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Síndrome do Coração Partido é pouco conhecida até entre os médicos

O problema surge após a pessoa passar por forte emoção, independente de ser positiva ou negativa - Getty Images
O problema surge após a pessoa passar por forte emoção, independente de ser positiva ou negativa Imagem: Getty Images

Cármen Guaresemin

Do UOL, em São Paulo

26/04/2013 07h00

Pouco conhecida até entre médicos, a Síndrome do Coração Partido leva muita gente - especialmente mulheres a partir dos 55 anos - ao pronto-socorro com a certeza de estar sofrendo um infarto. O problema ocorre após uma pessoa passar por forte emoção, independente de ser positiva ou negativa.

Chamada oficialmente de cardiomiopatia de Takotsubo, a síndrome foi relatada pela primeira vez por médicos japoneses, no início dos anos 1990. Foi assim batizada graças à imagem do ventrículo esquerdo na sístole que, após o problema, se assemelhava a uma armadilha para capturar polvos (tako) em forma de pote (tsubo) muito comum no Japão.

 “As mulheres estariam mais sujeitas à síndrome graças à maior sensibilidade. Porém, existem diferenças anatômicas e hormonais entre elas e os homens. Quando isso foi dito anos atrás, em oposição ao preceito de que as mulheres são o sexo forte, elas ficaram muito bravas”, afirma o cardiologista Marcelo Sampaio, do Instituto Dante Pazzanese.

Guilherme de Menezes Succi, membro especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, diz que a doença acomete quase que exclusivamente mulheres na fase pós-menopausa. “As causas exatas para isto ainda não estão claras, mas parece haver relação com a redução dos níveis de estrogênio na pós-menopausa e, consequentemente, do seu efeito protetor do endotélio, que é a camada interna das artérias”.

Sem obstrução

Marcelo Sampaio explica que no infarto clássico as artérias fecham e coração não volta a funcionar. Na síndrome, a artéria não tem obstrução, o coração para, mas volta ao normal. “Os casos descritos aconteceram mais por estresse, pela emoção mesmo”. Já Succi acrescenta que a síndrome deve-se à secreção anormal, em situações específicas, de adrenalina e noradrenalina, com efeitos deletérios no coração.

Os sintomas, porém, são os mesmos do infarto: dor no peito, queda de pressão, desmaio. Porém, na grande maioria dos casos, a pessoa vai melhorando e fica sem sequelas.  “Elas sofrem com uma descarga de adrenalina e outros hormônios do estresse, que sobrecarregam o coração, atrapalhando seu funcionamento”, afirma Sampaio.

Ele relata o caso de uma paciente: “Era uma mulher de 58 anos, que passou por uma separação, desenvolveu câncer, não tinha convívio social e se tornou melancólica. Chegou ao pronto-socorro com as características clássicas do infarto. Durante o cateterismo, as coronárias estavam normais, mas o músculo cardíaco alterado”.

Relativamente nova

Sampaio alerta que os médicos, em geral, desconhecem a síndrome, por ela ser relativamente recente. “É preciso chamar a atenção da classe médica. Se um homem e uma mulher chegam com as mesmas características de infarto no PS, o homem é atendido antes, pois acreditam que a mulher não está tendo um infarto”.

Já Succi comenta que a documentação no Brasil sobre a síndrome é falha por problemas de falta de registro adequado dos casos. Nos EUA estima-se haver cerca de 10.000 casos/ano. “Para se confirmar o diagnóstico é preciso descartar causas mais comuns de isquemia do coração, como o infarto por oclusão coronariana. Cada vez mais os médicos estão se familiarizando com este diagnóstico. A evolução geralmente é favorável, com recuperação completa da função cardíaca em cerca de seis a oito semanas”.

Sampaio admite que, infelizmente, a cardiologia é machista e as mulheres são as que recebem o pior tratamento.  “É necessário que seja feita uma campanha de utilidade pública voltada para a mulher, alertando-a a começar a fazer exames”.  Succi discorda: “Isto (o machismo) já foi verdade absoluta. Entretanto, cada vez mais as mulheres se aproximam dos homens na incidência de doenças cardiovasculares. Elas trabalham mais, fumam mais e têm mais estresse do que há 30 anos”.

Fora isso, Sampaio diz que pesquisas mostram que mulheres raramente fazem check-up. Em 70% dos casos, são os homens que fazem exames, mas porque as empresas onde atuam os obrigam. “As mulheres precisam se conscientizar de que fazer exames como eletrocardiograma é necessário e se tiverem pressão alta, o ideal é procurar ajuda”.

Características e prevenção

Sampaio diz que as características mais comuns de que se está tendo um infarto são, em 80% das vezes, dor no peito localizada, radiando para braços, pescoço, mandíbulas e até dentes. Além de tontura, falta de ar e desmaio.  “A dor no peito pode ter 27 causas, uma só é por causa do coração. Porém, se sentir uma dor forte, progressiva, que não melhora, vá ao pronto-socorro o mais rápido possível”.  

Como a síndrome surge após a pessoa passar por forte emoção, não há como preveni-la. Ninguém está livre. O cardiologista lista algumas situações que influenciam o surgimento deste mal: brigas, separações, estados coléricos, grandes catástrofes, guerra, terremoto, passar por uma situação polêmica, estresse, angústia, enfim, passar por uma emoção muito forte.

“Na verdade, é mais o efeito que a própria ação. A prevenção seria blindar o organismo de situações extremas, canalizando o estresse. Aconselho a mulher a ter hobbies, fazer atividades de lazer. Pode ser voluntariado ou aulas de dança, por exemplo”, finaliza Sampaio.

Succi completa: “As mulheres devem fazer visitas regulares ao médico, assumir hábitos saudáveis, controlar doenças crônicas, não fumar e beber com moderação. Isso sempre ajuda a proteger o coração contra qualquer tipo de agressão, induzida ou não por estresse”.