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Em vez de relaxar, meditação pode provocar crises mentais, diz psicólogo

Reprodução/uratex
Imagem: Reprodução/uratex

Jolyon Jenkins

BBC News Magazine

26/03/2016 20h51

Está sentado comodamente? Feche os olhos. Tome uns minutos para se acalmar. Quando estiver pronto, preste atenção em sua respiração. Simplesmente observe como o ar viaja de fora para dentro de seu corpo, enquanto você inala e exala.

Na medida em que você faz isso, sua atenção foca-se no momento presente, sua mente se acalma por si só e o estresse e a ansiedade diminuem.
Se você faz isso periodicamente, terá mais concentração, criatividade, tranquilidade e bem-estar, além de melhores relações com os outros.

A prática da meditação 'mindfulness' ou atenção plena se estendeu amplamente e não apenas entre os místicos orientais, hippies ocidentais e curandeiros alternativos. Ela se tornou algo que seu médico poderia sugerir. Até há aplicativos que ajudam a praticá-la.

Afirmam que ela é eficaz no tratamento de doenças mentais, mas também pode beneficiar a qualquer pessoa, inclusive aquelas que estão bem. Afinal, sentar-se em silêncio e respirar não pode fazer mal. Será?

Foi o que Suzanne (nome fictício), uma francesa de 20 anos, pensou. Há pouco mais de um ano, ela decidiu ir a um retiro de meditação em silêncio em Manchester, Reino Unido.

O plano de meditação era bastante intenso: dez dias seguidos; estava proibido falar ou fazer contato visual com outras pessoas, inclusive quando terminavam as sessões diárias. Tudo estava bem até o sétimo dia, quando Suzanne teve um ataque de pânico.

"Senti como se meu cérebro tivesse explodido", disse. "Senti como se estivesse completamente separada do meu próprio corpo."

Foi buscar a ajuda de seus professores, que a aconselharam a continuar meditando. Ao fim do curso, voltou, com dificuldade, a França, onde, na casa de sua mãe, piorou.

Tentei seguir adiante com a minha vida, mas foi impossível. Não podia sair da cama, não conseguia comer. Estava tendo sintomas de terror e pânico. Tinha muito medo e tive 'despersonalização' - isso é, basicamente, quando você se olha no espelho e é incapaz de reconhecer-se- e 'desrealização', que é quando o mundo parece irreal.

Suzanne deu entrada em um hospital psiquiátrico, onde deram a ela medicação antipsicótica. Um ano depois, ainda a toma. Disse que se sente muito melhor, mas '"ainda tem um longo caminho a seguir".

"Nem boa nem má"

O caso de Suzanne é extremo, mas não tão incomum como se poderia pensar. A BBC falou com várias pessoas que aparentemente estavam em bom estado de saúde mental antes de provar a meditação, e que tiveram graves crises durante e depois de praticá-la.

O problema não se limita apenas a pessoas que vão fazer cursos intensivos de meditação.

Tim Lomas, um psicólogo de Londres, publicou recentemente um artigo acadêmico sobre homens que estavam fazendo meditação por razaões não clínicas.

Ainda que a maioria deles se beneficie da prática, 25% encontrou o que Tomas chama de "dificuldades substanciais" incluindo "experiências desafiantes do eu" e uma "dissolução da identidade".

Para alguns, a atenção plena "os fez conscientes de sua angústia, mas incapazes de lidar com ela, pelo que eles descobriram que a meditação não era apenas inútil, mas contraproducente".

Lomas não se diz inimigo da meditação. Segundo ele, essas experiências não eram "necessariamente boas ou ruins". Ele conta de um homem que

Depois da meditação se sentia aparentemente "perto da psicose" não apenas saiu dela, mas disse que a experiência foi "uma das mais transformadoras de sua vida".

A noite escura

Outro fã da meditação é Daniel Ingram, médico de emergências no Alabama, nos Estados Unidos, que também dirige um fórum on-line sobre o assunto com mais de 5.000 membros.

Segundo Ingram, experiências fortes são produto da meditação e exatamente o que alguém deveria esperar dela, se se segue a teoria do budismo Theravada.

Nessa tradição, há uma fase da meditação chamada "surgir e desaparecer", depois da qual vem a "noite escura" e, para alguns, a noite escura é muito escura.

"Pode ser uma depressão bastante extrema, episódios micro-psicóticos e depressão psicótica, e pode fazer com que a pessoa chegue à beira do suicídio, e em alguns casos inclusive se mate", diz Ingram.

"É realmente surpreendente que a ciência ocidental não haja notado isso. O que é lamentável, tendo em conta o grande número de pessoas que agora estão meditando em doses suficientes para cruzar o surgir e desaparecer", acrescentou.

"Experiências loucas"

"Você deveria ver os e-mails que recebo. Há muita gente sentindo-se assim. E não só pessoas que passaram muito tempo em retiros intensos de meditação. Sei de muitas pessoas que cruzaram esse território de forma espontânea, incluindo um número de membros da família. Sei de uma pessoa que teve uma crise quando voltava para casa de uma aula de ioga e destruiu seu carro."

"Todo tipo de gente me liga para dizer 'Acabo de fazer um curso de redução do estresse baseado na consciência plena e, de repente, estou tendo experiências loucas."

Ingram acredita que isso aumentará à medida que cresce o interesse pela meditação plena: "Eu diria que é quase garantido."

Se uma pessoa faz parte de uma tradição religiosa que tem um componente de meditação - e muitas o tem -, então é possível aceitar essas dificuldades como parte do caminho à iluminação.

Mas o que é curioso é a forma pela qual a prática espiritual se converteu em um tratamento quase médico, ou uma parte de um estilo de vida.

A meditação tem potencial de por a vida de cabeça para baixo. Isso pode ser bom, mas também pode ser muito mais do que alguém esperava.