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Solução para problema fiscal do país é o crescimento econômico, diz economista do PT

Márcio Neves 17.abr.12/Folha
Imagem: Márcio Neves 17.abr.12/Folha

Renata Agostini e Luciana Dyniewicz

São Paulo

29/04/2018 17h05

Um dos formuladores do programa de governo que o PT prepara para apresentar na corrida presidencial, o economista Marcio Pochmann defende um plano de emergência para dar impulso à economia, que inclua medidas de estímulo ao consumo, ao crédito e aos investimentos. "A questão fiscal se resolve com crescimento", disse. Segundo ele, a ênfase recente dada à reforma da Previdência e às privatizações é equivocada. "Isso é problema para economista cabeça de planilha", afirmou.

Pochmann disse que parte das reservas internacionais pode ser usada para financiar investimentos e que o BNDES precisa atuar no crédito de longo prazo e no auxílio à criação de grandes empresas brasileiras transnacionais. Ele afirmou que o PT tem até agosto para decidir sobre seu candidato e projetou uma eleição marcada por extremos. "O centro democrático se fragmentou."

O PT entrará na eleição alvo de críticas por ter levado o País à recessão. Como responderá?
A eleição não é debate sobre o passado. Temos de olhar para a frente. Os governos anteriores e posteriores à experiência do PT desorganizaram as finanças públicas. Se formos falar de passado, vamos olhar: Fernando Henrique assume o governo com dívida pública líquida em 30% do PIB e entrega com quase 59%. Dilma Rousseff entrega em 39%. Ela aumentou 3% em relação ao que pegou em 2010. Estamos em 52%. A situação é dramática.

O que nos fez chegar aqui?
Primeiro, a opção pela recessão, com a destruição de parte do setor produtivo, redução do emprego e da arrecadação.

Opção de quem?
Opção que começou ainda no governo Dilma com a política econômica conduzida por Joaquim Levy, identificado com essa perspectiva hoje dominante no Brasil, que é a neoliberal. Outros fatores (que explicam a situação atual) são a Lava Jato, que asfixiou as empresas, e as políticas neoliberais do governo Temer. É uma visão equivocada a de que Estado é problema e solução é o privado. Não se enfrenta problema fiscal com recessão.

Um governo do PT seria mais próximo ao primeiro mandato de Lula ou ao primeiro de Dilma?
Lula estimulou a economia pela demanda. Dilma, pela oferta. Quando ficou difícil manter a economia, vieram ações para que não se optasse pela recessão. Até 2014, a economia desacelera, mas problemas sociais não aparecem. A questão fiscal era visível, mas sem comparação com hoje. Queremos mudar o enfoque. O problema do Brasil hoje não é de economia, mas de política. É preciso maioria política que permita fazer mudanças. Queremos olhar pelo que gera convergência.

E o que é?
É pensar o tipo de desenvolvimento que o Brasil pode ter. Tem todo um espaço para crescer com a interiorização do desenvolvimento. O eixo de expansão são as cidades médias, que crescem acima de 7%. Ao mesmo tempo, tem de se pensar numa integração sul-americana. A fronteira de expansão hoje não é EUA e Europa, mas Ásia. Temos de pensar na interiorização rumo ao Pacífico.

E pontos como a reforma da Previdência e privatizações?
Isso é problema para economista cabeça de planilha, que acha que o problema brasileiro é fiscal, que se vender patrimônio vai ter recursos. A Previdência tem de ser tratada como uma questão dentro do problema de privilégios do Brasil. Não tem resolução de curto prazo. Você antecipa um problema, que gera oposição e divide o País. A quem isso interessa? O fundamental no início do governo é um programa de emergência, que permita ao País sair da crise e voltar a crescer. Nós entendemos que a questão fiscal se resolve com a volta do crescimento.

Quais seriam essas medidas?
O Brasil tem de caminhar para um novo ciclo de investimento. Por que empresas não investem? A taxa de juros é alta, há volatilidade enorme. É preciso dar alguma tranquilidade a quem quer investir.

