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Saiba mais sobre o possível envenenamento de Arafat

O líder palestino Yasser Arafat em imagem de 2004 - Odd Andersen/AFP
O líder palestino Yasser Arafat em imagem de 2004 Imagem: Odd Andersen/AFP

07/11/2013 08h44

Cientistas na Suíça que examinaram amostras do corpo do líder palestino Yasser Arafat disseram que ele pode ter sido morto envenenado pela substância radioativa polônio-210.

Um relatório, divulgado pela rede Al-Jazeera, afirma que níveis altíssimos da substância foram detectados em seus ossos. O corpo de Arafat foi exumado em novembro de 2012, nove anos após ele ter morrido, vítima de uma doença repentina.

Como Arafat morreu?

Em 2005, o jornal "New York Times" obteve uma cópia do registro médico de Arafat. Quem passou o documento foram dois jornalistas israelenses, que o conseguiram com um alto funcionário do governo palestino.

De acordo com o histórico, os primeiros sintomas do adoecimento de Arafat apareceram quatro horas após o jantar da noite de 12 de outubro de 2004, na sede presidencial em Ramallah, na Cisjordânia.

Análise indica que Yasser Arafat foi envenenado

Autoridades israelenses vinham mantendo o líder palestino isolado nesse local havia três anos; eles acusavam Arafat de patrocinar uma onda de ataques mortais de militantes palestinos.

Durante as duas semanas seguintes, Arafat enfrentou vômitos, dores abdominais e diarreias, mas não teve febre. Ele ficou inconsciente algumas vezes e perdeu 3 quilos. Ele foi examinado por médicos palestinos, egípcios, jordanianos e tunisianos, e recebeu tratamento para gripe e trombocitopenia (redução do número de plaquetas no sangue).

Os registros mostram ainda que o líder palestino só recebeu antibióticos no dia 27 de outubro, 15 dias após o início da doença. Dois dias depois, ele foi levado de helicóptero para a Jordânia e, em seguida, para o Hospital Militar Percy, próximo a Paris.

Só quando chegou à França é que ele foi diagnosticado com uma grave disfunção no sangue - uma coagulação intravascular disseminada (CID) -, que os médicos franceses não conseguiram controlar e que o levaram à morte.

Por um curto período, Arafat chegou a melhorar no hospital francês, mas em seguida (em 3 de novembro), ele entrou em coma e foi levado para a UTI.

No dia 8, ele teve um grave derrame hemorrágico e morreu três dias depois.

Por que muitos acreditam que ele foi envenenado?

Vários membros do alto escalão da Autoridade Palestina acusam Israel de ter envenenado Arafat. O primeiro-ministro israelense na época, Ariel Sharon, via o palestino como um terrorista e um obstáculo para a paz.

Em uma entrevista, Sharon chegou a dizer que se arrependia de não ter "eliminado" Arafat durante a invasão do Líbano em 1982.

Mas ele também disse que Israel tinha se "comprometido" a não machucar Arafat. O país desde sempre negou envolvimento com a morte.

O que seus registros médicos dizem?

Apesar de vários exames, médicos franceses nunca descobriram a causa da infecção que levou ao quadro de coagulação intravascular disseminada (CID), segundo os laudos aos quais o jornal "The New York Times" teve acesso.

Biópsias nunca identificaram algum agente infeccioso ou de câncer. Testes de sangue, urina, fezes e da medula óssea feitos em um laboratório na Tunísia também não indicaram nada.

Não houve necrópsia porque a mulher de Arafat não autorizou.

Especialistas independentes de Israel e dos Estados Unidos que tiveram acesso aos laudos disseram que a tese de envenenamento era pouco provável. Não houve grandes lesões nos rins e no fígado como aconteceria em um caso desses, embora ele tenha sofrido icterícia.

O que levou à exumação?

Em julho de 2012, a TV Al-Jazeera transmitiu um documentário resultante de nove meses de investigação para tentar descobrir a causa mortis de Arafat.

O programa mostrou que cientistas do Instituto de Física Radioativa da Universidade de Lausanne, na Suíça, tinham encontrado traços "significativos" de um material altamente tóxico e radioativo nos pertences de Arafat entregues à sua esposa.

Francois Bochud, chefe da pesquisa, disse que os exames mostravam um "elevado e inexplicado montante de polonium-210". Em alguns casos, a quantia foi dez vezes acima do encontrado em ambiente controlado, e que o polônio não poderia ter vindo de fontes naturais.

Para confirmar se houve ou não envenenamento, a viúva de Arafat deu permissão para a exumação, que contou com o apoio da Autoridade Palestina. O trabalho ficou a cargo de equipes de investigadores franceses, suíços, russos e palestinos.

O que os cientistas encontraram?

Na quarta-feira, a Al-Jazeera mostrou os resultados da equipe suíça, da Universidade de Vaudois, em Lausanne.

"Novos exames toxicológicos e radiotoxicológicos foram feitos, mostrando um nível inesperadamente alto de polônio-210", diz o relatório, acrescentando que foram analisados amostras da pélvis, das costelas e de fluidos corporais de Arafat, assim como da terra do túmulo.

O relatório aponta problemas enfrentados pelos pesquisadores, como a falta de amostras biológicas adequadas, já que as colhidas durante a hospitalização de Arafat foram destruídas. Também citam a pequena quantia de amostras e o tempo decorrente da morte, o que contribuiu para resultados pouco acurados.

O documento conclui, no entanto, que os resultados "apoiam em certo ponto a hipótese de que a morte foi consequência de envenenamento com polônio-210".

O médico forense britânico David Barclay disse que "o relatório contém evidências fortes de que há no corpo de Arafat pelo menos 18 vezes o nível de polônio que deveria existir".

O diretor dos investigadores palestinos, Tawfiq Tirawi, confirmou na quarta-feira que os relatórios produzidos por sua equipe e pela dos russos já haviam sido entregues.

No mês passado, o diretor da agência federal russa de Médico-Biologia, Vladimir Uiba, disse à agência de notícias russa Interfax que Arafat "não teria morrido envenenado com polônio", acrescentando que os testes realizados pelos russos "não encontraram traços da substância".

No entanto, posteriormente, a agência negou que Uiba tenha dado declarações oficiais sobre o assunto.

O que é o polônio-210?

Trata-se de um material radioativo encontrado na natureza que emite perigosas partículas alfa. A substância, batizada inicialmente de rádio F, foi descoberta por Marie Curie no século 19.

Há pequenas quantidades de polônio-210 no solo e na atmosfera. Todo ser humano também tem uma quantia no corpo. Em altas doses, pode danificar os tecidos e os órgãos.

O polônio-210 não pode ser transmitido por meio da pele. É preciso ingeri-lo ou inalá-lo.

Embora o polônio-210 seja encontrado na natureza, é preciso tecnologia e acesso a um reator nuclear para conseguir extrair a quantidade necessária para matar uma pessoa. Ou, pode-se conseguir com um fornecedor.

Em 2006, o ex-espião russo Alexander Litvinenko morreu em Londres envenenado com a substância. A polícia britânica acusou o também ex-agente da KGB Andrei Lugovoi de ter envenenado Litvinenko com um chá ingerido pela vítima.

Apesar das evidências, muitos especialistas são céticos quanto ao envenenamento de Arafat.

Darcy Christen, porta-voz do Instituto de Física Radioativa, que fez os primeiros testes para a Al-Jazeera em 2012, disse em julho à agência Reuters que os sintomas clínicos de Arafat não eram consistentes com esse tipo de envenenamento.