Topo

Rebaixamento fragiliza governo e dificulta aumento de impostos

Especial para o UOL

11/09/2015 06h00

A agência S&P anunciou na última quarta dois movimentos em relação à classificação de crédito soberano do Brasil. O primeiro deles foi a queda do rating de BBB- para BB+, o que significa a perda do chamado grau de investimento. O segundo movimento foi colocar a nova classificação de crédito em perspectiva negativa. Esta perspectiva atribui uma probabilidade maior que 33,3% de uma nova queda na classificação de crédito.

De que forma esses dois movimentos podem impactar a economia brasileira? Tipicamente, o efeito imediato ocorre sobre os preços dos ativos financeiros. Mercados financeiros precificam ativos de acordo com suas perspectivas futuras. Desta forma, preços refletem eventos de acordo com sua probabilidade de ocorrência.

Dada a crescente dinâmica desfavorável no ambiente político e econômico, a perda de grau de investimento do Brasil era em grande parte antecipada nos mercados de títulos soberanos no exterior. O risco-país e o seguro para perdas com títulos brasileiros (CDS) eram negociados a valores compatíveis com a perda do grau de investimento. Por arbitragem, a taxa de câmbio Real/US$ também refletia esta probabilidade.

Isto quer dizer que todo impacto da notícia já foi absorvido? Creio que a resposta é negativa. A novidade do anúncio resulta de dois fatos. O primeiro é que o anúncio ocorre apenas 43 dias depois da S&P ter mantido o grau de investimento, porém rebaixando a perspectiva para negativa.

Comparando com movimentações similares anteriores (de BBB- para BB+ ou equivalente), em oito casos de países analisados, em nenhum deles a perda ocorreu num período tão curto. Tipicamente, essa movimentação leva cerca de nove meses. Isso demonstra a rápida deterioração da situação fiscal brasileira associada ao desfavorável ambiente econômico e político.

O segundo fator é a adoção da perspectiva negativa. Isto sinaliza que não haverá nenhuma boa vontade adicional da agência com o desempenho fiscal brasileiro. De maneira incisiva, a agência afirma que o ambiente político comprometeu a capacidade e a resolução do governo em conduzir a correção necessária no orçamento.

Esses fatos podem precipitar novos desdobramentos que ainda não estão precificados. Em primeiro lugar, outras agências tenderão a acompanhar a recomendação da S&P rapidamente, para não perderem o timing. Caso pelo menos mais uma agência acompanhe, isto forçaria uma venda compulsória de ativos brasileiros nas carteiras de fundos que não podem ter ativos “junk” (sem grau de investimento).

Em segundo lugar, o impacto sobre a dinâmica política deixará o governo ainda mais fragilizado para realizar os cortes de gastos e aprovar novos impostos. Em terceiro lugar, embora os efeitos da perda do grau de investimento sobre a economia real tendam a ocorrer mais lentamente que no mercado financeiro, seus impactos não serão menos relevantes.

O crédito para empresas brasileiras no exterior ficará mais caro e mais escasso, o que irá contrair o crédito doméstico para investimento e consumo. Empresas endividadas no exterior, como a Petrobras, deverão reduzir ainda mais seus investimentos. Para suavizar a depreciação cambial e minimizar seu repasse aos preços, o Banco Central será forçado a manter juros elevados por mais tempo, ou eventualmente aumentá-los. 

Haverá também impacto na entrada de investimento direto no país, dado o desinteresse do investidor estrangeiro. Todos esses elementos tendem a agravar a delicada situação econômica com aumento do desemprego e queda da atividade, podendo levar à convulsão social.

Esta marcha batida para o abismo econômico ainda pode ser interrompida. Quem sabe ao contemplá-lo, encontraremos o nosso caráter. Tomara que não esteja no fundo do abismo.

  • O texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
  • Para enviar seu artigo, escreva para uolopiniao@uol.com.br