Alzheimer, diabetes, câncer: o que seu DNA já sabe sobre você?
Exames médicos costumam oferecer ao paciente um diagnóstico de uma doença que ele já desenvolveu. No entanto, testes de DNA também podem apontar a presença de genes modificados que irão determinar, em um futuro distante ou não, o surgimento de alguma doença —eventualmente, incurável, como o Alzheimer.
Algumas doenças hereditárias, como a hemofilia do tipo A, em que a pessoa apresenta um transtorno de coagulação, podem se manifestar desde a primeira infância. Outras, porém, se desenvolvem apenas na vida adulta.
O chamado teste preditivo de DNA aponta a presença de um gene que determina se alguma doença se desenvolverá.
Há um tipo de doença de Alzheimer, chamado de Alzheimer Familiar, que se enquadra no grupo de doenças que dependem de um gene para seu desenvolvimento —monogênica. A Doença de Huntington, condição em que as células nervosas do cérebro se rompem ao longo do tempo, também é monogênica, incurável e aparece por volta dos 40 anos.
Um dos tipos de câncer de mama tem no componente genético um fator altamente determinante. Quem não se lembra da cirurgia de retirada de seios, ovários e tubas uterinas realizada pela atriz norte-americana Angelina Jolie após um teste genético estimar em 87% o risco de ela desenvolver a doença?
Este alto risco explica-se pelo fato de sua mãe e sua tia terem morrido por causa da doença e ela possuir, como elas, um defeito no gene BRCA1.
Outras doenças, como por exemplo, diabetes e mal de Parkinson, também se desenvolvem na idade adulta e possuem um componente genético indutor. No entanto, o componente ambiental, ou seja, os hábitos do indivíduo, também são determinantes para o aparecimento delas ou não. Por isso, são chamadas de doenças complexas ou doenças multifatoriais.
Para Iscia Lopes Cendes, do laboratório de Genética Molecular da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), os testes de DNA que dão diagnóstico ou que fazem a previsão de novas doenças "não são diferentes do ponto de vista laboratorial".
De forma simples e pontual, a geneticista explica a diferença entre um e outro: "o teste vai ser preditivo se o indivíduo não tem nenhum sintoma e diagnostico se ele já tem algum sintoma".
Testes de DNA preditivos
São nas doenças multifatoriais e monogênicas, sobretudo nestas últimas, que os testes de DNA podem ter uma característica preditiva, ou seja, podem indicar o aparecimento futuro de alguma doença.
No caso das doenças multifatoriais, ou complexas, são vários genes, além do fator ambiental, que determinarão se uma doença se desenvolverá ou não, no indivíduo.
"Para doenças complexas, o que a gente herda dos nossos pais não é a doença. Se seus pais tiverem Alzheimer ou doenças cardiovasculares, não é a doença propriamente dita que você herda. Herdamos a pré-disposição genética", diz Síntia Belangero, professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Depende da quantidade de fatores genéticos que você herdou e isso ao longo de sua vida vai ser somado a exposições do ambiente."
Ela faz uma analogia com um copo de água para explicar o desenvolvimento de doenças genéticas complexas, como diabetes, câncer, hipertensão, infarto do miocárdio e Parkinson -ou mesmo a maior propensão para a obesidade.
Genética alerta para cuidado maior
"Quando você nasce é como se você fosse um copo de água. Esta quantidade de água no copo é a quantidade de fatores de risco de doenças complexas que herdamos. Aí vamos colocando objetos, tipo dados, que são os fatores ambientais, dentro deste copo. Uma hora, a água vai transbordar: é a doença que se manifesta", compara.
Agora, se eu já nasço com o copo cheio, o que vou fazer? Evitar colocar dados dentro do copo. Pode ser que mesmo cheio, mas por não ter colocado nada dentro, ele não vai transbordar, mesmo tendo nascido com o copo quase cheio."
Cendes afirma, contudo, que a realização de testes preditivos para doenças complexas, só é recomendada quando há antecedentes familiares ou casos em que o médico identifica um risco maior de desenvolvimento de alguma doença.
"O caso da Angelina Jolie é um bom exemplo. Ela tinha parentes próximas que tiveram câncer em idades precoces. Isto justificava a realização de um teste preditivo" afirma Cendes.
O sequenciamento de genes ainda não é um exame barato. No Centro de Genoma Humano, da USP, o teste custa R$ 8.490.
Há testes para doenças específicas a preços mais baixos. O exame que traça um sequenciamento dos genes que podem predizer o aparecimento de algum tipo de câncer, por exemplo, custa R$ 1.390 no mesmo centro.
Doenças monogênicas: aí é que mora o perigo
São nas chamadas doenças monogênicas, no entanto, que as alterações genéticas são determinantes para o desenvolvimento futuro de uma doença. É aí que a informação contida em um teste preditivo pode ser um "karma" —uma doença incurável— que o indivíduo levará para o resto da vida.
Cendes cita a Doença de Alzheimer Familiar —que se desenvolve mais cedo do que as outras variantes da doença, consideradas multifatoriais—como um exemplo típico de doença monogênica incurável.
"Se você fizer o teste e aparecer o gene modificado referente a este tipo específico de Alzheimer, você certamente terá esta doença, que é incurável", diz Cendes.
Em outros casos de Alzheimer, "exercícios mentais", como a prática de palavras cruzadas, sudoku e testes cognitivos, segundo Belangero, podem "proteger o indivíduo do ponto de vista comportamental", já que "o genético já está comprometido".
Cendes afirma que, nestes casos, a questão emocional e psicológica do paciente é altamente impactada e cabe ao médico "fazer com que o paciente tome uma decisão equilibrada que seja melhor para ele".
"A decisão de fazer ou não o teste é extremamente pessoal. Uma decisão que não seja pressionada, não seja intempestiva", diz Cendes. Ela afirma, contudo, que, mesmo que a pessoa saiba que um dia uma doença incurável a acometerá, ela não deve abrir mão da busca por uma vida saudável.
"Ter uma vida saudável é bom para todo mundo. Ainda que não exista nada que possa retardar o aparecimento da doença, se você não fumar, fizer exercícios físicos e ter uma boa alimentação, certamente vai viver melhor".
Medicina personalizada
É por meio do mapeamento genético do indivíduo que, atualmente, é possível realizar um tipo de tratamento que foca exclusivamente nas células doentes. É a chamada 'medicina personalizada'.
Comum na Europa e nos Estados Unidos, mas ainda engatinhando no Brasil, esse tipo de tratamento tem ganhado cada vez mais espaço nas áreas da oncologia (câncer) e cardiologia.
O fato de você olhar para o perfil genético e definir qual será o melhor tratamento é uma tendência muito forte e cada vez mais presente", diz Jeane Tsutsui, diretora executiva médica, técnica e de pesquisa e desenvolvimento do grupo Fleury Medicina e Saúde.
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