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À espera de "correspondente" de SP, chefe do comitê das Olimpíadas de Londres diz que cidade tem que fazer "sacrifícios"

Fernanda Calgaro <br>Especial para o UOL Notícias <br>Em Londres

02/03/2011 14h01

Eventos do porte de uma Olimpíada ou Copa do Mundo mexem com a estrutura de toda a cidade, não importa o seu tamanho, e isso exige da população pequenos sacrifícios, opina Dan Hawthorn, chefe do comitê das Olimpíadas de 2012 na Prefeitura de Londres. "São pequenas adaptações no seu cotidiano, como pegar o transporte público em vez de usar o carro." Para ele, essa será uma das lições que São Paulo poderá tirar da capital britânica.

Na semana passada, a Prefeitura de São Paulo anunciou que vai enviar a Londres um "correspondente" para acompanhar os preparativos das Olimpíadas de 2012. O escolhido foi o secretário de esportes, Walter Feldman (PSDB), que deve ficar de três a quatro meses na capital britânica. O Rio de Janeiro também deve mandar alguém, mas ainda não comunicou oficialmente quem será seu representante.

Em entrevista ao UOL Notícias, Hawthorn confirmou que já está em contato com a prefeitura de São Paulo e afirma que a troca de experiência entre as cidades-sede de jogos é muito importante, "mesmo que sejam eventos diferentes". Leia a seguir os principais trechos:

UOL Notícias - Como tem sido a preparação de Londres para receber as Olimpíadas em 2012? Foram enviados representantes para cidades que haviam recebido os jogos em outros anos?

Dan Hawthorn - Antes mesmo de Londres ter sido escolhida como sede das Olimpíadas de 2012, fizemos contato com cidades-sede de jogos anteriores, como Sydney, que sediou as Olimpíadas em 2000, Vancouver, que recebeu as Olimpíadas de Inverno em 2010, e a cidade inglesa de Manchester, palco dos Jogos da Commonwealth em 2002. Quando fomos escolhidos como cidade-sede, já tínhamos boas relações com essas cidades e só estreitamos mais os laços. Acho que ninguém da prefeitura de Londres chegou a visitar Sydney, mas recebemos visitantes  em Londres.

Por que essas cidades e não outras?
Hawthorn - Procuramos essas cidades porque achamos que poderíamos aprender mais não só por falarmos o mesmo idioma mas por termos estruturas políticas e de organização semelhantes, além de uma bagagem cultural parecida. Mas toda experiência é válida. O prefeito de Londres [Boris Johnson] também foi o ano passado para a África do Sul na Copa do Mundo para conhecer a experiência de Johanesburgo e da Cidade do Cabo.

O fato de as cidades terem sediado eventos diferentes muda alguma coisa?
Hawthorn -  Não precisam ser somente cidades-sede de Jogos Olímpicos para tirarmos lições. Da mesma forma, acredito que São Paulo ou Rio de Janeiro poderiam aprender algo com o que estamos desenvolvendo em Londres. Os dois eventos [Copa e Olimpíadas] têm bastante em comum.

Que tipo de lição?
Hawthorn - Há duas categorias diferentes. A primeira é sobre o que se pode fazer na cidade durante o período da competição. Nós já realizamos grandes eventos em Londres, mas nada do porte das Olimpíadas do ano que vem. Então, o que nos chamou a atenção em Sydney e na África do Sul foram os eventos de rua abertos ao público, como shows e transmissão de jogos. Essas celebrações fazem com que a cidade inteira se envolva e um número muito maior de pessoas participe. A segunda categoria é em relação ao legado para a cidade. Em Londres, por exemplo, haverá na região leste da cidade [que é a mais carente] novas áreas esportivas e espaços verdes, além de mais casas e infraestrutura.

Que impactos mais poderão ser sentidos?
Hawthorn - Eventos como Olimpíadas e Copa encorajam mais pessoas a fazer esporte, não necessariamente de alta performance, mas como parte da sua rotina diária. Também servem de incentivo para o voluntariado. Em Londres, serão mais de 70 mil durante o período dos jogos.
Por fim, temos feito um esforço para garantir que as vagas de trabalho criadas sejam ocupadas por desempregados. Então, além do emprego, mesmo que temporário, a pessoa terá a chance de aprender uma habilidade e ganhar experiência para outros empregos no futuro. E resultados assim não caem no seu colo automaticamente, não acontecem simplesmente, os governos precisam agir e se preparar.

