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Academia Francesa, uma instituição de 'imortais' que zelam pelo idioma

09/02/2023 14h43

A Academia Francesa, na qual o escritor hispano-peruano Mario Vargas Llosa ingressou nesta quinta-feira (9), é uma instituição fundada no século XVII para zelar pelo bom uso da língua, embora a autoridade dos "imortais" que a integram tenha diminuído desde então.

- De Luís XIII ao Palácio do Eliseu -

A Academia Francesa foi fundada em 1635 pelo cardeal Richelieu, principal ministro de Luís XIII, proclamado "chefe e protetor" da instituição. Na França republicana, esta função recai no chefe de Estado.

Sua missão: "estabelecer regras claras à nossa língua e fazer com que seja pura, eloquente e capaz de tratar das artes e das ciências". 

A língua encerra uma dimensão política. A Academia redige um dicionário e regras ortográficas. 

O idioma que defende não é a dos "especialistas, eruditos, das corporações", mas se situa entre "o uso e a norma".

Influenciada pelo Iluminismo, movimento intelectual e filosófico que surge no século XVIII, desempenha um papel importante com três dicionários. A ortografia de 30% das palavras muda e aparecem os acentos.

Em 1990, cede em algumas questões, como o afrancesamento de algumas palavras estrangeiras. Mas se mantém refratária aos anglicismos, ou à escrita inclusiva, por considerá-los "um perigo".

- Os imortais -

Hoje, dos 40 membros estatutários da Academia, apenas 35 são "imortais". Seu título se inspira no lema da instituição, "À l'immortalité" (À imortalidade), que remete à sua missão de preservar a língua.

Eleitos por maioria absoluta, os acadêmicos são cientistas, sacerdotes, escritores, historiadores, ou políticos. Entre os mais ilustres estão Montesquieu (1727), Marivaux (1742), Voltaire (1746), Chateaubriand (1811), Victor Hugo (1841, após quatro candidaturas) e Louis Pasteur (1881).

Émile Zola foi rejeitado 25 vezes. E o marechal Pétain, eleito por unanimidade em 1929, foi excluído em 1945, após ter chefiado o regime de Vichy, de colaboração com a Alemanha nazista.

A única regra desde 2010 é ter menos de 75 anos para se candidatar. Isso não impediu que Mario Vargas Llosa fosse eleito em 2021, apesar de seus 85 anos.

O autor de "Conversa na Catedral" também o primeiro membro admitido na Academia sem nunca ter escrito em francês. Em 1995, a candidatura do espanhol Jorge Semprún, escritor e ex-ministro da Cultura em seu país, foi rejeitada, apesar de seus escritos na língua de Molière. 

Vários estrangeiros passaram pela Academia: o americano Julien Green (1972), o canadense de origem haitiana Dany Laferrière (2015), ou escritores como o cubano-francês José María de Heredia (1970), o romeno-francês Eugène Ionesco (1970) e o argentino Héctor Bianciotti (1996).

Atualmente, têm assentos o romancista de origem russa Andrei Makine (2016), o poeta franco-britânico Michael Edwards (2013) e o escritor francês de origem chinesa François Cheng (2002).

- O dicionário -

Em quatro séculos, a instituição produziu oito dicionários. O primeiro data de 1694, e o último, de 1930.

Desde 1986, a Academia publica progressivamente sua 9ª edição.

Após séculos de oposição, a instituição aceitou, em 2019, feminizar os nomes de alguns ofícios.

- A espada e o terno escuro - 

Em sua posse, todos os acadêmicos recebem uma espada e um terno de tecido azul-escuro, ou preto, bordado com ramos de oliveira nas cores verde e dourada, confeccionado por um grande estilista ? de Lanvin a Cardin ?, ou pelo alfaiate do Exército.

Este, mais barato, custa 50.000 euros (US$ 54.000) o terno ? uma conta paga por um comitê criado expressamente para este fim.

A espada, que antigamente representava o pertencimento à Casa do Rei, agora é personalizada.

- Mulheres "imortais" -  

Em 1980, a escritora Marguerite Yourcenar se tornou a primeira mulher eleita acadêmica. Mas foi difícil chegar lá.

Em 1760, um acadêmico propôs, em vão, reservar quatro assentos às mulheres.

A primeira candidata foi a jornalista Pauline Savari, em 1893. "As mulheres não são elegíveis, porque só se é cidadão francês quando se cumpre o recrutamento" militar, responderam-lhe.

Em 1910, a candidatura de Marie Curie foi rejeitada para não estabelecer um precedente.

No total, dez mulheres entraram na instituição. Atualmente, a Academia conta com seis.

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© Agence France-Presse