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Governo triplica pedidos à PF; maioria investiga ataques a Lula e Janja

31/01/2024 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado da primeira dama, Janja Lula da Silva, em evento no Palácio do Planalto Imagem: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Do UOL, em Brasília

24/05/2024 04h00Atualizada em 24/05/2024 15h46

Os pedidos de investigação encaminhados pelo governo à Polícia Federal dispararam no terceiro mandato do presidente Lula (PT) e já representam mais que o triplo das solicitações feitas durante todo o governo de Bolsonaro (PL).

O que aconteceu

Houve 159 pedidos de abertura de inquérito feitos pelo Ministério da Justiça entre janeiro de 2023 e abril deste ano (média de 9,9 por mês). Já entre 2019 e 2022, a pasta encaminhou 44 solicitações à PF para abertura de inquéritos (média de 0,9 por mês). O levantamento foi feito pelo UOL junto ao ministério.

Maior parte dos pedidos foi feita na gestão Flávio Dino, que ficou mais tempo no comando da pasta. O hoje ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) chefiou o ministério de janeiro de 2023 até janeiro deste ano. Do total de 159 pedidos encaminhados, 135 foram em 2023, na gestão dele — e 24 na de Ricardo Lewandowski, que assumiu em fevereiro.

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Investigações de crimes contra a honra são maioria. Do total de pedidos feitos até o momento, 91 são suspeitas de crime contra a honra envolvendo o primeiro escalão do governo. Desses, 65 são especificamente relacionados ao presidente Lula e à primeira-dama Janja da Silva. Esse número sozinho já supera todas as solicitações do Ministério da Justiça na gestão Bolsonaro.

Pedidos de investigação de crimes contra a honra de Lula e Janja aumentaram sob Lewandowski. Em relação ao pedidos para investigar crimes contra o presidente e a primeira-dama, a maioria também se deu na gestão Dino em números absolutos: 47. Mas, na média, o maior número de pedidos ocorreu sob Lewandowski: 18 no total, ou 6 por mês.

PF é obrigada a abrir inquérito, mas pode não ver crime

Autoridades têm obrigação de denunciar possíveis irregularidades. Caso se deparem com suspeitas de crimes, os ministros precisam tomar alguma medida, como acionar os órgãos de controle. Do contrário, podem ser acusados de prevaricação.

Pedidos precisam ser atendidos pela PF. Quando recebe alguma solicitação do tipo do ministro da Justiça, a Polícia Federal tem que atender e abrir inquérito, ainda que na condução da investigação eventualmente ela não encontre nenhum indício de crime.

Parlamentar chamou Lula de corrupto, mas PF não apontou crime. Exemplo de como a abertura de inquérito não leva obrigatoriamente ao indiciamento ocorreu no último dia 14 de maio. A PF enviou ao STF relatório final de uma investigação solicitada por Dino em agosto de 2023 contra o deputado federal Gilvan da Federal (PL-ES), mas não recomendou denúncia.

Deputado chamou Lula de "ex-presidiário, ladrão e corrupto". O pedido era para apurar eventuais crimes de calúnia e difamação pelo fato de Gilvan ter chamado Lula de "ex-presidiário, ladrão, corrupto, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro" durante uma manifestação pró-armas. No relatório final encaminhado ao STF, o delegado do caso, Alessandro Silveira Furtado, se limitou a descrever o vídeo e a transcrever o depoimento do deputado, e concluiu o caso sem apontar qual crime teria sido cometido. O caso agora está sob análise da Procuradoria-Geral da República.

Volume de pedidos chama atenção

Risco de politização dos órgãos de investigação. O alto número e a natureza dos pedidos feitos, sobretudo na gestão Dino à frente da Justiça, têm levantado debate sobre os riscos de politização da PF.

Pedidos têm causado a reação de políticos da oposição. Em um dos pedidos mais recentes, que Lewandowski recebeu do então ministro da Secom, Paulo Pimenta, em 7 de maio e encaminhou para a PF, a oposição chegou a acusar o governo de "abuso de autoridade".