A Prefeitura de São Paulo anunciou na semana passada que enviará um "correspondente" a Londres. Já foi feito algum contato oficial por parte de São Paulo?
Hawthorn - Sim, nós estamos em contato com o escritório do prefeito de São Paulo. Na verdade, nesta semana, haverá uma reunião entre representantes de São Paulo e a conselheira do prefeito de Londres na área cultural, Munira Mirza. O encontro tratará de eventos culturais talvez não especificamente focados na Copa do Mundo ou nos Jogos Olímpicos, mas, como esse é o tema de Londres no momento, certamente algo poderá ser aproveitado por São Paulo nos próximos anos. Então, as relações com São Paulo estão só começando e estamos animados em poder trabalhar de perto tanto com São Paulo quanto com o Rio.

Que lições São Paulo pode tirar de Londres apesar das grandes diferenças entre as duas cidades, como a questão da segurança?
Hawthorn - Eu já estava envolvido com a preparação das Olimpíadas em Londres há algum tempo, mas só quando fui às Olimpíadas de Beijing em 2008 e vi com meus próprios olhos que me dei conta de como o evento mobiliza a cidade inteira. Acredito que as diferenças entre Beijing e Londres são ainda maiores do que as entre São Paulo e Londres, mas ainda assim pudemos aprender uma lição, que foi a de entender a escala de oportunidades e de desafios.

É possível dar algum exemplo do que São Paulo poderia aproveitar?
Hawthorn - É um pouco difícil dizer porque não conheço a cidade de São Paulo tão bem assim. Mas certamente Londres vai ser bom para entender como uma cidade grande pode ser totalmente tomada por um evento como os jogos. Como disse o prefeito de Londres, até quem não quiser se envolver com as Olimpíadas vai acabar participando, será inevitável. E provavelmente muitas pessoas precisarão mudar um pouco a sua rotina e talvez fazer algum pequeno sacrifício para o sucesso do evento.

A que sacrifícios o sr. se refere?
Hawthorn - São pequenas adaptações no seu cotidiano, como pegar o transporte público em vez de usar o carro. Ou ainda, para desafogar o transporte público, ir até o trabalho de bicicleta. Outra opção é ir trabalhar num horário diferente para fugir da hora do rush dos jogos ou trabalhar de casa. E as empresas também poderão ajudar os seus funcionários com as mudanças necessárias para assegurar que os seus negócios corram tranquilamente, assim como os jogos.

Como é o relacionamento da Prefeitura de Londres com a do Rio?
Hawthorn - Nós já tínhamos um bom relacionamento com a cidade do Rio de Janeiro; em outubro passado, Neale Coleman, conselheiro do prefeito, foi com uma delegação ao Rio para assinar um acordo de cooperação. Antes disso, cheguei a conhecer o prefeito [Eduardo Paes] logo após o anúncio da escolha do Rio como sede. Ele veio acompanhado de uma delegação a Londres. De qualquer maneira, depois das Olimpíadas, no segundo semestre de 2012, uma comissão de Londres viajará ao Rio, assim como um grupo viajou de Pequim para Londres no final de 2008, para repassar a nossa experiência. E imagino que será interessante não só para o Rio como para as cidades que vão receber jogos da Copa.

Que conhecimentos o Rio poderá importar de Londres?
Hawthorn - Quando ocorreram os encontros, a Prefeitura do Rio se mostrou bastante interessada na regeneração que Londres está promovendo na parte leste da cidade. Uma segunda questão era aprender como os jogos podem ajudar a promover mais a cidade com um lugar de turismo e negócios. No caso do Rio, que já tem uma boa reputação internacional, os jogos vão ser uma oportunidade sem precedentes.

Quais são os pontos fortes que vê no Rio?
Hawthorn - Tanto em relação ao Rio como ao Brasil em geral, é a reputação internacional de ter um clima de festa e de celebração. E nós certamente temos algo a aprender com isso, pois o segredo do sucesso de Sydney foi justamente esse clima de celebração e de Carnaval. E, como todos sabem, nenhum outro país faz um Carnaval melhor do que o Brasil.