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Da herdeira de Fujimori à Lava Jato, 4 pontos para prestar atenção na eleição no Peru

O ex-ministro da Economia Pedro Paulo Kuczynski e Keiko Fujimori, filha do ex-presidente (hoje preso) Alberto Fujimori - Reuters
O ex-ministro da Economia Pedro Paulo Kuczynski e Keiko Fujimori, filha do ex-presidente (hoje preso) Alberto Fujimori Imagem: Reuters

Marcia Carmo

De Buenos Aires

05/06/2016 06h00

As pesquisas mais recentes colocam Keiko à frente de PPK, como Kuczynski é conhecido, mas analistas ouvidos pela BBC Brasil dizem que a polarização na reta final da campanha pode ter reduzido a vantagem da candidata. Quem for eleito toma posse em 28 de julho.

"A vantagem de Keiko pode ter caído de 5 pontos percentuais para 3, e até domingo podem ocorrer mudanças de votos", diz o analista Alfredo Torres, do instituto IPSOS Peru.

Segundo ele, denúncias recentes contra aliados de Keiko e a ampla manifestação da esquerda em apoio à PPK, realizada na terça-feira em Lima, podem influenciar setores do eleitorado. Os manifestantes diziam "Keiko no" ("Keiko não"), "Keiko no va" ("não vencerá) e "pela democracia".

No entanto, o respaldo a ela no interior do país e sua popularidade entre a população mais carente podem lhe dar a vitória neste domingo, apontam diferentes levantamentos.

Kuczynski, ex-ministro do governo de Alejandro Toledo (2001-2006), concentra seu eleitorado principalmente entre as classes médias e estudantes universitários, por exemplo.

No primeiro turno, Keiko recebeu quase 40% dos votos e PPK, 21%. Se ela vencer, contará com a maioria no Parlamento.

Veja, em quatro pontos, cinco informações importantes sobre o pleito peruano deste domingo:

1. Keiko e a herança de Fujimori

Keiko, 41, tem como uma de suas bandeiras a pena capital para estupradores de menores de sete anos e a construção de prisões. 

Seus opositores dizem que ela liberaria o pai preso, caso chegasse ao Palácio Presidencial Pizarro. Presidente entre 1990 e 2000, Fujimori, 77, cumpre pena de 25 anos por crimes contra a humanidade e corrupção. Após a separação dos pais, ela representou o país como primeira-dama. É a segunda vez que disputa a Presidência. Na anterior, perdeu para Humala e chegou a receber o apoio de PPK no segundo turno.

Apoiadores de Keiko argumentam que ela melhoraria a segurança pública e a prosperidade econômica dos mais carentes. "Keiko sabe defender suas ideias, atacar o adversário e percorre o país e trabalha para ser presidente há mais de dez anos. Ser jovem e mulher a ajudam, e ela tem grande capital político. Mas ao mesmo tempo ela tem um grande peso, o do seu pai", explica Carlos Aquino, professor de economia internacional da Universidade Mayor de San Marcos, de Lima.

2. O apoio da esquerda a um candidato pró-mercado

PPK tem experiência, adquirida como ministro, em multinacionais de diferentes ramos (como automotivo e mineração), e foi da cúpula do Banco Central do Peru. Tem entre suas bandeiras a redução de impostos e o desenvolvimento político e econômico do país. É a segunda vez que disputa a Presidência. Se vencer, terá minoria no Parlamento, mas com a simpatia de diferentes linhas políticas.

Na opinião de Carlos Aquino, PPK é um candidato "pró-mercado, tecnocrata, pouco político e com sotaque estrangeiro".

Na reta final da campanha, PPK recebeu apoio de nomes influentes tanto da esquerda como da direita peruana como o das ex-candidatas Verónika Mendoza, da esquerda, e Lourdes Flores, da direita, que tentam evitar a vitória da filha de Fujimori.

Mendoza, que recebeu quase 20% dos votos no primeiro turno, justificou seu respaldo a PPK dizendo votar "contra o fujimorismo, a corrupção, as mentiras, o vale tudo da política e por um país em paz".

3. Lava Jato, 'coadjuvante' na campanha

A operação brasileira de investigação ao esquema de corrupção na Petrobras tem desdobramentos no exterior, e um deles virou tema de manchetes de jornais peruanos e de debate na campanha, sobretudo no primeiro turno.

Os nomes dos ex-presidentes e então candidatos Alan García e Alejandro Toledo foram citados por supostos vínculos com empreiteiras brasileiras envolvidas na Lava Jato e com obras no país.

PPK, que foi ministro de Toledo, foi citado por contratos questionados do governo com empresas do caso.

Segundo a imprensa local, investigadores teriam pedido o fim do sigilo bancário de suas contas, assim como as de García, Toledo e da mulher de Humala, Nadine, na investigação envolvendo obras de empreiteiras brasileiras no país.

PPK deu explicações à comissão parlamentar que investiga a extensão da Lava Jato no Peru. Mas a falta de provas reduziu especulações em torno do seu nome, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.

Com isso, o tema acabou gradualmente perdendo força no noticiário no segundo turno.

4. Economia, legado de Humala e desafios

Motivo de otimismo em meio à estagnação da América do Sul, a economia peruana tem registrado nos últimos anos crescimento constante, batendo recordes no continente, com forte redução da pobreza.

Mas também com desafios arraigados como a predominância do emprego informal, que superaria 60% da mão de obra ativa.

Em um editorial a dias do segundo turno, o jornal El Comercio, de Lima, observou que apesar do crescimento anual de cerca de 5% nos últimos dez anos e de ocupar o posto 50 entre os 189 países no ranking de ambiente de negócios do Banco Mundial, o Peru continua atrás de seus vizinhos Argentina e Chile no Índice de Desenvolvimento Humano.

Melhorar as condições de vida e combater a informalidade trabalhista estão entre os desafios, além da insegurança pública.

No governo que está prestes a acabar, Humala manteve a abertura da economia e presença na Aliança do Pacífico (Peru, México, Chile e Colômbia).

Mas a desaceleração chinesa, compradora das commodities do país, influenciou o desempenho da economia local que registrou 3,26% de crescimento em 2015 e neste ano deve crescer entre 3,5% e 4% - longe dos 5% de anos anteriores, mas acima da média dos países da América do Sul.

Analistas observam que Keiko e PPK não têm propostas muito diferentes para a economia e tendem a manter a linha atual.

"Os dois são a favor da abertura, dos investimentos estrangeiros e da globalização", diz Torres, do IPSOS Peru. Para Aquino, as propostas dela seriam de "um Estado com maior apoio a planos sociais e controle de alguns preços, por exemplo".

Mas é bom lembrar que um ponto roubou o protagonismo da economia nos debates de campanha.

As diferenças entre os dois candidatos, observou Torres, seriam "intensas", especialmente na área de segurança pública - assunto que hoje aparece entre as maiores preocupações dos peruanos. "Ela defende mão dura no combate à insegurança pública e ele é um político preocupado com os direitos humanos e também por isso recebeu apoio da esquerda", diz o analista.