A cultura é importante para a “marca França” e, nela, os museus são decisivos para a imagem da marca no exterior. Só o Louvre puxa para Paris 10 milhões de visitantes por ano, a maioria estrangeiros. A principal razão para a vinda de turistas a São Paulo é um museu: o Masp.

Incentivo

No Brasil, a regra é dar para a cultura o que couber na dedução fiscal

Museus não vivem só do Estado. A sociedade civil é decisiva, sobretudo em países onde o Estado não controla os principais museus, como nos EUA. Ali, a sociedade civil “comparece” na economia e na gestão dos museus. O MoMA é uma verdadeira corporation disfarçada de museu, obtendo índices das agências de avaliação econômica melhores que o da maioria dos países.

Quer dizer, emprestar ao MoMA, doar para o MoMA, investir no MoMA é seguro. E a sociedade civil não apenas colabora com os museus existentes: os colecionadores abrem os seus. Como na Alemanha. No Brasil, isso é raridade.

E o terceiro pé de sustento dos museus é a iniciativa privada, o mecenato corporativo. No Brasil, a regra é dar para a cultura o que couber na dedução fiscal. Só. Se o ano for ruim, se a remessa de lucros for alta, se os investimentos (dedutíveis) forem grandes, pouco se dá. Ou nada.

Tudo isso explica por que os museus no país não participam da “marca Brasil”, que, se houver, continua a ser samba, futebol e cerveja – e seus desdobramentos.

Os museus brasileiros melhoraram na última década, em termos de público. Inhotim é uma estrela em ascensão, o Estado de São Paulo cuida bem da Pinacoteca e a Fundação Iberê Camargo é um farol no sul. O Masp, único museu com lugar internacional reconhecido (ainda), não é enxergado pelos três poderes públicos, apesar de ser a joia da cidade; e a presença da sociedade civil em seus quadros é tímida.

Copa do Mundo e Olimpíada são pretextos para investimentos maciços dos Estados, também em cultura. Uma boa parte dos turistas quer ver fantásticas arquiteturas de museus e, neles, obras de arte excitantes. Os museus deveriam estar na lista de prioridades pelo menos do Estado. Não estão. Ah, alguém dirá: "não vale comparar com a França, que é um Estado cultural". Mas, é isso que o Brasil poderia ser – com seus museus. 

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