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Secretários pressionam e ouvem de Teich promessas que contrariam Bolsonaro

Ministro da Saúde, Nelson Teich Imagem: Ueslei Marcelino

Luís Adorno e Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

07/05/2020 01h30

Resumo da notícia

  • Teich conversou pela 1ª vez com os 27 secretários de saúde sobre a covid-19
  • Em reunião na terça, eles cobraram agilidade no envio de ajuda
  • Eles conseguiram de Teich o compromisso de que o governo defenderá o isolamento
  • O Ministério da Saúde bancaria uma campanha publicitária pelo isolamento
  • A medida contraria o presidente Jair Bolsonaro, contrário à quarentena

Demorou 18 dias desde a posse para que o ministro da Saúde, Nelson Teich, reunisse todos os 27 secretários estaduais do setor para tratar da pandemia de covid-19. Em reunião na terça-feira (5) por videoconferência, os secretários colocaram o ministro contra a parede: reclamaram da demora na tomada de decisões e arrancaram de Teich compromissos que contrariam o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Desde 17 de abril, quando o novo ministro tomou posse, os secretários reclamavam da falta de interlocução com o governo. Quando Luiz Henrique Mandetta (DEM) esteve à frente do ministério, eles afirmam, as conversas eram diárias. Com o substituto, o primeiro contato só aconteceu na semana passada, quando Teich reuniu os secretários de cada região do Brasil em cinco teleconferências.

Na reunião da última terça, Teich precisou lidar pela primeira vez com os 27 secretários, que não pouparam cobranças: os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) chegam em quantidade muito pequena a estados e municípios; o ministério habilita poucos leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva); a oferta de testes é pequena, e o governo federal não ajuda no financiamento dos hospitais de campanha.

Na ocasião, o ministro informou que encomendou de empresas nacionais 14.100 respiradores, com entrega de 200 unidades por semana. A informação frustrou os secretários: eles só receberiam todos os aparelhos em 2021.

Compromisso contraria Bolsonaro

Mas o principal pedido feito ao ministro deve incomodar o presidente Bolsonaro. Para os secretários, o governo federal precisa declarar-se explicitamente a favor do isolamento social, cuja defesa resultou na demissão de Mandetta.

Para os secretários, é "impossível" que estados e municípios mantenham uma recomendação diferente da do governo federal. Eles, então, arrancaram de Teich a promessa de que o Ministério da Saúde produzirá uma peça publicitária recomendando o isolamento em todo o Brasil. As peças devem ser regionais para se adaptar às necessidades de cada estado.

"Teich afirmou que essa solicitação dos secretários será atendida", informou em nota o Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) a pedido do UOL. "Não foi realizada até o momento uma campanha publicitária de alcance nacional com informações sobre a pandemia", diz o informe, que invoca "a necessidade de um discurso único".

Ontem à noite, não se sabe se por coincidência, Teich mencionou pela primeira vez a possibilidade de recomendar lockdown pontualmente nas regiões mais afetadas pela covid-19.

Outro compromisso assumido pelo ministro também contraria a vontade do presidente. Embora Bolsonaro prefira que as decisões federais partam exclusivamente do Ministério da Saúde, Teich se comprometeu a conversar diariamente com o Conass e o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais), assegurando o caráter tripartite das decisões em relação à pandemia.

Secretarias blindam Teich

Apesar do clima de cobrança durante a reunião, oficialmente a maioria dos secretários, dependentes da ajuda federal, evitam o confronto público com o ministro

Na segunda-feira (4), o secretário de Saúde de Mato Grosso, Gilberto Gomes de Figueiredo, disse que Teich "ainda está se inteirando sobre o assunto no Brasil; ainda não tem conhecimento total das necessidades e iniciativas em curso". Ele se referia à impressão que teve do ministro após o encontro de quinta-feira (30) com os colegas do Centro-Oeste.

Foi uma reunião com baixíssima resolutividade. Mas a mensagem do ministro é que ele esta com predisposição de ajudar os municípios e estados.

Procuradas pelo UOL, a maioria das secretarias estaduais de Saúde preferiu não se manifestar oficialmente sobre o desempenho do ministro ou evitou críticas. Rondônia afirmou que "ainda não dá para avaliar o novo ministro, que tem sido solícito".

