ONG cobra Lula para tirar pessoas com deficiência de casas coletivas
Em comunicado publicado hoje, a HRW (Human Rights Watch), organização internacional ligada aos direitos humanos, cobrou do governo Lula (PT) um plano para tirar pessoas com deficiência de instituições de acolhimento e moradias coletivas.
O que aconteceu
A organização sugere que o governo federal crie projetos para que as pessoas com deficiência vivam de maneira independente. Segundo a Human Rights, o programa Viver Sem Limites, previsto para ser lançado no próximo mês, pode colaborar para implementação de ações nesse sentido.
Milhares de pessoas com deficiência no Brasil vivem em instituições ou residências inclusivas -- pequenos lares coletivos planejados para até 10 pessoas com deficiência. Em vários aspectos as condições dessas instituições se assemelham a condições prisionais.
Human Rights Watch em comunicado
O primeiro passado, de acordo com Carlos Ríos-Espinosa, diretor-adjunto de direitos das pessoas com deficiência da Human Rights Watch, é criar um plano para retirar o grupo dessas instituições. "Sabemos que não será de um dia para o outro, porque é uma questão que precisa de muitas ações, uma política integrada", explica.
Como exemplo, ele cita o caso de Leonardo, entrevistado pela ONG em 2018. O jovem morava em uma instituição desde os 15 anos. Na época com 25, ele dividia um quarto com outros 24 homens e mulheres, sem qualquer privacidade e escolhas sobre sua rotina.
A Human Rights cita também no comunicado que o programa que deve ser lançado pelo governo federal não vai abordar a "necessária desinstitucionalização dessas pessoas". A organização afirma ter conversado com os responsáveis pela elaboração e implementação do Viver Sem Limites.
Há previsão do governo investir em 200 residências inclusivas adicionais, diz a ONG. "O governo deveria estabelecer um plano concreto e com prazos determinados para a desinstitucionalização das pessoas com deficiência, com foco no apoio na comunidade e garantindo que todos os recursos sejam direcionados para esse fim", afirma.
É preciso criar um sistema para vida independente, que envolva moradia, assistentes pessoais, acessibilidade nos serviços e nas comunicações. Vida independente quer dizer que a pessoa tenha a capacidade de tomar as decisões fundamentais de sua vida. Com quem, como e em onde viver.
Carlos Ríos-Espinosa, diretor-adjunto de direitos das pessoas com deficiência da Human Rights Watch
Violações contra pessoas com deficiência
Em investigação feita em 2018, a Human Rights mostrou uma série de abusos cometidos contra crianças e adulto com deficiência em instituições visitadas pela organização. Na época, foram ouvidas mais de 150 pessoas.
Decisões simples como quando e o que comer eram feitas por funcionários, diz a apuração da ONG. "Muitas pessoas ficavam confinadas em suas camas ou quartos por longos períodos ou, em alguns casos, o dia inteiro", afirma relatório.
No início do mês, a organização revistou três instituições citadas no relatório de 2018. A Human Rights afirma que os funcionários continuam determinando os horários para que as pessoas andem, comam, durmam e façam passeios.
O comunicado também cita o caso de uma mulher que autorizou dar entrevista para a ONG, mas teve o momento interrompido por uma funcionária. A justificativa dada era de que ela não tinha "autonomia para decidir por si mesma".
Quando a Human Rights Watch entrevistou essa mulher em 2016, ela disse que a instituição é "como uma prisão". Desde o início da pandemia em março de 2020 até junho de 2023, todas as visitas para os residentes da instituição foram interrompidas.
Comunicado da Human Rights Watch
Programa começou em 2011
A primeira edição do Viver Sem Limites aconteceu durante o governo Dilma Rousseff (PT). O projeto incluiu investimentos para diferentes áreas —na época, foram cerca de R$ 7,6 bilhões para serem aplicados nas áreas da educação, saúde e área social.
Para Espinosa, o primeiro programa foi importante para o desenvolvimento de políticas públicas. "Ainda falta garantir, entretanto, que as pessoas com deficiência possam morar com os mesmos direitos de qualquer outra pessoa", afirma.
Procurado, o Ministério dos Direitos Humanos disse que vai lançar um plano no próximo mês. "O objetivo é promover, por intermédio da integração e articulação de políticas, programas e ações, o exercício pleno dos direitos das pessoas com deficiência e de suas famílias". A pasta afirma que recebeu cerca de 2,5 mil contribuições sobre o programa.
Human Rights Watch cobrou do governo federal medidas tirar pessoas com deficiência de instituições de acolhimento e moradias coletivas.