Topo

Família recebe canabidiol após enfrentar desconfiança e falta de dinheiro

Gustavo Maia

Do UOL, no Rio

11/09/2014 12h07

Os pais da capixaba Giovanna de Souza Guisso, 12, portadora da síndrome de Dravet --tipo raro de epilepsia de difícil controle--, receberam pela primeira vez, nesta quarta-feira (10), caixas de um medicamento à base de CBD (canabidiol), substância encontrada na planta da maconha (cannabis sativa). Eles esperam que o uso do produto diminua a ocorrência de crises convulsivas, a exemplo de outros pacientes que são tratados com o canabidiol no Brasil e no mundo.

O produto foi importado da empresa “Hempmeds”, de San Diego, na Califórnia (EUA), mediante autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), e foi retirado na alfândega do aeroporto de Viracopos, em Campinas, São Paulo. A família vive no município de Guarapari, no Espírito Santo.

O uso de um medicamento que contém um composto da maconha na filha de 12 anos inicialmente assustou a mãe de Giovanna, a dona de casa Patricia Guisso, 38. "O primeiro contato que eu tive com o CBD foi por meio do pediatra dela, que me falou sobre os relatos de resultados animadores. Confesso que no primeiro momento existiu um preconceito por ser derivado da maconha, uma droga ilícita", disse Patricia. Ela conta que, depois de pesquisar sobre o assunto, viu que o medicamento não daria "o barato que a maconha dá", por ter baixo teor de THC.

Para o pai da menina, o contabilista Geberson Guisso, 36,  "quando se menciona apenas a maconha, o tabu é realmente muito grande". "Mas não estamos comprando maconha, como a que o traficante vende. É apenas um componente da planta”, afirmou.

Giovanna sofre com crises convulsivas desde os dois meses de idade e, de acordo com a mãe, atualmente tem, em média, 25 convulsões por mês. Para tentar controlar as crises, ela toma cerca de dez comprimidos de quatro tipos de remédio diariamente. "Eles têm diversos efeitos colaterais, entre eles supressão das plaquetas, que aumentam o risco de hemorragias, problemas nefrológicos, e dependência", afirmou Patricia. A quantidade dos medicamentos importados, segundo ela, será suficiente para um período entre dois e três meses de tratamento.

A autorização para a importação do CBD foi concedida no dia 25 de agosto, um mês e meio depois de a família dar entrada na solicitação formal para a Anvisa, em 10 de julho. A agência informou que, até a última sexta-feira (5), havia autorizado 58 solicitações de importação de produtos à base do CBD, por meio de "pedido excepcional de importação para uso pessoal". Até o momento, a Anvisa recebeu 74 pedidos diretos e 13 por demandas judiciais. A maior parte deles se encontra sob análise, dois foram arquivados por morte do paciente e apenas uma foi indeferida.

Segundo a agência, o pedido de excepcionalidade é necessário porque medicamentos sem registro no país, como o CBD, não contam com dados de eficácia e segurança registrados na Anvisa. Neste caso, cabe ao profissional médico a responsabilidade pela indicação do produto, especialmente na definição da dose e formas de uso.

Além das questões burocráticas, os pais de Giovanna veem no preço do produto o maior entrave para o uso do CBD no tratamento da filha. "Cada caixa custa US$ 650 (cerca de R$ 1.490). Chorei bastante, pedi desconto, e consegui que as duas [caixas de remédio compradas] saíssem por US$ 950 dólares (cerca de R$ 2.175), já com taxa de envio", contou Patricia.

Segundo o pai da menina, o valor do produto não cabe no orçamento da família. "Nós não teríamos condições. Só conseguimos comprar com a ajuda dos nossos amigos, da nossa comunidade. Fizeram um evento para umas 700 pessoas para arrecadar dinheiro", disse Geberson.

Eles foram retirar as duas caixas de remédios pessoalmente para evitar a cobrança de tributos, que seriam de 100% sobre o valor do produto. Com os medicamentos, os pais de Giovanna reencontraram a filha na manhã desta quinta (11).