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Policial que chamou Pezão de 'incompetente' denuncia possível retaliação

Roberta Pennafort

Rio de Janeiro

28/02/2018 18h48

Depois de dar uma entrevista ao jornal O Globo na qual chamou o governador Luiz Fernando Pezão (MDB) de "incompetente" para resolver a crise da segurança no Rio, a cabo da Polícia Militar Flávia Louzada denuncia possível retaliação. Ela afirma que foi chamada ao Quartel-General da corporação para responder pelo que dissera, acabou retida e encaminhada imediatamente à Corregedoria da PM, ainda que dispusesse de cinco dias para apresentar sua defesa.

Grávida de cinco meses de gêmeos, a policial, que tem 37 anos e mais de dez de PM, acabou passando mal, e agora está internada no Hospital da corporação. "Tenho certeza que foi retaliação", afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo nesta quarta-feira, 28, referindo-se ao Documento de Razões de Defesa (DRD), que diz que a imputação contra ela é: "Concedeu entrevista pronunciando-se de forma desrespeitosa sobre autoridade civil, o governador do Estado, censurando-o e procurando desconsiderá-lo".

De licença-médica, a cabo recebeu uma mensagem na segunda-feira, quando da publicação da entrevista, pedindo que fosse ao QG da PM buscar o DRD. Na terça, ela compareceu, dirigindo-se à sua unidade, a Coordenadoria de Comunicação Social. À revelia, narrou, foi conduzida então à Corregedoria. Ao começar a passar mal, foi ignorada, disse a policial. "Cheguei às 13 horas, pensando que só ia assinar e ir embora, porém fiquei lá. Às 18 horas, me conduziram contra a minha vontade para a Corregedoria", relatou à reportagem.

"Meu marido foi junto, falando que eu estava sem comer desde as 13 horas, que eles deveriam marcar outro dia. Ignoraram tudo, minha gravidez de risco, minha pressão alta. Reclamei que estava passando mal. Eles alegaram que o corregedor estava em reunião. Não deixavam eu ir embora. Quando meu marido entrou na sala, eu estava no chão, convulsionando. Foi chamada uma ambulância da PM para me tirar de maca de dentro da corregedoria", ela relatou.

O advogado da cabo, Sergio Rodrigues, disse que a situação de sua cliente se complicou porque na foto que acompanha a entrevista - na qual disse que "jamais votaria" em Pezão e que apoia a intervenção federal na segurança porque a PM não "dá mais conta" da situação - ela aparece com a farda da corporação."Ela não poderia ter dado entrevista fardada, e sem a autorização do seu comandante", afirmou Rodrigues.

"Se houve transgressão disciplinar, isso não justifica ter sido levada arbitrariamente à Corregedoria e ser mantida lá por tanto tempo, ainda mais uma gestante de risco. Temos plena consciência de que isso aconteceu por causa das declarações. Não sabemos se a retaliação foi do comando geral da PM ou do próprio Pezão", criticou.

Em agosto do ano passado, quando se confirmou a 100ª morte de policial no Estado, Flávia deu entrevista ao Estado, também publicada junto a uma foto em que estava fardada. Na ocasião, não sofreu reprimenda por parte da PM. Ao Estado, ela disse, sobre a vulnerabilidade da tropa: "Parece que a gente está numa fila esperando nossa vez (de morrer). Sai de casa como se fosse a última vez." Há dez anos na PM, ela criou há seis o movimento intitulado "A Vida do Policial é Sagrada como Toda Vida É", que auxilia famílias dos mortos e feridos em serviço.

A PM divulgou a seguinte nota sobre o caso:

"A Assessoria de Imprensa da Polícia Militar esclarece que a Cabo PM Flávia Alves Pedra Louzada foi convocada a comparecer a sua unidade, a Coordenadoria de Comunicação Social (CComSoc), para regularizar pendências administrativas: a entrega de sua arma particular para ser acautelada na reserva de armamento do Quartel-General pelo fato da mesma estar de Licença Temporária de Saúde (LTS) pela psiquiatria, e informar a sua mudança de endereço, já que não foi encontrada no endereço cadastrado na Corporação.

Na mesma oportunidade, recebeu os Documentos de Razão de Defesa (DRD) por conta de possíveis transgressões previstas no Regulamento Disciplinar da Polícia Militar (RDPM), que rege a vida que qualquer policial militar, seja oficial ou praça.

Vale ressaltar que em nenhum momento a mesma ficou confinada na CComSoc. Pelo contrário, teve acesso irrestrito a todas as dependências da Unidade, tendo inclusive participado de um evento de confraternização para comemorar o aniversário de um dos colegas.

Ao deixar a CComSoc, a Cabo Louzada foi convocada para ser ouvida pela Corregedoria. Seis minutos após o início do depoimento, a Cabo sentiu-se mal, recebeu os primeiros socorros e foi levada para o Hospital Central da Polícia Militar (HCPM), onde permanece em observação."