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Viagem de Bachelet foi 'usada' pela China para esconder abusos contra minorias, segundo organizações

27/05/2022 11h30

Pequim, 27 Mai 2022 (AFP) - A máquina de propaganda da China "usou" a visita da alta comissária da ONU, Michelle Bachelet, estimaram organizações e ativistas nesta sexta-feira (27), considerando que a viagem serviu para encobrir os abusos cometidos por Pequim contra as minorias na região de Xinjiang.

Está "muito claro" que a China usou sua visita para "empurrar sua própria narrativa e defender seu histórico ruim em direitos humanos", disse Alkan Akad, da Anistia Internacional na China.

O objetivo era "mostrar ao mundo que a China pode submeter um alto funcionário dos direitos humanos à sua vontade", disse Maya Wang, pesquisadora da Human Rights Watch para a China.

A viagem há muito planejada de Bachelet a levou ao remoto oeste do país, Xinjiang, onde Pequim é acusada de manter um milhão de uigures e outras minorias muçulmanas em centros de detenção, esterilizar mulheres e forçar esses cidadãos a realizar trabalhos forçados.

Os Estados Unidos e parlamentos de outros países ocidentais denunciaram um "genocídio", acusações negadas com veemência pela China, que garante que sejam centros de formação profissional para manter a população afastada do separatismo e do islamismo radical.

- "Vitrine" -Bachelet chegou à China acompanhada de perto por grupos de direitos humanos, que consideraram que sua viagem faria parte de uma elaborada coreografia do Partido Comunista, que incluía uma conversa com o presidente Xi Jinping, posteriormente veiculada na mídia pública como apoio à ideia chinesa dos direitos humanos.

Bachelet dará uma entrevista coletiva no sábado, ao final de sua viagem, na qual certamente será questionada sobre o acesso que teve aos uigures e aos centros de detenção em Xinjiang, naquela que será sua última chance durante sua estadia na China para mencionar alegações de abuso.

A ativista uigure Rahima Mahmut, que mora em Londres, chamou a visita de "vitrine".

"Não é a investigação neutra, independente e irrestrita que nos foi prometida", disse ela à AFP.

Pelo contrário, Pequim queria obter "carta branca para continuar exercendo repressão, vigilância, tortura e genocídio contra comunidades como a minha", acrescentou.

A visita de Bachelet a Xinjiang acontece por enquanto em meio a uma total discrição. As autoridades chinesas, escondidas atrás do surto de coronavírus no país, criaram uma bolha sanitária que mantém a alta comissária afastada da imprensa estrangeira. Tampouco foram dados detalhes precisos sobre quais lugares e instalações Bachelet pôde visitar.

- "Propaganda" -A responsável está em Xinjiang desde terça-feira e seus colaboradores afirmaram que ela vai visitar as cidades de Urumqi, capital regional, e Kashgar.

A mídia estatal divulgou informações vazias e elogiou as reuniões positivas com Xi e o ministro das Relações Exteriores, Wang Yi.

Especificamente, afirmou que Bachelet "admirou os esforços e conquistas chinesas no campo dos direitos humanos" durante seu encontro, por videoconferência, com Xi.

Um porta-voz de Bachelet não confirmou a veracidade dessas alegações à AFP e, posteriormente, houve uma negação vaga e confusa da ONU sobre esses relatórios publicados pela mídia chinesa.

O ativista uigure Abduweli Ayup, que mora na Noruega, disse estar "desapontado" por Bachelet ter permitido que Pequim "interpretasse mal" suas palavras.

"Eles a usaram para sua propaganda", disse ele à AFP.

Embora ainda não se saiba o que Bachelet viu em Xinjiang, foram divulgadas imagens dela com um livro de comentários de Xi sobre direitos humanos durante sua visita a esta região.

A China rejeita qualquer crítica às suas políticas nesta região e descreve as tentativas de se intrometer na realidade de Xinjiang como interferência.

O governo chinês negou que a viagem de Bachelet seja uma investigação, chamando-a de uma oportunidade para "esclarecer informações erradas".

É a primeira viagem à China de um alto funcionário de direitos humanos da ONU em 17 anos e é o resultado de duras negociações sobre os limites desta visita.

É "ilusório" pensar que a China não usaria esta visita para "apresentar sua própria versão dos eventos", disse Steve Tsang, diretor do Instituto SOAS China.

Bachelet "precisa ter coragem política e integridade para falar porque suas palavras e sua visita estão sendo distorcidas", disse ele. "Se ela não está pronta ou capaz de fazê-lo, então ela não deveria ter vindo", acrescentou.

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