Dengue em SP: prefeitura contrata máquina de fumacê avariada, dizem agentes
Agentes de combate a dengue afirmam que a Prefeitura de São Paulo contratou 30 máquinas de fumacê velhas e desreguladas, sendo que algumas estão inoperantes. Ao UOL, a gestão de Ricardo Nunes (MDB) afirma que os equipamentos estão funcionando e negou que há "problemas na execução do serviço".
O que aconteceu
A contratação foi feita de forma emergencial para o prazo de um ano por R$ 58 milhões. A gestão afirma que o valor é o máximo reservado para a ação — ou seja, não necessariamente será a quantia gasta pela prefeitura. "Caso não aconteça o serviço de nebulização por possíveis danos ao equipamento, não será pago e o valor terá variação", diz.
O contrato da prefeitura inclui o serviço dos motoristas e as caminhonetes que levam as máquinas. Já o veneno usado nos equipamentos é oferecido pela administração municipal.
As máquinas apresentam sinais de desgaste, com partes enferrujadas, por exemplo, segundo os agentes. Os equipamentos, fornecidos pela empresa BioVetor, foram anunciados em 13 de março pelo prefeito e chegaram no dia seguinte nas UVIS (unidades de vigilância em saúde).
Em uma unidade da zona leste, a máquina ficou três dias sem funcionar. Um agente disse à reportagem que o equipamento não ligou e foi preciso cancelar o serviço de nebulização nos primeiros dias.
Agora, segundo esse agente, o instrumento funciona, mas não da maneira correta. Em vez de gastar cerca de dois litros de veneno em um raio de 5 km, a máquina tem liberado oito e às vezes até 12 litros da substância.
O UOL teve acesso a um vídeo em que um funcionário tenta usar a máquina, mas ela não liga. A pessoa grava as imagens enquanto mostra outras partes do equipamento que, segundo o agente, estão em condições de desgaste. "O eixo todo enferrujado, mas o motor não, ele é zerinho. A carcaça tá toda pintada por cima de corrosão também", diz.
Em unidades da zona sul e oeste, a situação foi a mesma. O equipamento ficou sem funcionar e depois retomou com algumas falhas. A cidade de São Paulo decretou estado de emergência na segunda-feira (18) após registrar epidemia por dengue.
O modelo da máquina é bom, mas o equipamento da empresa contratada não é novo, de acordo com a avaliação dos agentes. "Não dá para saber quanto tempo vai levar para quebrar de novo", disse um outro agente da zona leste.
"Um processo de licitação para um contrato de cinco anos está em andamento", informou a prefeitura. A escolha pela empresa BioVetor, segundo justificativa da Secretaria de Saúde nos documentos internos, era de que a instituição oferecia o menor valor e também começaria o serviço mais rápido.
A reportagem entrou em contato com a BioVetor, mas não teve retorno.
Ações de combate a dengue
Os agentes ouvidos pela reportagem afirmam que a prefeitura deveria focar em outras ações de combate a dengue e não investir nas máquinas de fumacê. Eles citam como exemplo o trabalho de bloqueio nas casas em que há infectados pelo Aedes aegypti, no qual é feita uma busca por possíveis criadouros do mosquito para evitar uma maior proliferação do mosquito.
A cidade conta também com máquinas de nebulização costais, mas que segundo os agentes, não têm sido usadas. Esses equipamentos (que ficam presos aos ombros como mochilas) são usados para chegar em áreas como vielas e também dentro das casas — o fumacê veicular alcança uma distância de no máximo 200 metros.
Segundo a prefeitura, tanto a nebulização veicular quanto a costal são usadas nas ações da cidade todos os dias. Os agentes rebatem essa informação e dizem que não há efetivo suficiente para isso.
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Quero receberPara especialistas consultados pelo UOL, a ação é bem-vinda, mas não deveria ser a prioridade neste momento de epidemia. Uma das recomendações, por exemplo, é oferecer tampas para caixas d'água, vistorias nas residências, além das orientações educativas.
"Um local frequente para criadouro é na água depositada nos ralos de jardins e terraços das casos. É necessário inspecionar toda a área", afirma o professor de epidemiologia Expedito Luna. Ele também cita a importância de se inspirar em casos como o de Niterói, que reduziu os casos por meio de uma bactéria que bloqueou a transmissão de doenças para novos mosquitos Aedes aegypti.
O que dizem os especialistas
Essa ação de inseticida no ambiente é uma intervenção pouca eficaz, porque ela vai matar os insetos adultos que estão ali naquele momento. Mas os insetos que estão crescendo nas águas paradas vão eclodir amanhã.
Expedito Luna, professor de epidemiologia na Faculdade de Medicina da USP
A denúncia ou dúvida precisa ser averiguada. O órgão responsável pelo contrato precisa fiscalizar se o serviço tem sido executado. Mas não podemos deixar de levar em conta que estamos vivendo uma epidemia e situações como essas podem acontecer.
Alvaro Martim, professor na Unesp e especialista em administração pública
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