MEC usará IDH, nota de curso e área prioritária para conceder bolsas de pós
A definição de quais faculdades receberão dinheiro para bolsas de pós caberá a um algoritmo. Cada um dos quatro quesitos terá um peso específico. Ministro da Educação, Abraham Weintraub afirmou que a distribuição de verba às universidades seguirá "critérios técnicos". "Quem faz trabalho sério receberá. Quem não faz e não prestar contas vai receber menos", disse ao Estado.
O novo sistema de distribuição será anunciado oficialmente no próximo mês, mas as principais linhas foram antecipadas à reportagem pelo presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Anderson Correia. Vinculada ao MEC, a Capes é a principal financiadora de pesquisas de pós do País.
Para Correia, a inclusão do IDH no cálculo é importante, já que a Capes tem função social, de desenvolvimento das regiões. "Você não pode dar o mesmo tratamento a um curso em São Paulo e outro em Altamira, no Pará." Um peso maior para unidades instaladas em regiões mais pobres seria um mecanismo de tentar reduzir as desigualdades, ponderou ele.
Nos outros três aspectos que vão compor o sistema, o foco é investir em quem pode trazer melhores resultados. A ideia é que cursos que receberam notas muito baixas por vários anos não voltem a ter bolsas - esses cursos foram os primeiros penalizados este ano, quando o MEC suspendeu bolsas para cortar gastos. Hoje, a Capes avalia os cursos em conceitos de 1 a 7. Programas com avaliação 1 e 2 têm autorizações de funcionamento canceladas.
A opção em concentrar esforços no doutorado, diz ele, mira maior impacto científico. "O mestrado dificilmente gera descoberta que chame a atenção internacional." As áreas estratégicas ainda estão sendo definidas, mas Correia sinalizou que cursos como Medicina, Odontologia, Engenharias e Computação devem estar no grupo considerado prioritário. Já as pesquisas do que ele classifica como de "humanas puras" serão menos beneficiadas. Nesse grupo, estão Filosofia e Ciências Sociais. "Priorizar uma área não é matar outra."
A gestão Bolsonaro já havia dado sinais de que o investimento em Humanas deixaria de ser prioridade, o que desencadeou críticas da comunidade científica. Em abril, a Associação Brasileira de Antropologia, a Sociedade Brasileira de Sociologia, a Associação Brasileira de Ciência Política e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, em comunicado conjunto, afirmaram que as declarações indicavam desconhecimento sobre a ciência.
Verba bloqueada
Os novos critérios para distribuir bolsas devem ser aplicados já este ano. Weintraub acredita que parte dos recursos bloqueados começará a ser liberado no mês que vem e, até o fim do ano, de 80% a 90% do previsto no orçamento esteja disponível para a pasta. A Capes teve R$ 300 milhões de um orçamento de R$ 4,25 bilhões bloqueados. Com isso, 6.198 bolsas foram canceladas.
Segundo ele, bolsas ociosas vinculadas a cursos de baixo desempenho continuarão congeladas. Mas, se tiveram boa nota ou estiverem em área prioritária, o recurso será liberado.
Reajuste nas bolsas de doutorado
A Capes diz que, se o cenário fiscal dos próximos anos permitir, quer ampliar o valor da bolsa de doutorado, cuja média é de R$ 2,2 mil mensais - valor considerado baixo pelo governo e insuficiente para atrair talentos.
Especialistas temem que a inclusão de novos critérios leve a uma "escolha ideológica" na distribuição de bolsas. Para eles, o País já tem sistema de avaliação da pós-graduação robusto, baseado na qualidade dos cursos.
"É importante que nenhuma área seja deixada de fora. Uma preocupação seria com a desassistência às Humanas, que em outros momentos também já foram excluídas, como no programa Ciências sem Fronteiras (criado na gestão Dilma Rousseff, que financiava intercâmbios no exterior). É perigoso que haja direcionamento ideológico", alerta Simon Schwartzman, da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes).
Especialistas também questionam o uso do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) como critério, já que a maioria das pós estão em áreas em que o indicador é mais alto. "Regiões com IDH muito baixo não têm programas de doutorado", afirma João Cardoso Palma Filho, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e ex-presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Estadual de Educação de São Paulo.
E, para ele, se querem priorizar a bolsa para o doutorado, seria preciso mudar a estrutura de pós no País, que exige passagem pelo mestrado. Como o Estado revelou em junho, a Universidade de São Paulo (USP) propôs à Capes um novo modelo de pós-graduação, integrando o mestrado ao doutorado, o que reduziria o tempo total de titulação de seis para cinco anos. A meta do Plano Nacional de Educação é de formar, até 2024, um total 25 mil doutores por ano no País. Em 2016, esse número foi de cerca de 20,6 mil.
Bolsas de mestrados e doutorados são distribuídas pela Capes aos cursos de pós-graduação stricto sensu com avaliação igual ou superior a 3. A avaliação da Capes, quadrienal, dá nota de 1 a 7 aos programas. Cursos com notas 1 e 2 têm canceladas as autorizações de funcionamento.
Hoje, as bolsas são distribuídas às instituições de ensino, que repassam aos alunos por meio de processo seletivo. Os cursos são os únicos responsáveis pela seleção e pela concessão de bolsas aos candidatos que atendam aos requisitos.
Os valores pagos pela Capes variam de R$ 1,5 mil (mestrado) a R$ 2,2 mil (doutorado). A Capes diz que, se houver folga fiscal nos próximos anos, quer reajustar o valor do auxílio, considerado baixo por especialistas.
Proposta de mudança
A Capes pretende levar em conta o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das cidades onde estão as faculdades e o teor das pesquisas para dar bolsas. Também quer priorizar áreas estratégicas na visão do governo, como Engenharia, e não Filosofia e Sociologia. Especialistas temem direcionamento ideológico.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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