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'Achei que minha boca ia explodir': os riscos dos procedimentos estéticos sem controle

BBC
Imagem: BBC

06/12/2016 07h02

Cada vez mais britânicos estão recorrendo a procedimentos estéticos. Muitos saem satisfeitos com os resultados - mas a indústria da beleza britânica, avaliada em 3,6 bilhões de libras, não está regulamentada, o que coloca em risco a segurança dos pacientes.

"Assim que terminou, entrei no carro e chorei. Senti que eu tinha me autoflagelado".

O depoimento é de uma das milhares de jovens que se submetem ao preenchimento facial como uma solução milagrosa para elevar a autoestima. O procedimento estético é um dos mais acessíveis, uma vez que não precisa ser feito por médico ou clínica autorizada no Reino Unido.

Aos 24 anos, Tina, que prefere não revelar seu nome verdadeiro, pagou 75 libras por um preenchimento labial, realizado no salão de beleza que frequentava.

"Foi fácil demais", disse.

"Logo depois, ficou horrível. Muito inchado", se recorda.

"Eu nunca senti tanta dor como naquela noite. Fiquei acordada de 2h até 5h da manhã no banheiro, observando meu lábio no espelho. Achei que a minha boca ia explodir. E senti vergonha por ter me submetido a isso apenas por vaidade", conta.

Tina diz que seu parceiro não se conformava:

Boca - BBC - BBC
Tina pagou 75 libras por um preenchimento labial
Imagem: BBC
"Ele ficou bravo. Eu pensei que a gente ia terminar por causa disso. Ele dizia: 'Você sempre falou que queria parecer natural - por que você fez isso?'", relata.

O caso de Tina é apenas um entre tantos. Uma pesquisa da BBC, realizada em outubro, mostrou que 32% das mulheres britânicas buscam cirurgia plástica. Entre as mulheres com menos de 35 anos, esse percentual sobe para 45%.

O procedimento cirúrgico mais popular é o aumento dos seios. Sarah, que também não quis dar seu nome verdadeiro, se submeteu a essa operação aos 21 anos.

"Eu estava muito infeliz com a aparência do meu corpo", diz.

A jovem se consultou gratuitamente em uma clínica onde conta ter sido recebida por uma equipe calorosa, que não parecia ser formada por médicos. Pagou um depósito não reembolsável de 500 libras e foi submetida à cirurgia para colocar silicone nos seios.

Após o procedimento, ela conta que sentiu uma dor tão forte que não conseguia sentar na cama sem ajuda por duas semanas. E imediatamente teve consciência de que o implante parecia completamente falso.

"É algo que eu tenho que admitir. Sou tão superficial que passei por tudo isso e ainda gastei esse dinheiro todo", desabafa.

"Os implantes só duram de 10 a 15 anos, se você tiver sorte. Então depois, você ainda tem que passar por isso novamente para ter as próteses substituídas ou removidas", completa.

Desde 2014, tem havido um aumento de 13% ao ano em todos os procedimentos estéticos, de acordo com relatório anual da Associação Britânica de Cirurgiões Plásticos Estéticos (Baaps, na sigla em inglês). No entanto, essa continua a ser uma das áreas menos regulamentadas da medicina no Reino Unido.

Há seis anos, um escândalo - que revelou próteses mamárias adulteradas, feitas a partir de silicone industrial - levou o governo a solicitar uma revisão da regulamentação da indústria.

A revisão chamou a atenção para as injeções de preenchimento facial, recomendando que só deveriam ser aplicadas mediante prescrição médica. Para Rajiv Grover, ex-presidente da BAAPS, a medida tornaria o procedimento mais seguro.

"Iria regulamentar quem é capaz de realizar esse tipo de tratamento - que teria que ser um profissional médico - e impediria tanta publicidade", afirma.

"O excesso de marketing dá a impressão que esses tratamentos são um passaporte para uma vida de glamour. Essa ideia é completamente equivocada", completa.

A revisão também recomendou um registro obrigatório de cirurgiões plásticos, que listariam suas especialidades, qualificação para aplicar preenchimento facial e um seguro compulsório para o caso de algo dar errado. Nenhuma das medidas foi totalmente implementada.

A médica Rosemary Leonard, que participou do painel de revisão, sente que foi uma perda de tempo.

"Um preenchimento facial segue tão regulamentado quanto uma caneta esferográfica. Qualquer um pode colocar preenchimento no rosto de alguém. Estou muito triste e irritada. O governo adotou muito pouco das nossas recomendações", afirma.

Em sua clínica, a médica recebe diversas pacientes vítimas de cirurgias plásticas malsucedidas.

"Eu vi cicatrizes assustadoras de cirurgias que deram errado," conta.

Mas, mesmo quando os procedimentos são bem-sucedidos, também podem ser questionados.

Sharon Dhaliwal fez uma cirurgia plástica no nariz, aos 23 anos, após ter sofrido bullying na escola.

Ela conta que se tornou mais extrovertida após o procedimento e parou de desviar o olhar quando estava diante do espelho.

Ela se pergunta agora, no entanto, se devia ter encarado seu nariz proeminente indiano como normal, ao invés de se render a uma visão eurocêntrica de beleza, em que apenas um nariz pequeno e arrebitado é considerado atraente.

"Eu removi parte da minha identidade", diz.

"Me sinto chateada, ninguém me disse que eu era bonita mesmo com um nariz grande", desabafa.

No ano que vem, o Royal College of Surgeons vai lançar um novo registro para cirurgiões plásticos. Para se qualificarem, os médicos terão que provar que já realizaram um certo número de procedimentos e fornecer uma referência.

Além disso, o órgão consultivo Health Education England desenvolveu uma qualificação, com status de pós-graduação, para os profissionais que desejam aplicar preenchimentos faciais.

Mas, até o momento, nem o registro nem a qualificação serão obrigatórios. E a indústria da beleza bilionária continuará a funcionar sem ser regulamentada.