'Lula não sobe a rampa': por que plano de golpe tinha número 142?
Do UOL, em São Paulo
27/11/2024 11h20
O plano de golpe exposto no relatório da Polícia Federal que teve o sigilo levantado nesta terça-feira (26) levava o nome de "Operação 142". O número faz referência ao artigo 142 da Constituição Federal, em uma interpretação errônea sobre seu conteúdo.
O que significa o artigo 142
Na Constituição, o artigo regulamenta o papel das Forças Armadas. Ele diz que são instituições nacionais permanentes, "organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República" para defesa da pátria.
As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Artigo 142 da Constituição Federal
É usado erroneamente desde as últimas eleições como base para rejeitar o novo governo. Os apoiadores contrários à posse de Lula se escoram em uma publicação de 2021 do então presidente Jair Bolsonaro (PL) com uma entrevista do jurista Ives Gandra Martins sobre este artigo —cuja interpretação não é partilhada por outros juristas especializados.
Interpretação de Ives Gandra Martins
Em 2021, Bolsonaro publicou uma entrevista do jurista em que ele falava sobre o artigo 142. A mensagem passada é que este artigo daria às Forças Armadas um poder de moderação quando houver um conflito entre os Poderes.
Segundo o texto, há uma interpretação sobre uma das três funções atribuídas constitucionalmente às Forças Armadas, o papel de defesa da lei e da ordem. Mas a interpretação de Ives Gandra não é partilhada por outros juristas. Eles veem as Forças Armadas com a função de proteger a segurança nacional, de acordo com a Constituição.
O sistema político brasileiro proíbe os militares de intervir na política e não prevê um mecanismo de intervenção militar "constitucional". A Constituição de 1988, logo no Artigo 1º, parágrafo único diz que "todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".
'Operação 142'
Segundo o relatório da PF, o plano de golpe levava esse nome fazendo alusão ao artigo em "uma possibilidade aventada pelos investigados como meio de implementar uma ruptura institucional após a derrota eleitoral do presidente Jair Bolsonaro".
Ainda segundo o relatório, "o documento, dentro do tópico 'Linhas de esforço', propunha algumas ações. Elas incluíam "interrupção do processo de transição", "mobilização de juristas e formadores de opinião" e "enquadramento jurídico do decreto 142 (AGU e MJ)'", em referência à Advocacia-Geral da União e ao Ministério da Justiça.
Outros tópicos possuem siglas e jargões próprios do militarismo como "CG Pol" (Centro de Gravidade Político), com a descrição de medidas autoritárias, que demonstram a intenção dos investigados em executar um golpe de Estado para manter o então presidente Jair Bolsonaro no poder.
Trecho de relatório da Polícia Federal
No diagrama, estavam previstas a anulação das eleições, a prorrogação dos mandatos, a substituição de todo o TSE e a preparação de novas eleições. "Por fim, sob o tópico EFD Pol (Estado Final Desejado Político), destaca-se o texto 'Lula não sobe a rampa', com a clara alusão ao impedimento de que o vencedor das eleições de 2022 assumisse o cargo da Presidência", diz um trecho do documento.
Bolsonaro e outros indiciados negam tentativa de golpe. "A palavra golpe nunca esteve no meu dicionário", disse o ex-presidente na segunda-feira (25);