Evangélicos pressionam contra casamento homoafetivo, mas PL deve empacar
Do UOL e colaboração para o UOL, em Brasília
26/09/2023 04h00Atualizada em 26/09/2023 13h35
Um PL (projeto de lei) que proíbe o casamento homoafetivo deve ser votado nesta semana na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara. A proposta, que tramita na Casa há 16 anos, é apoiada pela bancada evangélica em reação ao STF e a propostas do governo Lula (PT), mas sofre forte oposição.
O que aconteceu
PL era de Clodovil e foi alterado por pastor. O projeto de lei 580 de 2007, de autoria do deputado falecido Clodovil Hernandes (então eleito pelo PTC de SP), sugeria reconhecer a união entre pessoas do mesmo gênero no Código Civil. Agora, o relator da proposta, Pastor Eurico (PL-PE), propôs proibir o casamento homoafetivo.
Só o Pastor Eurico manifestou interesse em ser relator. O deputado Fernando Rodolfo (PL-PE), presidente da comissão, afirmou ao UOL que, quando decidiu colocar o projeto do casamento homoafetivo em pauta, perguntou aos integrantes do colegiado quem gostaria de relatar a proposta, e só o deputado pastor respondeu.
A mudança no texto gerou revolta entre os parlamentares da esquerda. Eles conseguiram adiar a votação do projeto duas vezes.
Hoje (26) haverá uma audiência pública para discutir a proposta. Na quarta, o texto vai a votação. Parlamentares ouvidos pelo UOL avaliam que dificilmente conseguirão impedir a aprovação do projeto no colegiado, em sua maioria formado por conservadores e deputados do centrão.
Mas, na avaliação de Rodolfo, não há garantia de que o projeto seja aprovado depois da repercussão dos últimos dias. O colegiado tem um quórum pequeno, de apenas 18 deputados, e para aprovar são necessários metade dos votos dos deputados presentes.
Se passar na comissão, o projeto será analisado ainda na Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial, que tem maioria governista, e depois na CCJ (Comissão de Constituição de Justiça), presidida por Rui Falcão, do PT, o que deve criar alguns obstáculos para o tema avançar. Pelo regime de tramitação, a proposta não tem necessidade de passar pelo plenário da Câmara e poderá ser encaminhada para o Senado se receber a aprovação nos dois colegiados.
O casamento homoafetivo é reconhecido pelo STF desde 2011 no Brasil. Em 2013, o CNJ (Conselho Nacional da Justiça) determinou que todos os cartórios do país realizassem casamentos entre pessoas do mesmo gênero.
Pressão evangélica
A Frente Parlamentar Evangélica quer usar o segundo semestre para pressionar pela votação das pautas de costumes. Entre elas, estão o projeto contra o casamento homoafetivo, os Estatutos da Família e do Nascituro —que proíbe o aborto do feto em qualquer circunstância— e a isenção de impostos a igrejas.
Os temas costumam aglutinar o público mais conservador e desviar as atenções de questões espinhosas, como as investigações que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Nos seis primeiros meses do mandato de Lula, houve um acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para aprovar propostas importantes na economia, como o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária, sem tocar em temas considerados ideológicos.
Com o fim do compromisso, agora a dúvida está em qual será a atitude de Lira. É dele a prerrogativa de escolher os assuntos que serão votados no plenário. Mas a indicação recente de dois ministros do centrão para entrar no governo e outras negociações põem em xeque o apoio do parlamentar do PP.
Votação em plenário
Pedido para que todos os deputados votem. A deputada Tabata Amaral (PSB-SP) apresentou um requerimento para que o projeto seja analisado também pelo plenário da Câmara, mas Lira ainda não decidiu.
O PL 580/2007, que quer proibir casamentos homoafetivos, é um retrocesso social. Estamos lutando para derrubar esse absurdo, que não pode ser aprovado, muito menos sem debate e a intervenção de todos os parlamentares. Uma proposta dessa magnitude, que no nosso entendimento é inconstitucional, não pode ser aprovada ouvindo a opinião de poucos parlamentares e tramitando em apenas algumas comissões.
Deputada Tabata Amaral (PSB-SP)
Do que reclama a bancada evangélica
O movimento também funciona como uma reação ao Supremo Tribunal Federal, que se posicionou nas últimas semanas sobre temas sensíveis aos evangélicos, como a descriminalização do aborto e do porte de maconha. Na avaliação da bancada, o Supremo está "usurpando" a autoridade do Congresso para legislar sobre esses assuntos.
Nós vamos reagir à usurpação de competência do STF com relação às pautas de costumes.
Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), deputado da bancada evangélica
Ex-presidente da bancada evangélica, o deputado Eli Borges (PL-TO) afirmou que a bancada evangélica também se opõe à atuação do presidente Lula (PT). Ele disse que o Planalto governa por medidas provisórias e decretos em temas caros aos conservadores.
Aborto, redução na idade para transição de gênero e controle de drogas são os motivos citados para a ofensiva dos evangélicos. Eles dizem que o governo federal está usando o Conselho Nacional de Saúde para driblar o Legislativo e implementar políticas públicas.
Governo federal não tomará a frente em questões como o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo gênero, declarou o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT-SP), em entrevista ao UOL.
O deputado pastor Marco Feliciano (PL-SP) afirmou que Lula mentiu ao assinar uma Carta aos Evangélicos durante a eleição do ano passado. Na ocasião, o petista se comprometeu a defender as famílias, algo que os opositores afirmam não estar acontecendo.