O governo do Amazonas elogiou o governo. "Como resultado dessas articulações constantes, o Amazonas já recebeu auxílios, como o envio de respiradores, EPIs e profissionais para atuar nas unidades de saúde do estado."

Minas informou que Teich "está motivado e desejoso por fazer um bom serviço" e que "não houve nenhuma mudança" em relação a Mandetta.

A secretaria de Saúde do Distrito Federal não separou a relação entre o atual e o antigo ministro. A pasta afirmou que o ministério encaminhou 48 mil testes e que aguardavam nova remessa. "O órgão realizou o credenciamento de 80 leitos de UTI para o Distrito Federal em auxílio ao combate à covid-19."

A secretaria de Alagoas informou que "a relação tem sido atenciosa, mas a secretaria ainda aguarda os respiradores prometidos pelo governo federal no começo do mês de abril".

Já alguns governadores decidiram se manifestar. Rui Costa (PT), da Bahia, diz ter saído frustrado de uma reunião na semana passada. Mesmo assim, a secretaria de Saúde baiana preferiu não falar com a reportagem sobre a relação entre a pasta e o ministério.

O mesmo aconteceu no Rio Grande do Norte. Procurada, a secretaria não informou oficialmente como está o contato com o governo federal. No entanto, a governadora Fátima Bezerra (PT) disse que conversou com o ministro e que ele ofereceu ajuda, pedindo um relatório do que havia sido prometido anteriormente.

Em São Paulo, o governador João Doria (PSDB), que tem debatido publicamente com o presidente desde o início da pandemia, elogiou a postura de Teich ir até Manaus, onde há um colapso na saúde, e pela "decisão acertada" de não afastar o isolamento social.

Não responderam aos pedidos de posicionamentos os estados de Acre, Roraima, Amapá, Ceará, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Pará, Piauí, Tocantins, Pernambuco, Maranhão, Sergipe, Goiás, Espirito Santo e Santa Catarina.

Procurado, Teich disse ao UOL que tem se reunido com os governadores das diferentes regiões do país por videoconferência para avaliar a situação em cada localidade. "Os temas debatidos são a situação de casos, internações, testes e recursos para o enfrentamento da covid-19. As ações serão adotadas conforme a necessidade individual em cada estado", afirmou.

Ao UOL, o ministério informou por meio de nota que "nestas duas últimas semanas" o ministro Nelson Teich conduziu reuniões com governadores e representantes das secretarias de saúde estaduais e municipais e que repassou R$ 5,3 bilhões "só para que os estados e municípios estruturassem os seus próprios planos de contingência".

Sobre a compra de EPI, a pasta afirma que "é de responsabilidade dos estados e municípios" e que, devido à escassez mundial do produto, o ministério comprou 240 milhões de máscaras. "Outros 79,2 milhões de itens já foram entregues. Com a gradativa normalização dos mercados, a expectativa é que os gestores locais consigam novamente abastecer seus estoques com recursos que já são repassados pelo governo federal, além dos próprios."

A respeito da oferta de respiradores, também em falta, "a compra é de responsabilidade dos estados e municípios, mas para fazer frente a essa necessidade, o governo federal organizou mais de 15 empresas para ampliar a nacional dos equipamentos". "O contrato é firmado com quatro fornecedores, que devem entregar 14.100 respiradores, sendo 487 já distribuídos. A disponibilidade, no entanto, depende de importação de peças."

O ministério diz ainda que "em menos de 30 dias foram habilitados 3.236 leitos de UTI voltados exclusivamente para o combate ao coronavírus em 23 estados, além do DF, totalizando um repasse de R$ 450 milhões para a manutenção destes leitos".

"Foi lançado o programa Diagnosticar para Cuidar. A estratégia nacional de vigilância epidemiológica e laboratorial para a COVID-19 visa a realização de 46 milhões de testes neste ano, o que representa cerca de 22% da população brasileira."

O Ministério da Saúde também cita "uma série de ações de contato com a população", como campanha publicitária o site da pasta, central telefônica do 136, ligações para as pessoas, ações nas redes sociais. "Abriu um canal para o combate de fakenews, entre outras ações de comunicação. Todas buscam esclarecimento sobre a doença e recomendações aos brasileiros. Ainda conforme coletiva desta quarta-feira, o compromisso com os secretários estaduais foi a criação de novos peças publicitárias que atenderão aos diversos cenários do coronavírus por localidade."

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