Governos europeus querem relançar contatos com Brasil depois de impeachment
"O mundo não se pode dar ao luxo de ter mais uma crise e muito menos num país do tamanho do Brasil", alertou um negociador de alto escalão da ONU e próximo às principais potências do Conselho de Segurança. Pedindo anonimato por conta de sua posição delicada de mediar conflitos, ele deixou claro à reportagem que, nos últimos meses, o "mundo prendeu a respiração" diante da crise brasileira.
Oficialmente, a ordem em diversas capitais é a de insistir que a decisão de impeachment no Brasil é um processo "interno" e que não cabe um julgamento. Nos bastidores, no entanto, diplomatas de governos como o da Alemanha, Espanha, Itália e Reino Unido indicaram à reportagem que apenas estavam aguardando o fim do processo de impeachment para retomar programas de cooperação e preparar o envio de ministros e alto escalão para visitas oficiais.
O Itamaraty confirmou à reportagem que também já havia sido comunicado informalmente por diversos governos europeus de que essa retomada de viagens iria ocorrer a partir de setembro.
Um dos projetos mais aguardados na Europa ainda é o de concluir o acordo entre Mercosul e UE. Segundo fontes em Bruxelas, a UE já demonstrou que vai seguir adiante com o projeto, inclusive por conta da troca de ofertas de liberalização entre as duas partes, mesmo durante o governo interino de Michel Temer.
A volta de uma relação com o Brasil não significa, porém, que houve uma aprovação do que ocorreu no País. Para diplomatas estrangeiros, a crise ainda enfraqueceu o poder de barganha do Brasil em negociações e retirou parte do peso que, nos últimos 15 anos, havia conseguido obter.
"Houve um momento em que não se fazia nada no comércio, meio ambiente e até em assuntos de paz sem consultar o Brasil. Hoje, esse não deve ser mais o caso", admitiu um negociador em Genebra.
Para governos estrangeiros, a fragilidade do novo cenário brasileiro também significa que capitais estrangeiras poderão tentar impor novas condições para as relações bilaterais. A avaliação é de que, ávidos por um reconhecimento e por demonstrar a normalização da situação política, Brasília pode acabar sendo mais flexível em aceitar certos acordos.
Pragmatismo. Apesar da crise econômica no País, os investimentos europeus no Brasil são considerados como de "longo prazo" e estratégicos para diversos setores. "O que precisamos ter é pragmatismo com o Brasil", admitiu um dos negociadores, que lembrou que o País não perderá o caráter de "parceiro estratégico" da UE. "Existem empresas apenas esperando uma definição política no Brasil para avaliar novos projetos", admitiu a fonte.
Uma pesquisa ainda realizada pela Amcham - a Câmara Americana de Comércio - também aponta para a mesma direção. 48% dos diretores e gestores financeiros ouvidos pela entidade indicaram que o processo de impeachment que retardou investimentos e decisões estratégicas em empresas no País.
Na ONU, apesar de protestos iniciais de diversos governos diante do afastamento de Dilma Rousseff, a reportagem apurou que os últimos meses foi de "normalização" da relação com o governo brasileiro. Mesmo em reuniões presididas pela Venezuela na entidade com sede em Genebra, nenhuma queixa formal foi levantada ou assédios foram realizados contra os diplomatas brasileiros.
Nos últimos meses, a diplomacia do chanceler José Serra insistiu em reuniões bilaterais e multilaterais que o processo havia caminhado dentro da Constituição brasileira e que todas as etapas haviam sido respeitadas.
Nos próximos dias, a ONU deve fazer um apelo para que o "diálogo" seja respeitado entre os diversos partidos para que a situação econômica e social seja lidada.
Pela Europa, porém, políticos ligados ao PT, CUT e grupos acadêmicos irão manter a pressão contra o governo Temer. Já na semana que vem, alguns desses eventos já poderão ocorrer em locais como Zurique, Berlim ou Paris.
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