Como baixar os juros?
Por exemplo, no Reino Unido, tomador de empréstimo não deve pagar mais que 100% do valor tomado. Não temos regulação nesse sentido. Os detalhes serão apresentados no programa, em junho ou julho.

Como estimular investimento?
Precisamos de investimentos de médio e longo prazos, que têm rentabilidade mais baixa e, por isso, governo é fundamental para dar estabilidade. Dar garantias de que não vai ter recessão, que custos de produção não serão elevados a tal ponto que tornem impeditiva a produção. É fundamental o Banco Central operando não só com a problemática da moeda, mas com mandato mais amplo, considerando também o emprego.

Os bancos públicos teriam papel no combate aos juros altos?
Eles estão operando como se fossem privados. Obviamente, a função do banco não é ter prejuízo, mas também não é ter taxa de lucro explosiva. O papel dele é oferecer taxas (razoáveis) e estar aonde o privado não vai. Na Alemanha, parte dos recursos da poupança local tem de ser aplicada localmente. No Brasil, há deslocamento de recursos, que vão para regiões mais ricas. Há espaço para regulação.

Qual seria o papel do BNDES em um novo governo do PT?
A atual fase do capitalismo é dominada por grandes corporações transnacionais. Para competir, é preciso ter grandes empresas. O BNDES pode operar não só como financiador de longo prazo, mas também com participação em empresas, que têm de ser orientadas em função de política produtiva. Temos um gargalo (de crédito), que são as pequenas empresas, mas obviamente o Brasil precisa ter grandes empresas.

São necessárias medidas de estímulo ao consumo?
A questão da demanda é fundamental. Temos problemas de endividamento das empresas e das famílias e o rebaixamento da renda do trabalho. Isso gera recuo de demanda. Uma política emergencial precisa olhar o estímulo ao consumo.

De onde sairá o dinheiro para as medidas de estímulo?
A repactuação do federalismo (com maior autonomia aos Estados) abriria oportunidade para um novo tipo de investimento. Outra questão diz respeito às reservas internacionais. O Brasil tem uma reserva excedente e é possível uma redução pequena. Com menos de 10% do uso das reservas, podemos alavancar o PIB em investimento.

Como o PT avalia o processo de privatização da Eletrobrás?
O tema privatização é muito ideologizado, seja contra ou a favor. A decisão da privatização tem de ser feita dentro de um projeto de desenvolvimento. Não sou especialista, mas o setor elétrico é muito complexo.

São necessários ajustes nos gastos com funcionalismo?
Partimos do pressuposto de que é fundamental reorganizar o Estado. Mas, no Brasil, entre 11% e 12% dos ocupados são funcionários públicos. Nos EUA, são 16%, sem contar militares. Isso (número de funcionários) não é problema. O problema está no grande número de servidores nas atividades meio e não nas atividades-fim. Há espaço na União para reformular isso.

Há economistas que defendem a abertura da economia ao comércio exterior para elevar a produtividade. Qual a visão do PT sobre isso?
A produtividade das grandes empresas brasileiras é comparável à das estrangeiras. O problema está nas médias e pequenas. Abrir a economia nas condições que temos é aprofundar a competição não isonômica. Seria praticamente a liquidação do setor produtivo brasileiro. Tem de haver políticas diferenciadas.

O sr. acredita que o PT deve escolher novo candidato à presidência ou deve insistir na candidatura do ex-presidente Lula?
O PT tem até agosto para decidir. Nosso papel agora é produzir um programa para o PT.

Nesta eleição, o principal adversário será o PSDB ou Jair Bolsonaro (PSL)?
O que ocorreu de 2016 para cá levou o País a essa polarização que terá dois sobreviventes, duas candidaturas. Uma que será oposto ao que se tem hoje e outra que terá de defender o que está aí. Não sei se serão os tucanos, que também estão fragilizados. Acho que não terá espaço para partidos do centro. A polarização empurrou para extremos. Infelizmente, o centro democrático se fragmentou.