Perfil discreto, posse com gala e já atacado: Zanin assume vaga no STF
Do UOL, em Brasília e São Paulo
03/08/2023 04h00Atualizada em 03/08/2023 06h41
O criminalista Cristiano Zanin estreia hoje sua toga preta na posse como um dos 11 ministros da mais alta Corte do país, o Supremo Tribunal Federal. De perfil conservador e discreto, o piracicabano tem na bagagem a suspeição por ter sido advogado do presidente Lula (PT) e algumas pistas de seus posicionamentos sobre drogas, aborto e marco temporal, temas em discussão no STF.
Festa privê
Depois de tomar posse, Zanin será homenageado em uma festa para 400 convidados em Brasília. O evento acontece em um salão de festas e tem ingressos a R$ 500.
A lista de convidados tem de passar pelo crivo do novo ministro, que quer uma celebração mais reservada, por isso as vagas estão disputadas e simbolizam prestígio.
Na cota de Lula
Sempre que questionado sobre ser indicado ao STF, Zanin repetia o mantra: "A escolha é dele", acompanhado de um sorriso.
O "ele" se referia ao seu ex-cliente e presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que anunciou no dia 1º de junho o nome de "Cris", como costuma chamá-lo, para a vaga deixada por Ricardo Lewandowski em 11 de abril.
A escolha não surpreendeu ninguém, incluindo seus adversários, que sabiam que a disputa para essa vaga era desnivelada desde as eleições.
Já era esperado que eu fosse indicar o Zanin para o STF, não só pela minha defesa, mas porque eu acho que se transformará em um grande ministro da Suprema Corte.
Lula ao anunciar seu ex-advogado como indicado ao STF
Cabeça fria apesar de ataques
Longe dos holofotes, Zanin tentou submergir, mas se tornou alvo preferencial de ataques. Passou por um corredor polonês antes da sabatina e teve detalhes de sua discretíssima vida pessoal revirados em praça pública —desde o seu litigioso rompimento com o sogro, Roberto Teixeira, a processos trabalhistas envolvendo ex-babás.
Zanin se irritou, mas não demonstrou publicamente.
Também não ficou parado e procurou parlamentares para se livrar da alcunha de ser só o "advogado de Lula". Ganhou senadores em almoços e jantares, e fez um beija-mão de gabinete em gabinete no Senado. Colheu os louros com a aprovação do seu nome para o Supremo.
As críticas também foram pessoais. A serenidade do advogado foi colocada à prova recentemente, quando ele foi atacado num banheiro no aeroporto de Brasília. Zanin foi xingado de "safado" e "corrupto" e ainda ameaçado de que levaria uma "mão na orelha". "Tinha que tomar um pau de todo mundo que está na rua", disse o agressor Luiz Carlos Bassetto Junior.
Aluno mediano e lateral esquerdo
Nascido em Piracicaba, no interior de São Paulo, é filho de uma professora e de um advogado. Na escola, não era nem bom nem mau aluno. O advogado viveu em Piracicaba entre 1975, quando nasceu, e 1994, quando se mudou para cursar direito em São Paulo.
Ele é lembrado pelos conterrâneos como um jovem discreto, com notas medianas nos colégios em que estudou.
Nas horas vagas, um dos destinos de Zanin era o Clube de Campo da cidade, localizado no bairro São Dimas. Segundo o advogado, ele jogava como lateral esquerdo nas partidas de futebol realizadas no local, frequentado até hoje por membros de sua família.
Familiares do advogado evitaram falar sobre o seu integrante mais famoso. Um pacto coletivo de silêncio comum quando o primogênito é candidato a uma das vagas mais disputadas do Judiciário —e perdurou mesmo depois da sabatina no Senado.
No entanto, o UOL apurou que, para a mãe do novo ministro, sua indicação ao STF foi descrita como "um must".
Zanin se formou em direito pela PUC (Pontíficia Universidade Católica) de São Paulo há 24 anos, após se mudar de Piracicaba para a capital paulista para estudar em 1994.
Toda sua notoriedade surgiu ao defender Lula nos processos da Operação Lava Jato, que levou o presidente à prisão em Curitiba. Depois teve os processos anulados e conseguiu a liberdade.
São-paulino, tuiteiro e fã de séries
O novo ministro do STF é torcedor do São Paulo, a favor da vacinação de crianças e gosta de assistir a séries.
"La Casa de Papel" e "Mestres da Enganação" são algumas das produções que Zanin já assistiu no Netflix. Ele as recomendou no Twitter, assim como os filmes "Death to 2020" e "O Dilema das Redes", também hospedados no serviço de streaming.
O advogado usou a mesma rede para se posicionar a favor da vacinação de crianças em 23 de dezembro de 2021. À época, ele classificou como "repulsivo e inconstitucional" o comportamento de quem era contra a medida.
O Twitter também foi a rede escolhida por Zanin para divulgar uma foto sua com o papa Francisco em 14 de fevereiro de 2020. Nas imagens, o advogado entrega ao pontífice um exemplar do livro "Lawfare: Uma Introdução", do qual é um dos autores. É possível ver Lula ao fundo.
Ao menos até a publicação deste texto, sua rede social era trancada a novos seguidores.
Casamento e briga em família
Sua carreira na advocacia começou o escritório Arruda Alvim, pertencente ao pai de um de seus professores. Ele atuou como estagiário e advogado sênior na banca por cinco anos e só saiu depois de conhecer Valeska Martins, com quem se casou.
Valeska é filha do advogado Roberto Teixeira e afilhada de Lula. A advogada passou a primeira parte da infância em São Bernardo do Campo. Foi lá que o pai, Roberto Teixeira, fez amizade com o presidente Lula na época que o petista era líder do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema.
Após o casamento, Zanin passou a trabalhar no escritório do sogro.
Em 2004, Zanin representou a Transbrasil em um processo movido pela empresa contra a General Eletric no STF e ganhou a causa. Nove anos depois, o advogado defendeu Fábio Luis da Silva, filho de Lula, em outro processo no mesmo tribunal — relacionado à concessão de um passaporte diplomático.
A partir de 2015, Zanin fez a defesa do atual presidente em diversos processos no Supremo.
Em 2022, Zanin brigou com Teixeira, com quem deixou de trabalhar. A briga deu origem a uma disputa entre os dois pelos honorários de um processo que tocaram juntos no escritório, avaliados em R$ 5 milhões. No fim, os dois repartiram a quantia igualmente — mas Zanin e Valeska não se relacionam mais com Teixeira.