Pimenta pediu apuração contra parlamentares por fake news no RS. Ele pediu a abertura de um inquérito para investigar políticos e influenciadores, principalmente do espectro da oposição, que estariam divulgando informações falsas envolvendo as enchentes no Rio Grande do Sul. O pedido conta com críticas à atuação do Estado e inclui até um post do deputado federal Eduardo Bolsonaro.

Partido Novo chegou a apresentar queixa-crime na PGR. A sigla acusa Pimenta e Lewandowski de abuso de autoridade por tentarem supostamente criminalizar postagens que estariam contempladas pela liberdade de expressão. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, porém, não viu crime dos ministros e arquivou o pedido. Em paralelo, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou um convite para Pimenta participar de uma audiência pública no colegiado e explicar os critérios para solicitar a investigação.

Lewandowski se reuniu com oposição e disse que tinha obrigação de encaminhar o pedido. Com perfil diferente de seu antecessor, o ministro da Justiça recebeu no último dia 15 três deputados bolsonaristas na sede do ministério para conversar sobre o pedido de inquérito feito por Pimenta. Na ocasião, ele, que já foi ministro do STF, explicou que tinha a obrigação de encaminhar a solicitação à PF, sob o risco de ser acusado do crime de prevaricação, isto é, de deixar de agir diante de uma suspeita de ilegalidade.

PF não pode apenas ser pautada, avalia especialista

PF precisa ter olhar técnico, diz especialista. O professor de direito constitucional Alvaro Palma de Jorge, da FGV-Rio, afirma que a preocupação com o uso político da polícia por parte dos governos atravessa a história do Brasil e que é necessário ficar atento a como se dará a condução dos casos nos órgãos de investigação.

Especialista alerta para risco de governo pautar agenda de órgãos. Para Jorge, é necessário avaliar os tipos de investigações que têm sido solicitadas e os desfechos dos casos na PF, mas também levar em conta que os pedidos do governo não podem pautar a agenda do órgão.

Disparada de investigações envolvendo crime contra a honra causa 'estranheza'. Questionado sobre os números levantados pela reportagem, o professor ainda ponderou que é necessário avaliar qualitativamente os pedidos de investigação diante do contexto de forte polarização no país, mas ressaltou a estranheza com a alta porcentagem de pedidos envolvendo especificamente Lula e Janja.

Não tenho dúvidas que muitas vezes quando o Executivo solicita uma instauração de investigação ele não está olhando essa situação só do ponto de vista criminal (...) É nesse momento que a investigação independente precisa separar essas duas visões: a motivação pode ser política, mas a condução do processo pelas autoridades não pode ser, tem que ter o olhar apenas do direito.

O que não pode acontecer é o risco de o governo monopolizar a atuação da PF com sua pauta de preocupações. Claro que qualquer órgão de estado tem quantidade de pessoas e recursos à disposição. Se eventualmente só se pautar a partir da provocação de um ente, aí a própria Polícia Federal tem que parar para ver se seu papel de investigador está sendo desempenhado na melhor forma possível.

Óbvio que temos que ter muito claro que há uma diferença entre o que são críticas e protestos contra a atuação do presidente e o que é de fato um crime contra a sua honra. (...) Não deixa de ser estranho que cerca de 47% das solicitações da pasta sejam para solicitar a abertura de inquéritos deste tipo..
Alvaro Palma de Jorge, professor de direito constitucional da FGV-Rio

Governo mira políticos, MP mira fraudes

No RS, investigação do Ministério Público estadual não mira políticos. Enquanto o governo federal provocou uma investigação envolvendo políticos e influenciadores no STF, o Ministério Público do Rio Grande do Sul focou sua atuação em perfis que divulgaram chaves falsas de Pix para desviar dinheiro para doações.

Órgão vem atuando desde o dia 5 de maio para derrubar perfis que divulgaram chaves falsas. O MP local acionou a Justiça e conseguiu derrubar 18 perfis falsos e bloquear 15 chaves de pessoas físicas e jurídicas que se passavam por canais oficiais para conseguir dinheiro de doações.

MP gaúcho fechou parceria com empresa. Em seu esforço para coibir fraudes, o Ministério Público local também firmou uma parceria com uma empresa de tecnologia para mapear perfis falsos que utilizam símbolos do governo estadual para desviar dinheiro de ajuda às vítimas.

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