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Estelionato em SP: quer dizer que Marçal não é tão idiota quanto parece?

Pablo Marçal disse em entrevista ao Flow Podcast, nesta quarta-feira (28), que precisou fazer muita idiotice para chegar até onde chegou (19% das intenções de voto para prefeito de São Paulo, 35% de rejeição, segundo pesquisa Quaest).

A revelação está contida em uma matrioska de idiotices. Sabe aquelas bonecas russas guardadas em uma maior, e outra e outra? É mais ou menos assim. Só que com um ex-coach dentro mandando fazer M.

A primeira idiotice do candidato do PRTB é revelar o próprio truque. E isso é um problema sob diversos aspectos, a começar pela concorrência.

Marçal corre agora o risco de levar para os debates um boné escrito "Bebam Soda Cáustica" e encontrar do outro lado, num futuro próximo, um adversário sem boné, sem paletó e sem roupa alguma. Vai ser difícil concorrer com o número de visualizações que o peladão conseguirá alavancar enquanto é retirado do estúdio.

Outra idiotice foi ter dito que o povo gosta é disso mesmo: de idiotice. E que precisa produzir isso para dar o que todo mundo quer, mesmo que não se divirta.

O problema, aqui, não é chamar o eleitor de idiota. Quem a essa altura está disposto a votar em que leva seguidores para a montanha sem preparo ou equipamento, vamos combinar, já perdeu a esperança de ganhar o Nobel.

O problema mesmo é descobrir que o ídolo não é assim tão idiota. Só finge ser um. E nem se diverte fazendo esse papel.

É como explicar para uma criança que por trás da barba postiça do Papai Noel está o tio Gervásio. Dói saber que tudo não passou de uma fantasia.

A decepção vale para quem adorou o esquete e vale para quem compartilhou o repúdio dando palanque da idiotice a um espertalhão.

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Especialistas em dramaturgia da viralização apontam que o segredo para criar vídeos com milhões de views é submeter o roteiro a uma ferramenta capaz de identificar a formação escolar mínima para compreender com naturalidade o que está sendo apresentado.

E ninguém viraliza postando conteúdos que exijam entendimentos além dos de alunos de primeira série. E isso não é metáfora. É técnica de comunicação. Foi o que mostrou o neurocientista Álvaro Machado Dias em uma coluna recente na Folha de S.Paulo.

Marçal faz isso se comportando como um iletrado, mas é possível que tenha lido tudo isso (!) e, pior, compreendido (!!). Pior ainda (!!!) é que ele nem é o primeiro a fazer isso. Tem uma escola por trás da tática.

Marçal revelou o truque enquanto produzia outra idiotice — talvez para testar a própria ferramenta diante da audiência e do apresentador.

Cansado de ferir as regras eleitorais, ele jura que agora quer atropelar uma norma universal mais ou menos básica dessa vida: a certeza da morte.

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Mas Pablo não pode ver uma lei na frente que já corre para transgredir. Já fez isso, contou ele, mais de uma vez, quando tentou ressuscitar mortos em velório.

A resposta ao estranhamento é parecida com a que ele costuma aplicar quando questionado sobre a idiotice de propor um teleférico numa metrópole plana como São Paulo. Ou de construir o prédio mais alto do mundo para atrair turistas em uma cidade onde quem pena são os habitantes.

A lógica obedece a um método: não é porque ele não conseguiu ressuscitar mortos ainda que ele não vai conseguir um dia.

Um milagre ele já conseguiu: a plateia que andava morta de tédio com as propostas de sempre nos debates da TV nunca esteve tão viva e hipnotizada (os que o amam e os que o detestam).

Verdade seja dita: o processo de identificação com o eleitor tem sido bem-feito.

Nessa plateia imensa o que não falta é gente que já chamou a atenção dos pais botando o garfo na tomada.

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Com a idade as ferramentas só ficam um pouco caras. E mais perigosas.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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